Encontro em São Paulo abordou uso e regulamentação da telemedicina

Por Carol Gonçalves

O Global Summit Telemedicine & Digital Health reuniu palestrantes nacionais e internacionais em São Paulo

Na edição nº 95 da Revista Hospitais Brasil, fizemos um resumo sobre os últimos acontecimentos relacionados à regulamentação da telemedicina no país. No mês de fevereiro último, a Resolução nº 2.227/2018, do Conselho Federal de Medicina (CFM), foi publicada e, pouco depois, revogada. Um dos motivos da decisão foi o alto número de propostas encaminhadas pelos médicos brasileiros para alteração de alguns pontos definidos na lei.

O uso da telemedicina tem sido amplamente discutido em diversos eventos, como foi no Global Summit Telemedicine & Digital Health, realizado e promovido pela APM – Associação Paulista de Medicina e pelo Transamerica Expo Center, entre os dias 3 e 6 de abril, em São Paulo. Palestrantes nacionais e internacionais abordaram temas como Telehealth, Digital Health, Wearables, Artificial Inteligence, Internet of Medical Things, Patient Experience & Health, Telemedicine, Mobile Health, Analytics & Big Data, Internet of Me, Health Promotion and Prevention e Machine Learning. Além disso, empresas patrocinadoras e startups demonstraram em estandes suas soluções tecnológicas aos participantes.

Durante o evento, a APM apresentou à imprensa uma síntese da proposta alternativa à resolução revogada, formulada pelos médicos do estado de São Paulo e que será encaminhada ao CFM. Segundo a associação, normatizar a telemedicina no Brasil é tarefa urgente, já que, hoje, as regras válidas datam de 2002.

Propostas

  • Detalhamento dos protocolos de segurança capazes de garantir a confidencialidade e a integridade das informações: requisito do Nível de Segurança 2 (NGS2) e padrão ICP-Brasil.
  • Reforço de que a decisão de utilizar ou recusar a telemedicina deve basear-se somente no benefício do paciente.
  • Modificação do trecho que estabelece a guarda de todos os dados do atendimento a distância, de forma que devem ser preservados os dados relevantes trocados no atendimento a distância, como já ocorre com os prontuários médicos nos atendimentos presenciais.
  • Inclusão de artigo determinando que “A telemedicina deverá ser realizada em infraestrutura adequada e segura, com garantia de funcionamento de equipamento, largura de banda eficiente e redundante, estabilidade do fornecimento de energia elétrica e segurança eficiente contra vírus ou invasão de hackers”.
  • Reforço de que as teleconsultas só podem ocorrer após primeiro contato presencial, para acompanhamento dos pacientes.
  • Exclusão do parágrafo que permite a teleconsulta sem primeiro contato presencial para áreas geograficamente remotas.
  • Detalhamento de que a possibilidade de consulta presencial, em tempo e lugar razoáveis e ao mesmo custo, deve ser sempre oferecida ao paciente.
  • Reforço de que os registros habituais do prontuário médico da consulta presencial são obrigatórios na teleconsulta.
  • Exclusão de todos os itens que tratam da telecirurgia, que deve ser discutida e regulamentada em resolução própria, por conta de sua complexidade.
  • Exclusão dos itens sobre teletriagem médica e teleorientação, já que o primeiro contato entre médico e paciente deve ser sempre presencial.
  • Exclusão do artigo sobre teleconsultoria, por não ser pertinente à discussão sobre telemedicina.
  • Reforço de que a prescrição a distância deve obedecer à premissa de primeiro contato presencial entre médico e paciente.

Pesquisa

Também no evento dedicado à imprensa foi apresentada uma pesquisa inédita realizada pela APM e pelo Global Summit Telemedicine & Digital Health, revelando que 82,65% dos médicos do estado de São Paulo usam a tecnologia no seu dia a dia em consultórios, clínicas ou hospitais. Além disso, 98,7% concordam que as soluções digitais trazem avanços para o atendimento aos pacientes.

A pesquisa, feita entre 15 e 25 de março de 2019, entrevistou 1.614 profissionais. Seu objetivo foi compreender melhor como os médicos paulistas reagiram após a publicação e revogação da Resolução nº 2.227/2018.

