Dr. Florentino Cardoso: Dedicação ao próximo reconhecida mundialmente

Por Carol Gonçalves

Dr. Florentino Cardoso. Foto: Leo Martins

Cirurgião geral e oncológico, Dr. Florentino Cardoso é figura marcante no setor. Formado pela Universidade Federal do Ceará, tem residência médica em cirurgias geral e oncológica. Concluiu mestrado em cirurgia pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, é especialista em Economia da Saúde pela Universidade Estadual do Ceará e em Capacitação Gerencial de Dirigentes Hospitalares pelo Instituto de Administração Hospitalar e Ciências da Saúde, do Rio Grande do Sul. Foi superintendente dos Hospitais Universitários da Universidade Federal do Ceará e cirurgião do Hospital Geral de Fortaleza, instituição da qual foi diretor geral de 2003 a 2006. Destacou-se como presidente da AMB – Associação Médica Brasileira, cargo que exerceu de 2011 a 2017. É presidente da Confemel – Confederação Médica Latina-Íbero-Americana e do Caribe e vice-presidente do Setor II do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Recentemente, pela sua contribuição na cirurgia oncológica, recebeu a honraria da Gusi Peace Prize Foundation, em Manila, Filipinas, que é a principal instituição humanitária, de caridade e respeito pela vida e dignidade humana da Ásia. Nesta entrevista exclusiva, entre outros assuntos, Dr. Florentino analisa o setor da saúde no Brasil, comenta seus planos para o futuro e envia uma mensagem aos novos médicos.

Fale sobre o recebimento do Gusi Peace Prize e a que você credita essa conquista.

O Gusi Peace Prize, que tem grande prestígio mundial, especialmente na Ásia, reconhece personalidades mundo afora, que se destacam em diferentes áreas, como a Medicina. Ele reconhece o trabalho médico focado no coletivo, observando evidências científicas, sem desviar-se da qualidade e da segurança do paciente, sempre atento aos resultados, desfechos e outcomes. Para mim foi uma grande honra e um enorme orgulho ser agraciado com o prêmio em 2017. Credito essa conquista ao reconhecimento do trabalho realizado pelo nosso grupo à frente da AMB, que deu à entidade mais prestígio, visibilidade e fortaleza.

Em sua opinião, como a humanização vem sido trabalhada nos hospitais brasileiros?

Ações de humanização ocorrem sempre, embora precisemos falar disso continuamente, para que os profissionais de saúde entendam sua importância e não a deixem naufragar na correria, na tecnologia e na ignorância. O médico deve sempre ter em mente que o paciente é o mais importante, pois em prol de fazer o melhor devemos nos dedicar com afinco na busca de conhecimentos, termos disponibilidade e gostar muito do que fazemos.

Como a tecnologia melhorou ou piorou as ações de humanização nos hospitais?

A tecnologia ajuda na humanização, quando bem utilizada, para que ofereçamos o que tem de melhor aos nossos queridos pacientes. Algumas premissas são importantes: nem tudo que é novo é bom; existem pesquisas boas, ruins e que atrapalham; devemos sempre avaliar risco-benefício; a nova tecnologia é efetiva (funciona?), é eficaz (o quão bem?), é eficiente (a que custo?), tem equidade (para quantos?). Somos chamados a conhecer, estudar, incorporar novas tecnologias o tempo todo e devemos ser criteriosos no que fazemos, inclusive incorporar novas tecnologias. Notadamente na Medicina, novas tecnologias significam altos custos. Isso num setor que já tem gastos crescentes e existem enormes dificuldades para seu adequado financiamento.

Por que podemos dizer que o Brasil tem protagonismo mundial quando se fala em saúde e Medicina?

O Brasil tem excelente Medicina, com reconhecimento internacional em várias especialidades médicas e áreas de atuação há muitos anos. O país possui faculdades de medicina de reconhecimento internacional, hospitais, médicos e muitos outros profissionais de saúde. Entretanto, temos medo do que vem acontecendo há alguns anos, com a indiscriminada e irresponsável abertura de novas faculdades de Medicina, sem o devido zelo para formar bons médicos. O país do “mais”, mas sem qualidade. Há escolas médicas demais – já são mais de trezentas –, formando cada vez pior. Os exemplos estão no mercado, comprovados através de diferentes avaliações. Se analisarmos o setor como um todo atualmente, podemos dizer que a saúde pública está caótica, com raras exceções. E que a saúde suplementar também vive crises, pois no seu tripé de sustentação – pacientes (usuários), prestadores (incluindo médicos) e operadoras de saúde – todos estão insatisfeitos. Repensar este sistema é urgente e necessário para termos sustentabilidade, focando na qualidade assistencial e na segurança dos nossos pacientes.

