O novo governo está sinalizando com a possibilidade de um diálogo maior sobre política industrial para saúde no país. As discussões passam, inclusive, pela decisão de considerar Saúde como tema estratégico. Por exemplo: Segurança é, por si só, uma área estratégica definida como política de Estado, pois assegura a proteção física da população numa hipotética situação de invasão por outros países. Garante a liberdade e autonomia política e econômica de um país.
Por analogia, então, um país que depende dramaticamente de outros para se suprir de tecnologia de saúde, fica absolutamente exposto a grandes movimentos de uma crise sanitária. Epidemias e pandemias, seguindo o exemplo, podem oferecer efeitos bastante negativos à população de um país que não tem autonomia para resolver suas questões sanitárias. Em um mundo que deixa de ser tão globalizado – temos visto que o protecionismo começa a ressurgir! – cada país tem como imperativa prioridade a resolução dos problemas da SUA população. Somente depois, quando todos os seus cidadãos forem atendidos, pode ser liberada a exportação de produtos e serviços para outros países. Foi exatamente o que sofremos com a pandemia da Covid-19.
Quando falamos sobre equipamentos médicos, praticamente todo o complexo industrial global está concentrado em apenas quatro países: Estados Unidos, China e Alemanha e Holanda. Norteamericanos, holandeses e alemães, certamente, priorizaram seus próprios países para fornecimento de insumos e equipamentos. Não podemos esquecer que, durante a pandemia, houve clara deliberação contrária a exportação nestes países. Nós fomos obrigados a comprar muitos equipamentos chineses que sequer tinham registro em seu país de origem! A consequência: muitos deles não funcionaram. A maioria não tem serviço de pós-venda e hoje estão quebrados, encostados em algum galpão. Quanto dinheiro e, principalmente, quantas vidas se perderam com essa defasagem tecnológica…
Mas tem mais: o impacto na balança comercial foi brutal. E assim segue! De seis anos para cá, a indústria nacional de equipamentos médicos vem perdendo espaço e força. O pouco que se conseguiu evoluir em algumas áreas, até 2017, vem sendo defasado devido a desinvestimentos, principalmente pelas multinacionais.
Então, a conclusão é quase óbvia: considerando as relações geopolíticas, estamos sempre dependendo de que tudo ocorra bem para mantermos nossa autonomia, suprindo nossas necessidades. Há que se ter consciência de todos os elos da cadeia de saúde que o fomento e o apoio a indústria nacional é estratégico para o país. É benéfico para nosso povo. É um tema também de sustentabilidade da população. Os grandes grupos de prestadores de serviços têm que participar desta discussão. Tecnologia pode ser desenvolvida aqui no Brasil.
Veremos então, como o novo governo se comportará frente a este dilema. Saúde é área estratégica e prioritária, ou não? Muitos outros países já responderam “Sim”!
Daurio Speranzini Jr. é um dos mais experientes líderes empresariais do mercado da tecnologia médica do Brasil. Formado em engenharia mecânica pela FEI, possui MBA pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e extensão em Business Administration pelo Massachusetts Institute of Technology – MIT. Há 20 anos ocupa posições muito destacadas – vice-presidente, presidente e/ou CEO – nas maiores companhias mundiais com foco em tecnologia, saúde e healthcare. Toda essa experiência proporcionou um capital importante para análises profundas sobre as características e os processos operacionais das estruturas de saúde, públicas e privadas