As Doenças Crônicas Não Transmissíveis são responsáveis por 71% das mortes precoces no mundo, e 74% de mortes no Brasil, e estão dentro dos desafios do Ministério da Saúde para atingir a meta 3.4 do ODS3 da ONU. Durante a 6ª edição do FórumDCNTS, o fundador e coordenador geral do evento, Dr. Mark Barone, apresentou o recente relatório publicado pela OPAS (Organização Pan Americana da Saúde) e a OMS (Organização Mundial de Saúde), que apontou o Brasil como um dos países que mais atinge indicadores no enfrentamento da DCNTs, totalizando 12.
“Além de 74% de mortes no Brasil serem por Doenças Crônicas Não Transmissíveis, como hipertensão e diabetes, 17% delas são prematuras, ou melhor, em pessoas com menos de 70 anos de idade. Estas últimas são o foco do ODS 3.4 da ONU: ‘reduzir em um terço a mortalidade prematura por DCNTs até 2030, via prevenção e tratamento, e promover a saúde mental e o bem-estar’. Apesar de isso indicar que o Brasil tem programas e políticas consistentes, com planos e metas nacionais para enfrentar essa situação e conquistas a celebrar, como o sucesso das políticas anti-tabaco, ainda existem importantes desafios. Esses 12 indicadores atingidos nos colocam à frente de outros países com a certeza de que estamos trilhando por um bom caminho, porém, o consumo de álcool, a obesidade, os alimentos ultraprocessados e, agora, com a pandemia Covid-19, a serem enfrentados”, analisa Dr. Barone.
Desafios e medidas
Apesar das conquistas obtidas, o Brasil ainda precisa travar uma luta em diversos sentidos para atingir a meta da ONU. O consumo excessivo de álcool ainda é um problema diante das campanhas publicitárias e a carência de tributação específica sobre os produtos comercializados. Obesidade e alimentação não saudável são também pontos críticos.
“De um lado a obesidade, uma doença que ainda não levada a sério, de outro a negligência em implementar rapidamente políticas que regulem a adição de sal nos alimentos e obriguem a substituição da gordura trans nas preparações. A disponibilidade de medicamentos e orientações sobre as doenças cardiovasculares, principalmente na atenção primária, ainda estão a desejar no Brasil. Esses são alguns dos fatores mais preocupantes no enfrentamento das DCNTS. O Brasil, por exemplo, é o segundo país que mais tem perdas de Produto Interno Bruto (PIB) devido a obesidade. É alarmante, pois é um dos fatores de risco para diabetes, hipertensão, doenças cardíacas, câncer, entre outras”, alerta o coordenador do evento.
Para o Dr. Edson Araújo, do The World Bank e palestrante do FórumDCNTs, “um dos principais desafios do SUS é expandir e coordenar acesso aos serviços de saúde – o que poderia ser resolvido com APS mais eficiente”. Ele também complementou a questão sob o aspecto de seis desafios que o setor de saúde tem para atingir a ODS 3.4:
1) Financiamento: o gasto total com saúde é alto, mas o gasto público é relativamente baixo;
2) Espaço fiscal: Projeções (BM) indicam que na ausência de reformas, a trajetória fiscal do Brasil será insustentável (déficit primário = 5% do PIB 2030, dívida pública = 150% do PIB);
3) Qualidade: três em cada quatro brasileiros avaliam o sistema público de saúde como ruim ou péssimo (CNI/ IBOPE, 2018);
4) Fragmentação: a maior parte dos municípios brasileiros tem menos de 20 mil habitantes;
5) Mercado de trabalho: A oferta de médicos é relativamente baixa e concentrada nos centros urbanos;
6) Gestão: evidências apontam para melhor desempenho, produtividade e qualidade das unidades de saúde administradas por OSS.
Na visão de Sheila Vasconcellos, ADILA, a propagação da informação é o grande desafio que levará ao desfecho sobre as DCNTs. “É preciso engajar o paciente para ter uma aderência maior ao tratamento, adotar medidas preventivas e mobilizar o seu entorno, atuando eficientemente com o sistema de saúde local.”
Para Lívia Faller, SAPS-MS, é preciso falar em cuidado da organização. “Desde maio de 2019, o ministério vem se organizando com enfoque no cuidado do paciente por meio de diversos programas efetivos vinculados a uma equipe de saúde da família”. José Otávio Corrêa, Abbott, complementa com o fator integração do público com o privado, aliado a organização, como ponto primordial para colaborar com as soluções para o enfrentamento das DCNTs, “trazendo mais agilidade para o governo identificar as necessidades não atendidas em relação às doenças”.