Segundo 91,39% dos participantes, os hospitais ou instituições nos quais trabalham já fazem uso das tecnologias. Mesmo assim, há uma divisão de prós e contras quando se posicionaram sobre teleconsultas e teleprescrições. São 50,74% os favoráveis à prescrição eletrônica, após consulta presencial, enquanto 49,26% se manifestam contrariamente. Por outro lado, 45,04% concordam com consultas a distância, após uma presencial, e 54,96% não.

Em sua maioria, 78,69%, os profissionais de Medicina também veem com bons olhos a utilização do WhatsApp e de ferramentas semelhantes na relação com os pacientes. Das 1.614 respostas, 67,66% concordam com a frase “A tecnologia não vai substituir o médico, mas pode substituir o médico que não usa tecnologia”. São 83,89% os que acreditam que os aparelhos celulares serão capazes de funcionar como guardiões da saúde, possibilitando que as pessoas monitorem certos aspectos em suas próprias casas.

O grupo favorável a que as informações de saúde dos cidadãos sejam disponibilizadas em nuvem digital, com proteção de dados, mas acessíveis aos médicos, também é expressivo: 84,57%. Aliás, 93,68% entendem que o compartilhamento de informações pode ser benéfico aos profissionais, aos pacientes e ao sistema.

Sobre a forma como o CFM produziu a Resolução nº 2.227/2018, 76,52% dizem que os médicos não foram devidamente consultados, ou seja, a percepção é a de que o debate deveria ter sido bem mais aprofundado.

É negativa, ainda, a percepção sobre o tratamento que o Mistério da Saúde dispensa ao tema, historicamente. Para 93,06%, o MS não dissemina as novas tecnologias com a agilidade que deveria. Assim, fica fácil compreender porque 92,87% acham que países como Japão, Alemanha e Estados Unidos estão bem à frente do Brasil na incorporação de ferramentas digitais positivas à boa prática da Medicina.

Análise

Dr. Akira Ishida, Dr. José Luiz Gomes do Amaral, Dr. Antonio Carlos Endrigo e Dr. Jefferson Gomes Fernandes

De acordo com o Dr. Jefferson Gomes Fernandes, presidente científico e também presidente do Conselho de Curadores do Global Summit, os médicos, de forma geral, desconhecem o que é a telemedicina e como fazê-la, por isso foi realizado o evento, mostrando que essa prática já existe em outros países, como Estados Unidos e Inglaterra. “Dessa forma, buscamos educar os profissionais sobre o uso responsável, de forma ética e adequada, bem como os seus limites. A telemedicina não vem para resolver todos os problemas, mas para complementar o cuidado presencial. Sua utilização aumenta o acesso aos serviços de saúde, aumenta a resolubilidade dos cuidados, reduz os custos – como consequência – e ajuda a organizar o sistema de saúde”, disse.

Dr. José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM e presidente de honra do Global Summit, ressaltou que a telemedicina chegou e é usada, trazendo diversos benefícios. “Estamos muito atrasados e precisamos recuperar o tempo perdido. A falta de regulamentação traz graves consequências, como danos à saúde das pessoas e a judicialização”, expôs.

“Na verdade, a telemedicina não é ferramenta, é um instrumento que faz parte do dia a dia do médico e precisa ser usada com responsabilidade e ética”, reforçou, por sua vez,
Dr. Akira Ishida, vice-presidente da APM.

Sobre se a comparação do Brasil com outros países mais desenvolvidos é justa, Dr. Antonio Carlos Endrigo, presidente da Comissão Organizadora do Global Summit, explicou que doença é igual em todo local, o que é preciso é adaptar o uso da tecnologia à cultura do país.

A respeito da crítica que pessoas fizeram nas mídias sociais acusando a resolução do CFM de privilegiar interesses corporativos, o Dr. José Luiz disse que há quem conecte informações que não estão, necessariamente, ligadas, para tirar conclusões maldosas. Segundo ele, os interesses precisam se coincidir. “Cada novidade lançada ao mercado precisa responder a duas perguntas: atende ao indivíduo? Atende à coletividade? Claro que a importância muda se o maior beneficiário é a sociedade com um todo”, expôs.

O próximo passo com relação à nova resolução é aguardar o CFM analisar as propostas de mudanças enviadas pelos profissionais e entidades de classe e, enfim, tirar o atraso de 17 anos na regulamentação da telemedicina no Brasil.

Matéria originalmente publicada na Revista Hospitais Brasil edição 96, de março/abril de 2019. Para vê-la no original, acesse: portalhospitaisbrasil.com.br/edicao-96-revista-hospitais-brasil

Redação

Redação

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.