A anemia falciforme é uma doença hereditária que altera o formato dos glóbulos vermelhos, caracterizando-os com um aspecto de foice ou meia lua. Essa anormalidade faz com que o transporte de oxigênio no corpo seja mais difícil, devido à modificação da hemoglobina, que gera riscos de obstrução dos vasos sanguíneos e problemas como a anemia crônica, causada pela destruição dos glóbulos vermelhos. A partir disso pode se desencadear fraqueza, dor generalizada e apatia. Em casos mais graves, pode, inclusive, ocorrer complicações em outros órgãos devido ao bloqueio no fluxo sanguíneo, levando à insuficiência renal e cardíaca.
Segundo dados do Ministério da Saúde, coletados pelo Programa Nacional de Triagem Neonatal, cerca de 3.500 crianças nascem com a doença por ano no Brasil e, aproximadamente, 60 mil totalizam o número de indivíduos que possuem a enfermidade no país. O diagnóstico da anemia falciforme é sugerido por meio do teste do pezinho, dias após o nascimento da criança. “A partir disso é possível analisar a presença da doença por meio da verificação do tipo de hemoglobina e sua quantidade, por meio de exame de sangue chamado de eletroforese de hemoglobina. Quando o bebê possui somente um gene S, denominado hemoglobina AS, indica a presença do traço falciforme”, explica Dr. Nelson Tatsui, Diretor-Técnico do Grupo Criogênesis e Hematologista do HC-FMUSP.
O tratamento convencional é feito com o uso de analgésicos e antibióticos, que ajudam no alívio das dores e o controle precoce das infecções. Em casos graves, realiza-se de transfusões de sangue para evitar o agravamento da anemia e melhorar o transporte de oxigênio.
Em busca de novos tratamentos, inclusive com o objetivo curativo da anemia falciforme, uma modalidade promissora é a terapia gênica. Para hemoglobinopatias, ela é utilizada, sobretudo para a anemia falciforme, baseando-se em modificar o DNA das células-tronco hematopoiéticas corrigindo o erro genético na raiz do problema, ou seja, na célula mãe. Em linhas gerais, as células-tronco do próprio indivíduo, seja do sangue do cordão umbilical ou outra fonte, são coletadas, levadas ao laboratório para correção do genoma e, após a manipulação celular, sua qualidade é testada e só então, reinfundidas no próprio paciente. Ou seja, este procedimento não depende de um doador compatível, como também não possui os efeitos colaterais graves de rejeição e imunossupressão como no transplante convencional. “O paciente não transplantado, com o passar dos anos, pode desenvolver muitas doenças, principalmente nos rins, fígado, pulmão e coração. Portanto, para evitar essas condições que limitam ou até impedem o transplante, o sangue do cordão umbilical, torna-se um aliado, uma vez que, é uma ferramenta valiosa da terapia gênica, pois impediria um retardo temporal no tratamento do paciente”, comenta Tatsui.
Com o avanço da técnica de expansão celular do sangue do cordão umbilical, ou seja, o aumento quantitativo de células-tronco, tal transplante passa a ser muito seguro. “A técnica de expansão permitirá uma redução do tempo de internação, redução da necessidade de antibióticos e transfusão, pois o paciente apresentará menos infecções graves ou problemas de sangramento ou anemia. Em resumo, um custo menor e uma mortalidade reduzida. Aliado a terapia gênica, o tratamento será mais rápido e curativo, devido à abrangência maior em virtude do número de bancos de sangue do cordão, seja público ou privado”, esclarece.
Atentos a esses resultados promissores, o senado dos Estados Unidos aprovou uma lei, em dezembro de 2020, que autoriza o repasse de U$ 256 milhões de dólares para um programa de células-tronco, que comtempla o transplante de sangue de cordão umbilical expandido. O projeto possibilita avanços no tratamento e pesquisas até 2025.