Saúde digital é o caminho apontado por Dra. Ann Aerts, da Novartis Foundation, e Cauê Bueno, da HackMed. Dra. Aerts destacou em sua apresentação as oportunidades de integração da tecnologia em todas as esferas da saúde “vindo a ser tão essencial quanto os leitos hospitalares, uma vez que seja usada como ferramenta de empoderamento para equipes médicas e pacientes”. Já Bueno deu exemplos de como a tecnologia pode atuar em prol da saúde utilizando a inteligência artificial, big data, automação, aplicativos, wearables e telemedicina a favor do rastreamento do quadro clínico de cada indivíduo promovendo, assim, a cobertura universal do setor.
Covid-19: mais um grande desafio
Dr. Barone não podia deixar de destacar o ‘grande elefante branco’ atualmente. “Se já vínhamos nessa batalha que não era fácil em relação às DCNTs, a Covid-19 é mais um desafio, afinal desde o começo da pandemia na China, e logo após na Itália, verificou-se que a taxa de letalidade chega a ser quase dez vezes maior em pessoas com DCNTs: doenças cardiovasculares 13,2%, diabetes 9,2%, hipertensão 8,4%, doença respiratória crônica 8,0%, e câncer 7,6%, em comparação com 1,4% em pessoas sem DCNTs”.
Neste sentido, Dr. Barone citou a frase da Primeira Ministra da Noruega e do Presidente de Gana: “Essa pandemia expôs a crise nos sistemas globais de saúde. E, embora esteja minando severamente as perspectivas de alcançar o ODS 3 até 2030, também está tendo efeitos de longo prazo em todos os outros ODSs”.
Outro agravante com a pandemia é a questão do aumento acentuado de eventos cardiovasculares e a piora da saúde mental da população, de acordo com a apresentação do Dr. Barone durante o 6º encontro do FórumDCNTs. “A pandemia pode servir como gatilho, em casos de predisposição, ou levar à recaída de pessoas com depressão e ansiedade diante da solidão, insegurança e o medo”.
Dr. Eduardo Marques Macário, SVS-MS, e Marília Sobral Albiero, ACT Promoção da Saúde, concordam com a questão do agravamento dos casos de obesidade e diabetes em tempo de pandemia. “As geladeiras estão à disposição das pessoas que estão em estado de atenção com suas preocupações e o atual cenário econômico brasileiro”, disse o Dr. Macário. “É importante cuidar do sistema imunológico nesta época em que os alimentos ultraprocessados estão ainda mais disponíveis para uma sociedade ansiosa com este cenário”, acrescentou Marília. Para o Dr. Bruno Halpern, da ABESO, já estamos em uma pandemia da obesidade há tempos, que se iniciou na década de 70. “E ainda não encontramos uma solução eficiente para freá-la. A Covid nos faz pagar pelo preço por negligenciar esta doença crônica”.
No caso do diabetes, uma pesquisa coordenada por Dr. Barone com 1.500 pessoas, ainda em andamento, apontou que 40% dos entrevistados estão adiando suas consultas médicas para depois da pandemia. “A falta de cuidados é extremamente preocupante e, certamente, trará consequências. Desde o início da pandemia, houve o compromisso de entrega de insumos e medicação pelo governo para três meses. Porém, com essa pesquisa, verificamos que apenas 13,1% receberam nessa quantidade para três meses, quase 50% continua tendo que retirar mensalmente o material para seus autocuidados. Isso significa que as pessoas com pior prognóstico, caso infectadas, são obrigadas a sair do isolamento e irem retirar seus medicamentos em locais onde infectados com o coronavírus estão se apresentando. Como consequência, há aquelas que deixaram de retirar seus medicamentos com medo do contágio”. O Covid-19 também pode levar ao desenvolvimento de diabetes e induzir alterações metabólicas de longo prazo, sendo, portanto, o monitoramento cardiometabólico criterioso necessário daqui para frente”, finalizou Dr. Barone, afirmando que é preciso agir hoje, além de otimizar as parcerias (ODS 17).
FórumDCNTs
Idealizado em 2016, o FórumDCNTs, fundado e coordenado por Dr. Mark Barone, tem como objetivo reunir lideranças dos setores público, privado e terceiro setor para o combate à principal causa de mortes precoces no país: as Doenças Crônicas Não-Transmissíveis.
As Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNTs) são responsáveis por aproximadamente 71% das mortes no mundo e, de acordo com o Vigitel de 2018, 74% das mortes no Brasil. As DCNTs com maior impacto sobre a população brasileira são as doenças cardiovasculares (28%), as neoplasias (18%), as doenças respiratórias (6%) e o diabetes (5%). Sabe-se que grande porcentagem dessas doenças e suas complicações podem ser prevenidas: www.ForumDCNTs.org/post/6encontro