Que ações urgentes são necessárias para melhorar a situação da saúde no país?

A saúde no Brasil precisa urgentemente de melhorias na gestão e no financiamento. A gestão é amadora na maioria dos locais, sobressaindo-se em pioras no setor público, onde a maioria dos gestores é escolhida pelo critério politiqueiro, eleitoreiro, do compadrio, da amizade, sem preponderar o técnico, o mérito. Isso não pode dar certo. O privado também precisa melhorar com maior profissionalização.

Como você avalia sua atuação de seis anos à frente da AMB?

Nos últimos seis anos (2011-2017), nosso grupo esteve sempre unido, buscando fazer o melhor e olhando para ganhos coletivos. Acabou a época de trabalhar para o grupo, a patota, a corriola. Tivemos sorte de ter um time de pessoas bem-intencionadas, com experiências exitosas e pensando em fazer o melhor para todos, sempre. Deixamos a AMB melhor e mais forte do que encontramos e esperamos que nossos sucessores também procedam assim, porque precisamos de instituições fortes, que não se curvem a interesses de poucos, nem a questões partidárias, eleitorais.

Quais atividades você vem desempenhando como presidente da Confemel?

A Confemel congrega atualmente representações médicas de 21 países, incluindo o Brasil, que tem a AMB e o CFM – Conselho Federal de Medicina como fundadores. A entidade tem pautado temas relacionados à formação médica, incluindo graduação, pós-graduação, condições de trabalho do médico, autonomia do médico e respeito à dignidade dos pacientes, discutindo também assuntos como aborto, terminalidade da vida, vida do idoso, relações entre os países do grupo, regimes de governo, etc. A Confemel tem muito a contribuir com todos.

Como é sua rotina atualmente?

Minha rotina tem sido trabalhar sempre, estudar, aprender, ensinar (o pouco que sei) e buscar sentido para minha vida, fazendo o que é bom e aquilo que tem alcance e sentido, podendo beneficiar muitos. Peço sempre a Deus que me dê saúde, pois o restante ele já me dá demais. Deus tem sido muito generoso comigo, um filho de caboclo do sertão de Crateús, Ceará, casado e pai de três filhos, sendo uma médica de 23 anos, um estudante do quarto ano de medicina com 21 anos e uma linda adolescente de 16 anos, que diz que também fará Medicina.

O que gosta de fazer nos seus momentos de lazer?

Meu lazer tem sido procurar ficar cada vez mais perto da minha família, aproveitar nosso belo litoral cearense, olhando o mar de águas mornas na varanda de um apartamento, lendo Medicina e outros temas, buscando inspiração para a vida e, quem sabe, um dia escrever memórias. Tenho aprendido muito na vida, nas minhas andanças, nas inúmeras viagens, na conversa com os amigos, nas cirurgias, nas visitas aos pacientes e nas trocas de experiência com internos, residentes e colegas.

Como sua vida profissional se relaciona com a pessoal?

Tanto minha vida pessoal quanto a profissional estão bem unidas, pois tenho suporte e compreensão da minha família, embora reconheça que a sacrifico com minhas ausências. Talvez conforte-os saber que corro em busca de um futuro melhor para gerações vindouras.

Quais seus planos para o futuro?

Planejo trabalhar mais, aprender mais e buscar ajudar quem tanto precisa, especialmente pessoas mais pobres e carentes. Continuo médico na assistência, no ensino, na gestão e um curioso em relação a enxergar a pesquisa clínica. Que eu consiga ler mais e mais, e no futuro escrever um livro sobre o que vivi no mundo médico associativo.

Cite uma passagem marcante de sua trajetória profissional.

Tenho inúmeras passagens marcantes na vida profissional, notadamente no reconhecimento pelos meus milhares de pacientes, muitos médicos e amigos. O futuro nos dirá mais, pois “a verdade é filha do tempo, não da autoridade”.

Que mensagem gostaria de deixar aos jovens médicos de hoje?

Estudem muito, não tenham preguiça e gostem de gente, procurando colocar o paciente no centro da busca do fazer mais e melhor, acreditando no Brasil e lutando para que ocorram as transformações que precisamos, como no campo política, por exemplo. Envolvamo-nos nas lutas de ganhos coletivos, sem medo, com força e vontade. Podendo, participem das nossas entidades médicas, fortalecendo-as.

Matéria originalmente publicada na Revista Hospitais Brasil edição 89, de janeiro/fevereiro de 2018. Para vê-la no original, acesse: portalhospitaisbrasil.com.br/edicao-89-revista-hospitais-brasil

Redação

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