Milena Flauzino foi diagnostica há 3 anos com câncer de mama receptor de hormônio positivo (câncer de mama com receptores de estrogênio e/ou progesterona). Então com 39 anos, a empresária se submeteu à mastectomia parcial para a retirada e a reconstrução do seio direito e, em seguida, a sessões de radioterapia.
Para evitar um retorno da doença, foi indicado o uso do Tamoxifeno, um medicamento comumente prescrito para o tratamento desse tipo de câncer ou para as mulheres com predisposição para a doença. Com isso, se abriu uma janela de medo, desconfiança e angústia de Milena que, após ler os efeitos colaterais do remédio, não teve coragem de iniciar o tratamento que, em seu caso, seria de cinco anos.
“Consultei três oncologistas renomados em São Paulo e todos disseram que era o medicamento indicado e que ele poderia reduzir pela metade as chances do câncer voltar. Mas fiquei muito preocupada com os efeitos colaterais, como trombose, complicações na visão, sangramentos, entre outros, e resolvi não seguir com o tratamento”, explica.
Com a supervisão da ginecologista e da endocrinologia, a paciente optou por tratamentos alternativos para o fortalecimento do organismo e hoje comemora seu estado de cura da doença. Passados três anos, a empresária conta que realizou um teste genético para avaliar sua predisposição a medicamentos e, entre eles, estava o Tamoxifeno como remédio sem eficácia, com suscetibilidade elevada a efeitos adversos devido à metabolização baixa de Milena aos componentes da fórmula.
“Não duvido e não tenho nada contra o medicamento, mas para mim ele não traria efeito algum e me deixaria vulnerável aos possíveis efeitos que eles mesmo descrevem na bula. Na época, não me conformei com a indicação. Me sentia no escuro como mais um caso da literatura médica. Estava com muito medo do que poderia acontecer”, relata.
Testes genéticos no auxílio na prescrição de medicamentos
Segundo a OMS, mais de 50% de todos os medicamentos são incorretamente prescritos, dispensados e vendidos, e mais da metade dos pacientes que os utilizam o fazem incorretamente.
“Há no Brasil, e em todo o mundo, um volume de prescrições feitas na tentativa e erro por protocolos médicos aplicados incorretamente, ou com pouca evidência. É crucial uma avaliação por parte de médicos, e demais profissionais de saúde, para o uso das ferramentas de farmacogenética para prescrições mais eficazes e sem riscos à qualidade de vida (e à vida) do paciente”, afirma o farmacologista Fabrício Pamplona.
Pamplona lidera uma equipe de pesquisadores na Proprium, uma health tech que atua no Brasil, Portugal e EUA, e desenvolve testes farmacogenéticos para auxiliar na administração e na dosagem seguras de medicamentos, suplementos e canabinóides para tratamentos nas áreas de oncologia, psiquiatria, pediatria, neurologia e geriatria.
“No futuro, a coleta de informações genéticas será considerada uma prática corriqueira na prescrição de tratamentos, se tornando inclusive obrigatória pelos conselhos de saúde”, frisa.
Fármacos
No caso dos fármacos, segundo Pamplona, o teste que está sob sua gestão é capaz de identificar reações a 104 compostos, presentes nos principais medicamentos comercializados em todo o mundo.
A pesquisa é realizada a partir de painéis genéticos que identificam variantes genéticas associadas à metabolização de substâncias dentro do organismo, e sua predisposição aos efeitos adversos decorrentes da exposição. O resultado fornece orientações desde composições de produtos, dosagem, até a melhor estratégia de administração, adequada ao perfil de cada indivíduo. Após essa avaliação, os fármacos são categorizados por nível de confiança para maior ou menor risco de falha terapêutica e/ou efeitos adversos.
Os resultados ficam hospedados em uma plataforma que pode ser acessada pelo paciente e médico. O objetivo é estimular que outros profissionais de saúde, que venham atender esse paciente, consultem os resultados de seu sequenciamento genético. Anotações sobre a evolução no tratamento podem ser feitas na plataforma.
Canabinóides
Além dos compostos fármacos e de suplementos, a startup também desenvolveu um teste genético que vai permitir a prescrição segura de canabinoides, por meio da identificação das taxas de metabolismo dos princípios ativos da planta, CBD e THC, auxiliando uma parcela significativa de brasileiros que utiliza a cannabis medicinal para diversos tipos de tratamentos, entre eles para diferentes tipos de câncer.
Segundo o Pamplona, atualmente o tratamento do câncer de mama, com redução efetiva do tumor pelos canabinoides, é um dos mais estimulantes horizontes de pesquisa clínica oncológica na área, com grande promessa de resultado e potencial para se tornar mais uma opção no arsenal médico.
Para o especialista, o uso dos produtos à base de cannabis, com indicação e dosagem específicas para cada tipo de organismo, podem melhorar de forma significativa a qualidade de vida dos pacientes sob quimioterapia, reduzindo náusea, gerando apetite e melhorando a qualidade do sono.
“A contribuição da farmacogenética é justamente entender qual das ferramentas disponíveis hoje (e no futuro) são mais adequadas ao tratamento de cada um e otimizar esses tratamentos, deixando de ficar à mercê da tentativa e erro”, destaca.