Caracterizadas como doenças metabólicas, isto é, relacionadas a processos e mudanças bioquímicas importantes para o bom funcionamento do corpo, os LC-FAOD são causados pela falta e/ou deficiência de proteínas que transportam ou quebram ácidos graxos (gorduras) de cadeia longa e os “transforma em energia”. Rara e hereditária, a doença compromete, principalmente, coração, músculos e fígado – os sintomas podem se manifestar dentro de algumas horas após o nascimento ou somente na vida adulta.
Os tipos de LC-FAOD, cujos sintomas podem variar em gravidade e idade de início, são: deficiência de carnitina-palmitoil transferase I (CPT I), deficiência de carnitina-palmitoil transferase II (CPT II), deficiência de carnitina-acilcarnitina translocase (CACT), deficiência de acil-coenzima A desidrogenase de cadeia muito longa (VLCAD), deficiência de proteína trifuncional (TFP) e deficiência de 3-hidroxiacil-coenzima A desidrogenase de cadeia longa (LCHAD). 1 2 3
“Para cada um dos seus seis tipos, uma proteína que ajuda o corpo a utilizar gordura como energia por meio de reações químicas específicas é defeituosa. Quando o corpo não consegue converter gordura em energia como deveria, ocasiona-se os sintomas clínicos” explica Ida Vanessa Doederlein Schwartz, médica geneticista, professora do departamento de Genética da UFRGS e chefe do Serviço de Genética Médica e de Referência em Doenças Raras do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (RS).
Os sinais e sintomas crônicos podem se desenvolver ao longo do tempo e piorar em meses ou anos e incluem fadiga, dor muscular, cãibras, fraqueza, hipoglicemia hipocetótica (diminuição dos níveis de glicose no sangue em resposta ao jejum prolongado), insuficiência hepática e cardiomiopatia. Os sintomas podem ser provocados ou agravados por jejum ou outra condição de saúde, exercício prolongado e estresse fisiológico.
Já os sinais e sintomas agudos de LC-FAODs se desenvolvem, geralmente, durante uma fase da doença ou jejum prolongado, mas também podem ocorrer de forma imprevisível. As crises agudas podem incluir condições graves, como lesão do músculo cardíaco (cardiomiopatia), ruptura muscular (rabdomiólise), baixo nível de açúcar no sangue (hipoglicemia), náuseas e alterações no apetite.
“No caso de bebês e crianças pequenas, é necessário um olhar atento a sinais específicos de uma crise metabólica, tais como acometimento neurológico (sonolência extrema, coma), alterações dos batimentos cardíacos, fraqueza muscular, alterações no apetite”, explica Ana Cecília Menezes de Siqueira, gastroenterologista pediátrica e coordenadora médica do Centro de tratamento de Erros Inatos do Metabolismo e Doenças Raras do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP).
Diagnóstico e tratamento
Recentemente, o governo brasileiro sancionou a lei 14.154/20214 que inclui o rastreamento, de forma escalonada, de outros grupos de doenças ao Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN) realizado no Sistema Único de Saúde (SUS) e que tem como objetivo proporcionar o diagnóstico precoce de doenças tratáveis em recém-nascidos. Os distúrbios da oxidação dos ácidos graxos, nos quais incluem-se os distúrbios de oxidação de ácidos graxos de cadeia longa, são doenças que serão incorporadas na segunda fase da ampliação do PNTN.
As pessoas que não conseguem identificar a doença por meio da triagem neonatal, podem apresentar quadro clínico grave e potencialmente fatal, bem como fadiga muscular e/ou dor crônica e intermitente5. Neste caso, o diagnóstico é feito por meio da identificação de sintomas, testes clínicos, exames laboratoriais e confirmação por teste genético.
Atualmente, existe terapia medicamentosa aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que atua como fonte de calorias e ácidos graxos para o tratamento de pacientes pediátricos e adultos com distúrbios de oxidação de ácidos graxos de cadeia longa confirmados molecularmente6 7.
Referências:
1 Vockley J, Charrow J, Ganesh J, et al. Mol Genet Metab. 2016;119(3):223-231;
2 Merritt JL 2nd, MacLeod E, Jurecka A, Hainline B. Clinical manifestations and management of fatty acid oxidation disorders. Rev Endocr Metab Disord. 2020 Dec;21(4):479-493. doi: 10.1007/s11154-020-09568-3;
3 Baker JJ, Burton BK. Diagnosis and Clinical Management of Long-chain Fatty-acid Oxidation Disorders: A Review. REV Endocrinol. 2021 Nov;17(2):108-111. doi: 10.17925/EE.2021.17.2.108;
4 BRASIL. LEI Nº 14.154, DE 26 DE MAIO DE 2021. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 27 maio de 2021. Disponível em: Link. Acessado em 28/7/2022;
5 Spiekerkoetter, U, Lindner M, Santer R, et al. J Inherit Metab Dis. 2009;32(4):488-497;
6 Vockley J et al. UX007 for the treatment of long chain-fatty acid oxidation disorders: Safety and efficacy in children and adults following 24 weeks of treatment. Mol Genet Metab. 2017;120(4):370-377;
7 Vockley J et al. Results from a 78-week, single-arm, open-label Phase 2 study to evaluate UX007 in pediatric and adult patients with severe long-chain fatty acid oxidation disorders (LC-FAOD).J Inherit Metab Dis. 2019;42(1):169-177.