Telelaboratório já é uma realidade? Essa pergunta foi respondida na quarta-feira (5), pelos Drs. Alvaro Pulchinelli, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML), Carlos Eduardo dos Santos Ferreira, presidente do Conselho de Ex-presidentes da entidade, Daniela Camarinha, Diretora Comercial e de Marketing da FBAH – Federação Brasileira de administradores hospitalares e Sócia da You Care, Eduardo Cordioli, Médico Ginecologista e Obstetra, Mestre em Ciências UNIFESP e Doutorando FICSAE, e Flávio Tocci Moreira, Médico referência do Centro de Telemedicina do Hospital Israelita Albert Einstein, em palestra do 54º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (CBPC/ML).
De acordo com o Dr. Alvaro Pulcinelli, o Telelaboratório ou a Telemedicina é uma atividade que teve uma grande demanda pelos pacientes, especialmente após a pandemia. Muitos descobriram as vantagens de realizar atendimentos, controlar processos à distância e ter acesso à saúde por esse meio.
“Na verdade, o telelaboratório não é algo novo, visto que o telefone é uma ferramenta de trabalho do patologista clínico. Ele o utiliza para contatar os colegas e pacientes e para esclarecer dúvidas. Durante a pandemia, seu papel se tornou ainda mais evidente e fundamental. Com isso, cresce muito em importância, pois com a regulamentação e popularização desses conceitos amplia o leque de opções e horizontes dessas atividades médicas”, explica.
Por outro lado, há várias questões que devem ser pensadas e discutidas. A primeira é: como isso funcionará, partindo do ponto de vista ético, ou da segurança da informação? Até que ponto podemos atuar ou não com o Telelaboratório? Como será a interação com outras especialidades, outros médicos, com os pacientes e de um laboratório para outro?
“São várias vertentes a serem pensadas. É um serviço que deve ser regulamentado e remunerado adequadamente. Estamos acompanhando as regulamentações do Conselho Federal de Medicina (CFM) e, ao mesmo tempo, estamos pensando como será essa remuneração para o Patologista Clínico. Isso será dissolvido no custo do exame? Será que pode ser feito à parte, como uma consulta médica tradicional? Ainda não chegamos a um denominador comum, aguardamos o mercado como um todo se posicionar para termos um balizamento dessas questões”, finaliza.
Paciente transgênero e o teste laboratorial
A conferência “Particularidades laboratoriais do paciente transgênero: do atendimento à liberação dos resultados”, ministrada pelas Dras. Luisane Maria Falci Vieira, coordenadora do Comitê de Gestão da Qualidade da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) e coordenadora do Posicionamento das Sociedades para a inclusão de pacientes transgênero; Tayane Muniz, médica endocrinologista e Derliane de Oliveira, farmacêutica-bioquímica falou sobre o desafio do laboratório clínico para atender o paciente transgênero, trazendo o respeito ao indivíduo, mas também a correta avaliação dos marcadores para que o resultado dos exames sejam fidedigno, durante o 54º CBPC/ML – Congresso Brasileiro de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial.
Em primeiro lugar, a Dra. Luisane colocou a importância de entender os conceitos e as definições básicas para a compreensão do universo para população transgênero e não-binária. Uma questão muito importante salientada foi o respeito ao nome de preferência ou nome social. O atendimento do laboratório deve sempre perguntar a qualquer pessoa “qual nome você prefere que eu use?”.
Da mesma forma, é preciso atentar-se no preenchimento dos dados cadastrais a diferença entre “sexo”, um dado biológico habitualmente binário, e “gênero de escolha”, com o qual o indivíduo se identifica. Pode ser, inclusive, que não se identifique com gênero algum (fluido, não-binário, por exemplo). Apesar do tratamento seguir respeitando o gênero de identificação do paciente sempre que o atendente for relacionar-se com ele, é muito importante explicar algumas particularidades dos laboratórios.
A principal delas é que no laboratório os Intervalos de Referência, que servem de apoio para identificar um diagnóstico, são diretamente relacionados ao sexo biológico do indivíduo, pois foram determinados em homens e mulheres cis.
Outro ponto fundamental é sobre comunicar o uso de medicação como hormônios, comumente usados por esta população para adquirirem características do gênero de identificação. Isso porque os hormônios, como testosterona, por exemplo, interferem na leitura dos exames e o médico patologista clínico precisa desta informação a fim de concluir um laudo correto.
Como a inteligência artificial pode ajudar no diagnóstico em hematologia e onde estamos e até onde podemos ir?
