As famílias afetadas pelas tempestades na Bahia, no final do ano passado, ainda sofrem com as consequências das inundações. Mesmo aqueles que já voltaram para casa e estão retomando suas vidas, precisam lidar com os traumas e os medos provocados pela tragédia. Para ajudar as equipes locais no atendimento à população, Médicos Sem Fronteiras (MSF), em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde de Itabuna, está realizando uma ação de capacitação na área de saúde mental em contexto de emergências e desastres para cerca de 500 profissionais da cidade, que fica localizada no sul do estado.
São agentes comunitários, médicos, enfermeiros e psicólogos da linha de frente, que estão recebendo capacitação à distância para identificar e referenciar pacientes que necessitem de atendimento em saúde mental. A opção pela realização das aulas remotas está alinhada com as medidas de prevenção à Covid-19.
A enfermeira Tercilia Maria Sousa Soares está participando do curso. Ela conta que o Rio Cachoeira subiu nove metros, destruindo completamente casas, lojas e a Unidade de Saúde Familiar Dr. Nilton Ramos, no bairro de Mangabinha. “Quando conseguimos chegar no local, o cenário era de guerra. Carros no meio da rua, lama para todo lado e algumas residências não existiam mais. No posto de saúde, só sobraram as cadeiras e as lixeiras que são de plástico. Todo o resto foi perdido”, explica Tercilia. A unidade de saúde continua interditada pela Defesa Civil e a equipe com 22 profissionais está trabalhando em uma igreja na parte mais alta do bairro.
Marta Maria de Jesus Santos é agente de saúde na Zona Leste da cidade. Ela diz que as pessoas até hoje não acreditam no que aconteceu. “O pior momento das chuvas foi nos dias 25 e 26 de dezembro, quando as águas levaram tudo. Muitas pessoas carentes perderam todos os pertences que juntaram ao longo da vida. Elas não vão esquecer essa tragédia nos próximos Natais”, afirma Marta.
No treinamento de saúde mental, a agente aprendeu a importância de ouvir. “Neste momento, será muito importante escutar o que o outro tem a dizer e procurar ajuda psicológica para aquele paciente que precisa”, explica. E ela já tem algumas ideias de como estimular a população a falar e elaborar os sentimentos. “Vamos tentar promover rodas de conversa e oficinas para as vítimas com o apoio de uma universidade daqui”, conta Marta.
A estratégia de Respostas de Saúde Mental e Apoio Psicossocial em Emergências e Desastres, que está sendo utilizada no treinamento em Itabuna, é uma das ferramentas que MSF aplica em seus projetos ao redor do mundo. “Temos a oportunidade de compartilhar nossa experiência neste tipo de atendimento em situações de catástrofes e crises humanitárias junto aos profissionais da rede pública, contribuindo com a resposta psicossocial nas áreas mais afetadas pelas cheias”, explica Bruno Cardoso, coordenador de projeto de MSF. Durante as enchentes, a organização também realizou doações de água potável e insumos hospitalares na região.