A CASA discute causas da baixa cobertura vacinal no SUS e como agentes podem contribuir para resolver o problema

Agente comunitária de saúde Márcia Castro, de Jaraguá, em Goiás. Crédito: Roberto Setton

Aumentar a cobertura vacinal é um dos grandes desafios da saúde brasileira. Pensando em como contribuir com esse objetivo, A CASA – espaço de conexão dos agentes comunitários de saúde (ACS) e agentes de combate às endemias (ACE), oferece atualização profissional aos mais de 400 mil agentes atuantes nos 5570 municípios brasileiros como forma de promover a adesão às campanhas de vacinação. A CASA é uma iniciativa do Instituto de Pesquisa e Apoio ao Desenvolvimento Social (IPADS) em parceria com a Confederação Nacional dos Agentes Comunitário de Saúde e Agentes de Combates às Endemias (CONACS) e Confederação Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS).

Se em 2015 a vacina contra poliomielite alcançou 98,29% das crianças até um ano, em 2018 seu alcance baixou para 89,54%, chegando a 73,53% da população alvo em 2022, mesmo com a prorrogação da campanha de imunização. Assim como outras vacinas que fazem parte do Programa Nacional de Imunização (PNI, criado em 1973), a cobertura da vacina Tríplice Viral, dada em duas doses para proteger contra sarampo, caxumba e rubéola, também ficou distante da meta. Dos 92,61% atingidos em 2018, chegou a 77,96% da população em 2022. Já a segunda dose foi recebida por 54,94% do público alvo (pessoas de 12 meses a 59 anos de idade, sendo recomendadas duas doses até 29 anos). Os dados extraídos do TABNET/DataSUS apontam:

Imunizações – coberturas vacinais por ano – 2018-2022
Imuno 2018 2019 2020 2021 2022
BCG 99,72 86,67 77,14 74,59 80,97
Hepatite B em crianças até 30 dias 88,40 78,57 65,77 66,61 72,58
Rotavírus Humano 91,33 85,40 77,94 71,70 73,01
Meningococo C 88,49 87,41 79,23 72,07 74,99
Hepatite B 88,53 70,77 77,86 71,44 73,61
Penta 88,49 70,76 77,86 71,44 73,61
Pneumocócica 95,25 89,07 82,04 74,74 77,75
Poliomielite 89,54 84,19 76,79 70,96 73,53
Poliomielite 4 anos 63,62 68,45 67,58 54,58 65,58
Febre Amarela 59,50 62,41 57,64 58,15 58,09
Hepatite A 82,69 85,02 75,90 67,48 70,43
Pneumocócica (1º ref) 81,99 83,47 72,14 66,08 68,94
Meningococo C (1º ref) 80,22 85,78 76,55 68,63 72,78
Poliomielite (1º ref) 72,83 74,62 69,30 60,45 65,41
Tríplice Viral D1 92,61 93,12 80,88 74,89 77,96
Tríplice Viral D2 76,89 81,55 64,27 53,13 54,94
Tetra Viral (SRC+VZ) 33,26 34,24 21,01 6,24 9,25
DTP REF (4 e 6 anos) 68,52 53,74 73,49 57,95 65,01
Tríplice Bacteriana (DTP) (1º ref) 73,27 57,08 77,21 63,60 65,10
Dupla adulto e tríplice acelular gestante 44,99 45,02 22,89 18,97 19,47
dTpa gestante 60,23 63,23 46,37 43,11 45,73
Varicela 0,00 0,00 74,43 66,96 70,42

 

A vacinação contra a Covid-19, que será incluída no calendário anual do PNI, também preocupa. Embora a confiança na vacina tenha aumentando entre 2021 e 2022 na maioria dos 23 países participantes de uma pesquisa sobre hesitação vacinal publicada recentemente na revista Nature Medicine, no Brasil a resistência dos pais em vacinar os filhos contra a doença subiu de 8,7% para 12,6%.

“A maior parte das vacinas tem a meta de atingir 95% da população alvo. Mas a cobertura começou a cair em 2012 e essa tendência se acentuou de 2016 até os dias atuais. O principal risco trazido pela baixa cobertura é o ressurgimento de doenças imunopreveníveis graves e já erradicadas, como a poliomielite e o sarampo”, observa o epidemiologista André Ricardo Ribas Freitas, consultor científico da A CASA e Professor de Epidemiologia e Bioestatística na Faculdade de Medicina São Leopoldo Mandic, em Campinas (SP).

Diante do agravamento desse cenário, agentes de todo o país que participam das atividades da A CASA têm dialogado sobre as causas e abordagens possíveis para elevar a cobertura vacinal. Uma das principais necessidades apontadas por esses profissionais é consolidar estratégias de comunicação e argumentos para contrapor à desinformação e as notícias falsas espalhadas sobre as vacinas. “Segundo os agentes, as pessoas deixam de se vacinar muito mais por não darem importância à vacina do que por uma atitude antivax”, diz André Giglio Bueno, médico infectologista da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e também consultor científico da A Casa.

Nas conversas, treinamentos e oficinas oferecidos pelo projeto, a comunicação é valorizada para ajudar os agentes a se contrapor à ideia falsa de que ela não é importante e para descontruir o conceito equivocado de que a vacina causa problemas à saúde. “A onda de desinformação vista nos últimos três anos, aliada a um movimento organizado forte contra as vacinas, foi inicialmente direcionada à Covid-19, mas obviamente impactou também as outras coberturas”, diz o especialista.

O fortalecimento dos vínculos com a população do território após a pandemia é outro tema presente. “A qualidade da relação entre os agentes e a população influencia diretamente a confiança nas informações que são dadas por esses profissionais para que as pessoas não tenham receio de se vacinar”, descreve o infectologista Bueno.

Na visão de Ilda Angélica Correia, presidente da Confederação Nacional dos Agentes Comunitários de Saúde, a desvalorização do trabalho dos agentes de saúde é mais um fator que colabora para a queda das coberturas vacinais. “Somos o elo entre a Unidade Básica de Saúde e a população do território. Desde 2016, estamos sendo deixados de lado. Antes éramos informados em primeira mão sobre as alterações do calendário vacinal, a chegada de novas vacinas e campanhas. A gente levava essa informação e garantia a presença das crianças, adultos e idosos nas campanhas de vacinação.” Na atualidade, segundo a presidente da CONACS, muitas vezes os profissionais ficam sabendo das alterações na vacinação pelo cidadão que vai utilizar o serviço. “No meu ponto de vista, sem dúvida isso contribuiu e contribui para a queda da cobertura vacinal”, diz Ilda, que atua em Maracanaú, na região metropolitana de Fortaleza, no Ceará.

A representante nacional reivindica maior engajamento dos agentes comunitários no processo de planejamento e definição das prioridades das equipes de saúde da família e o compartilhamento de informações mais constante e cuidadoso. “Se a gente retomar como prioridade a busca ativa dos faltosos da vacina, seja criança, adulto ou idoso, certamente daremos uma contribuição muito importante para a reversão da baixa cobertura vacinal. Sabemos onde estão essas pessoas”, conta ela. Para os coordenadores do projeto A CASA, a busca ativa e orientação das pessoas para aumentar a aceitação das vacinas é uma medida urgente.

A CASA identificou mais algumas questões que influenciam o alcance da vacinação. “O horário de funcionamento das Unidades Básicas de Saúde e a disponibilidade da vacinação precisam ser pensados para que as pessoas não vejam o ato de vacinar como um problema que vai prejudicar no trabalho ou atrapalhar demais a rotina. Os agentes falam muito sobre isso”, pontua Bueno.

Redação

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