Dr. Wolfgang Kern, um dos fundadores do Laboratório de Leucemia de Munique (MLL), a convite da Dra. Nydia Bacal, realizaram a Conferência Magna “Como a inteligência artificial pode ajudar no diagnóstico em hematologia e onde estamos e até onde podemos ir?”, parte da programação do 54º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (CBPC/ML), no dia 5 de outubro, em Florianópolis (SC).
O médico falou sobre a estrutura organizacional do MLL, descrevendo o sucesso por meio de automação, computação em nuvem, inteligência artificial e diagnóstico molecular de última geração que pode processar dados do genoma do paciente em 3h – um grande avanço em relação aos 13 anos necessários para mapear o primeiro genoma humano.
A missão do MLL, hoje é melhorar o atendimento de pacientes com Leucemia e Linfoma por meio de diagnósticos de ponta. Para fazer isso, o laboratório usa uma abordagem interdisciplinar que combina seis disciplinas – citomorfologia, imunofenotipagem, análise cromossômica, hibridização in situ por fluorescência (FISH), genética molecular e bioinformática – resultando em um relatório abrangente de laboratório integrado.
Nos 15 anos desde a sua abertura, o MLL processou mais de 750.000 amostras de configurações em todo o mundo. O número de funcionários cresceu de apenas 29 para mais de 200.
Através do “controle de pedidos”, evita-se diagnósticos desnecessários e desperdício de tempo e dinheiro, tornando todo o processo mais rápido e barato.
Quando uma amostra chega ao MLL, ela entra em um mundo de extensa automação e digitalização. Ele é adicionado ao banco de dados do MLL, depois rotulado com um código de barras exclusivo para o sangue ou medula óssea de cada paciente e, finalmente, encaminhado para lise celular para amplificação.
Em seguida, os robôs dividem as amostras em porções iguais e as colocam em frascos rotulados com código de barras. Esses frascos são congelados automaticamente em grandes unidades de refrigeração. Na manhã seguinte, o robô recupera automaticamente esses frascos para análises adicionais em um formato de placa de 96 poços.
Outras máquinas preparam o DNA e outro conjunto de dispositivos prepara as amostras para máquinas de sequenciamento. O código de barras atribuído a cada amostra pode ser lido em todas as estações de trabalho e dispositivos em todo o laboratório. O banco de dados do laboratório é atualizado automaticamente à medida que a amostra é transferida entre a equipe e o equipamento, permitindo que qualquer pessoa que consulte as descobertas sobre a amostra receba as informações mais recentes. “Cada amostra pode ser rastreada a cada segundo através de cada máquina e técnico”.
Depois que o sequenciamento é concluído e cada nova informação é inserida no banco de dados do laboratório, um sistema automatizado define as próximas etapas para processamento, medição, avaliação e diagnóstico.
No futuro, as técnicas moleculares serão os métodos mais importantes para nos ajudar a capturar todas essas informações, hoje, o diagnóstico genético se baseia na citogenética e na análise de mutações. Em breve, o MLL fará mais sequenciamento do genoma e do transcriptoma completo.
A visão de futuro é incluir o perfil de expressão gênica nos diagnósticos, podendo até capturar características que agora são determinadas por imunofenotipagem e citomorfologia.
Computação mais poderosa e capacidade de dados ilimitada por meio do armazenamento em nuvem ajudaram o laboratório a acelerar sua pesquisa: os técnicos podem executar até 18 pacientes por execução de todo o genoma e o laboratório executa até 150 genomas por semana.
O MLL tem mais de 3 pentabytes de dados dos genomas e transcriptomas retirados de mais de 5.000 casos que estão completamente caracterizados, e podem olhar para trás para ver como o sequenciamento do genoma pode adicionar mais informações ou apoiar as informações que obtém com as técnicas de rotina que usam. O MLL está usando ferramentas de computação em nuvem e inteligência artificial para atingir esses objetivos de pesquisa.
Os resultados da pesquisa da MLL são publicados em revistas internacionais revisadas por pares e apresentados em conferências médicas e eventos científicos.
Em citogenética, por exemplo, o MLL desenvolveu um algoritmo baseado em inteligência artificial (IA) para realizar cariotipagem, em vez de ter um morfologista revisando as metáfases manualmente. A IA também foi incorporada em ensaios piloto em imunofenotipagem e citomorfologia, onde a classificação das células é feita com base na IA.
A tecnologia mais importante usada para agilizar o fluxo de trabalho no MLL é seu sistema proprietário de informações e gerenciamento de laboratório (LIMS). O sistema está em constante atualização. Ele tem quatro rollouts por dia, ou seja, quando um técnico vem trabalhar em um determinado dia, ele não estará usando a versão LIMS do dia anterior.
