“Quanto mais a gente falar sobre a prevenção do suicídio, mais mortes estamos evitando.” Essa é a opinião e a recomendação da médica neurologista e escritora Ana Paula Penã Dias. Autora do livro ‘E agora? Como ficam as emoções após a pandemia’, a especialista pretende desmistificar o tabu da saúde mental e alertar que tratar as emoções e deixar de rotular as pessoas que sofrem de transtornos mentais como sinal de fraqueza.
Na entrevista a seguir, Ana Paula Penã Dias explica a relevância de se falar sobre suicídio, o aumento da ansiedade entre os brasileiros no pós-pandemia, a importância de adotar uma rotina de autocuidado, como dormir bem e o papel da atividade física em prol de uma melhor qualidade de vida. Confira:
Seu livro trata sobre os prejuízos que a falta de saúde mental causa na humanidade. A saúde mental ainda é vista como um tabu? Como ela pode ser desmistificada?
Ana Paula – Infelizmente os transtornos mentais ainda são vistos como fraqueza do indivíduo, são vistos como se a pessoa não tivesse “dado conta” de suas questões pessoais, profissionais, etc. Então, acaba desenvolvendo um transtorno mental. Hoje em dia a gente aceita se o indivíduo tem uma doença física como diabetes, hipotireoidismo, hipertensão, agora se ele tem depressão, ansiedade, burnout, achamos que foi fraco e não soube lidar com a situação. A gente precisa desmistificar isso o quanto antes porque os transtornos mentais são altamente prevalentes e geram um sofrimento absurdo no indivíduo, nas famílias, nas empresas, na sociedade. Geram muito sofrimento, mortes causadas por suicídio, por doenças cardiovasculares. Os transtornos mentais também geram mais doenças clínicas – já comprovado – e além do prejuízo econômico na ordem de bilhões de dólares por ano, por muitas questões envolvidas. Precisamos tirar transtornos que estão debaixo do tapete.
O debate sobre a importância da saúde mental está em alta no Setembro Amarelo. Porque é relevante falar sobre isso e discutir esse tema abertamente?
Ana Paula – Sempre que a gente fala de prevenção do suicídio existe um senso comum de que falar sobre suicídio pode induzir pessoas a se suicidarem ou, até mesmo, serem provocadas. Também ouvimos falar de que quem tenta se matar é porque quer chamar atenção ou essa pessoa não quer se matar de verdade. Isso é um tremendo engano. Já está comprovado que as pessoas que conseguem efetivamente o suicídio tentaram várias vezes antes de realmente concretizar. É uma pauta que a gente tem que trazer, tem que debater, porque quanto mais a gente falar sobre a prevenção do suicídio, mais mortes estamos evitando.
A ansiedade aumentou muito com a pandemia. Quais são suas dicas práticas para que as pessoas possam amenizar os impactos do dia a dia?
Ana Paula – Para que as pessoas minimizem a ansiedade elas têm que melhorar em primeiro lugar a vigilância dos sintomas que elas apresentam, de que algo não vai bem. Costumo dizer que a gente não pode normalizar aquilo que não é normal. Então, quando a pessoa apresenta sinais clínicos de desarmonia. Por exemplo: dificuldade em dormir, distúrbio do peso, do apetite, está engordando muito ou emagrecendo demais, dores no corpo, dores de cabeça, distúrbios gastrointestinais, crises de choro frequente, crises de ataque cardíaco, palpitação, falta de ar, sempre que você sentir que o pensamento está acelerado ou que está inquieto precisa buscar ajuda o quanto antes. Isso é fundamental, além de adotar uma rotina de autocuidado para que você possa lidar com as tensões do dia a dia. Outra coisa fundamental é dormir bem, não negligenciar o sono, praticar atividade física, ter uma alimentação saudável, praticar meditação, respiração, ter pausas para atividades de lazer, isso vai te ajudar a não desenvolver o distúrbio de ansiedade.
Além da ansiedade, outras doenças psiquiátricas como depressão, estresse, burnout, também aumentaram nesse período. Como superar as adversidades consequentes da ausência de saúde mental?
Ana Paula – Sim, todos os transtornos mentais tiveram aumento após a pandemia não só a ansiedade, mas todos esses outros que relatados. Sempre que um transtorno mental está instalado precisamos em primeiro lugar encara-lo de frente isso o livro ‘E agora? Como ficam as emoções após a pandemia’ fala muito. Não colocar a sujeira debaixo do tapete, primeiro precisamos olhar para tudo e aceitar, acolher o transtorno e entender que ele é um problema que pode ser cuidado. Isso não é maluquice, não é sinal de fraqueza. É algo que precisa ser tratado, buscar uma ajuda profissional, fazer psicoterapia se cuidar melhor, cuidar do seu tempo, fazer pausas necessárias, ter um sono de qualidade, se programar para fazer uma atividade física. Caprichar em prática de respiração e meditação também ajudam.
Em seu livro você compartilha relatos reais de pessoas conhecidas, como foi esse processo e no que eles podem contribuir para que o leitor encontre um ponto de equilíbrio mental?
Ana Paula – Cada capítulo trago histórias reais e entrevistas exclusivas de pessoas que são conhecidas na mídia que sofreram transtornos mentais, o capítulo de burnout trago uma entrevista com a Izabella Camargo ex-jornalista da Globo, o capítulo transtorno alimentar trago uma entrevista com a jornalista Daiana Garbin que também foi repórter da Globo e a apresentadora e jornalista Claudia Tenório falando sobre sua experiência de quase morte. Além de outros capítulos em que trago entrevistas com especialistas em assuntos da saúde mental. Psiquiatras, psicólogos, educador financeiro, o mentor de alta performance, Joel Jota, que também prefaciou o livro. Dessa forma, a minha ideia de trazer esses nomes foi para que pudesse alinhar além da minha experiência clínica como médica e pesquisadora, quando fui escrever essa obra também quis enriquecer o livro com outras vivências e outros olhares de profissionais nesse assunto que é muito importante.
Autora
Ana Paula Peña Dias nasceu em São Paulo. Formada em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas de Santos em 2001, fez residência médica no hospital das Clínicas da USP e mestrado em Gestão de Saúde Coletiva pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês. Foi Secretária Municipal de Saúde de Santo André em 2017 e diretora da Atenção Básica de São Caetano do Sul em 2018. Atualmente é palestrante em empresas que desejam melhorar a saúde mental de seus funcionários e prevenir o burnout. Atende também em sua clínica e atua como mentora de profissionais de saúde que desejam melhorar a gestão de seus consultórios e melhorar sua qualidade de vida.