Resgatar a essência humanística da Medicina, com foco do atendimento no paciente (e não na doença), é o princípio da equipe de cuidados paliativos do Hospital Universitário Cajuru, em Curitiba (PR). A Instituição tem uma Comissão que se dedica a atender pacientes no fim da vida e seus familiares, cuidando dos sintomas físicos, emocionais, sociais e espirituais da doença. Em meio a pandemia de Covid-19, em que muitos pacientes não podem receber seus familiares, o trabalho da equipe ganha um significado importante nesse processo de conforto.
De acordo com o Coordenador da Comissão de Cuidados Paliativos do Hospital Universitário Cajuru, Dr. Ronnie Ykeda, o cuidado paliativo pode ser definido como “uma abordagem para dar dignidade e alívio do sofrimento aos pacientes com doenças graves que ameaçam a vida”.
“Muitos pacientes estão morrendo ligados a aparelhos em UTIs e longe de suas famílias. A partir da abordagem dos cuidados paliativos, reconhecemos os pacientes que não irão se beneficiar da alta tecnologia médica e buscamos trazer o máximo de conforto para estas pessoas. Por exemplo: ter a família ao lado em tempo integral, evitar que estejam ligados a tubos sem necessidade e até poder receber seu animalzinho de estimação no hospital”, afirma o coordenador.
Mudanças com a pandemia
Atualmente as visitas estão restritas na maioria dos casos. Ainda assim, a equipe de cuidados paliativos encontra maneiras de se adaptar à nova realidade, conforme explica o Dr. Ronnie. “Nós trabalhamos com o princípio médico da autonomia familiar: explicamos a questão da pandemia a todas as pessoas e elas decidem se querem ou não manter as visitas. No geral, os pacientes conseguem ter a família por perto 24 horas por dia, com no mínimo um parente por perto sempre”.
Os procedimentos de segurança para aproximação ocorrem de forma diferente para pacientes na UTI e na enfermaria. “Para a UTI, estamos focando nas videochamadas entre pessoas internadas e parentes. Na enfermaria, as visitas acontecem sempre com os equipamentos de proteção individual (EPIs) necessários, além de orientação aos visitantes sobre os riscos e cuidados. Percebemos que as pessoas têm se conscientizado”, comenta.
Em seus três anos de atuação, a Comissão de Cuidados Paliativos já atendeu mais de 300 pacientes e seus familiares. Entre março e junho foram 38 pacientes atendidos, com as novas recomendações de cuidados a toda a família por causa da pandemia.
Valorização do contato familiar
Segundo o coordenador da equipe, o fato de parentes e pacientes terem a chance de aproximação neste momento durante processo de cuidados paliativos significa a valorização dos laços familiares e da chance de conforto.
O médico explica que a pandemia pela qual o mundo passa, de certa forma, pode trazer alta carga de ansiedade à população em geral. “Consideramos importante a oportunidade e os benefícios de ver a pessoa enferma e poder se despedir nos pacientes que estão no hospital. Tentamos reduzir a ansiedade das pessoas nesse momento. É muito cruel não poder se despedir de um familiar”, afirma.
A importância do profissional de saúde
O hospital tem uma equipe multidisciplinar, com psicólogos, fisioterapeutas, farmacêuticos, enfermeiros, dentistas, fonoaudiólogos e nutricionistas, que atua com esses pacientes terminais, observa o médico coordenador. Ele considera que o trabalho do grupo resgata a essência da medicina.
“Antigamente o atendimento dos médicos era feito em casa ou em suas pequenas salas, ouviam o paciente, seus valores, conheciam pelo nome cada um. Na comissão de Cuidados Paliativos buscamos resgatar esses valores, ouvimos nossos pacientes, seus familiares, fazemos questão de conhecer a sua história, quem ele quer ao seu lado, o que ele quer fazer do seu tempo e o que ele não quer. Esse é só um pouquinho do nosso trabalho”, ressalta.
A abordagem terapêutica de cuidados paliativos beneficia também os médicos e outros profissionais da saúde. “Conseguimos perceber o amadurecimento da equipe em relação a morte, pois os pacientes nos ensinam muitas coisas, as nossas experiências são únicas com cada um deles. Eles nos ensinam a valorizar a nossa existência e a compreender que a morte é o último e mais sublime evento da vida. Em geral o profissional da saúde se frustra com a perda de um paciente e quando isso acontece, é porque ele está focado na doença. Quando tratamos o ser humano, nós sempre ganhamos”, avalia Dr. Ronnie. “Entendemos que não é necessário se frustrar com a morte, desde que forneçamos os cuidados necessários para o paciente ter uma boa vida”, completa.