Ele observou que cerca de 50% das máquinas do MLL são organizadas pelo sistema LIMS. A maioria dos dispositivos no laboratório é interconectada por meio de sensores, software e outras tecnologias, economizando tempo e minimizando o risco de erro humano. “São credenciados de acordo com os mais altos padrões da Europa: ISO 15189 e 17025. “Querem estar sempre na vanguarda do que vem a seguir.” Esse desejo tem levado os fundadores a adotar e incorporar totalmente a tecnologia em seu laboratório.
PCR para HPV é arma poderosa para prevenção de câncer de colo uterino
“Rastreio do câncer de colo uterino por testes moleculares” foi debatido durante o 54º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (CBPC/ML) demonstrando que os testes moleculares, como o PCR, são mais eficientes na prevenção do câncer do colo uterino que o tradicional Papanicolau, que é o exame citológico.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer do colo do útero é o quarto tipo mais comum entre as mulheres (exceto os casos de pele não melanoma), com aproximadamente 530 mil novos casos por ano em todo o mundo. É responsável por 265 mil óbitos por ano, sendo a quarta causa mais frequente de morte por câncer em mulheres. No Brasil, a mortalidade é de 6.385 por 100 mil mulheres por ano, especialmente na faixa estaria de 40 a 49 anos.
Melhorar a prevenção, rastreamento é sempre a melhor forma de diminuição dos agravos causados pela doença. No entanto, no Brasil o exame mais usado para o diagnóstico ainda é o Papanicolau. “Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos, a pesquisa molecular de HPV de Alto Risco foi incluída nos protocolos de rastreio desde 2012, comenta a Dra. Leticia Katz, Diretora de Programa de Saúde Pública da Sociedade Brasileira de Citopatologia. “No Brasil, não só o exame utilizado, mas a jornada da paciente após um exame positivo, é uma grande preocupação, por conta da complexidade e o pouco acesso ao sistema de saúde brasileiro”, comenta.
A palestrante Katia Luz Torres, Diretora de Ensino e pesquisa da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Amazonas, compartilhou sua experiência em um trabalho de campo com o rastreamento de cerca de 400 mulheres ribeirinhas. Na amostra foram encontrados dois casos de câncer de colo de útero, considerada uma alta incidência, e que iniciativas dessa natureza poderiam ser um avanço na disseminação do avanço da doença em sua forma mais letal.
José Eduardo Levi, pesquisador do Instituto de Medicina Tropical (Lab. de Virologia) da Universidade de São Paulo e P&D da Dasa, comentou que os testes moleculares são ideais para serem feitos em larga escala, pois são mais automatizados, diminuindo as chances de erro e melhorando rapidez do diagnóstico e confiabilidade do exame. “Como o rastreamento do câncer do HPV deveria ser feito em toda mulher na faixa etária recomendada, usar o exame molecular, que é um teste muito mais sensível, melhoraria a sensibilidade de diagnóstico”, argumenta.
Para Neila Maria de Góis, Presidente da Comissão Nacional Especializada no Trato Genital Inferior da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), os médicos ginecologistas deveriam atentar ainda para a faixa etária de solicitação do exame, uma vez que solicitar ao adolescente, que frequentemente demonstra infecção pelo HPV rapidamente clareada pelo sistema imune, e que poderia ser um desperdício de esforços ao sistema e tratamentos desnecessários. “É preciso observar diretrizes e recomendações de rastreios”, segundo ela.
Para o patologista do Laboratório de Genética Molecular do Laboratório Clínico do Hospital Israelita Albert Einstein, Luiz Gustavo Cortes, comenta que “é necessária uma construção do paradigma para migrar para o PCR de HPV”, pois o Sistema de Saúde no Brasil ainda é baseado no Papanicolau, teste rudimentar e que depende muito da interação humana.
Annelise Correa Wengerkievicz Lopes, médica patologista clínica e Diretora de marketing e comunicação da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) e Gerente médica executiva da Dasa em Florianópolis comenta que ainda hoje existe um grande número de solicitações de captura hibrida, o primeiro teste molecular a ser disponibilizado no início dos anos 2000, mas que o PCR tem a vantagem de ser diferenciar os subtipos de HPV 16 e 18, que são os mais oncogênicos, e conter controle interno de reação, que garante que havia material biológico e a reação transcorreu como deveria. “Por isso, o PCR deveria ser considerado o método de predileção para rastreio populacional do HPV”, finaliza.