A educação no Brasil perdeu, de bons tempos para cá, a interrelação com a boa formação, tornando-se simplesmente um negócio para a maioria dos donos de escolas e faculdades. O reflexo da mercantilização é sentido em várias etapas dos estudos, com desdobramentos importantes em toda a sociedade.
No Ensino Fundamental, I ou II, muitas crianças passam de ano mal sabendo ler ou formular uma oração com sujeito, verbo e predicado. Assim, começam a ruir sonhos de milhões de brasileiros que, amanhã, provavelmente não terão boas oportunidades no mercado de trabalho e comporão a parcela mais vulnerável.
No Ensino Médio, estudantes despreparados também recebem diplomas completamente crus. Vários ultrapassam essa fase analfabetos, semianalfabetos ou analfabetos funcionais – aqueles que não conseguem compreender uma frase simples ou se expressar por meio de letras e números em situações cotidianas. Aliás, três em cada dez brasileiros integram esse grupo.
É uma catástrofe para a vida dessas pessoas e para o país, já que não se constrói uma nação digna e justa sem conhecimento e formação adequada. Isso explica porque estamos onde estamos, mesmo sendo um Brasil abençoado por Deus e bonito por natureza, como cantando em nossa MPB.
A visão destorcida do ensino transforma gente em gado, e só ganha com isso quem lucra com o negócio educação. Aqui, incluo os políticos, regados à mordomia, mas sem qualquer compromisso público, e os maus empresários.
Esta segunda casta, a dos maus empresários, apadrinhada pela primeira, dos péssimos políticos, vem destruindo também a capacitação universitária. É corriqueiro vermos bons jornalistas reclamando da formação dos novos repórteres pelas faculdades. A Ordem dos Advogados do Brasil, por sua vez, reprova todos os anos a maioria dos graduados que se submetem a seu exame, por insuficiência, e por aí vai. O fenômeno se repete por todas as profissões.
Na medicina, o estrago é risco à saúde pública. Conforme atentam provas realizadas pelo Conselho Regional (Cremesp) ao longo da última década, a maioria de nossos “doutores” recebe seu diploma e vai para a linha de frente do atendimento sem a mínima base.
Na avaliação aos recém-formados de 2018, dos 3.174 participantes, 38,2% não conseguiram a nota mínima. Dentre as questões, 86% erraram a abordagem a pacientes vítimas de acidente de trânsito e outros 69% não sabiam as diretrizes para medir a pressão arterial. Mais 68% dos médicos não acertaram a conduta que deve ser realizada para pacientes infarto.
Quer dizer, cada vez mais, ao entrarmos em um consultório para uma consulta, teremos de fazer o sinal da cruz e seja o que Deus quiser. Uma situação simplesmente inadmissível, em se tratando de saúde e vida de cidadãos.
Esperamos que o novo Governo cumpra mesmo as promessas de campanha e passe o Brasil a limpo em todos os aspectos, a começar pela educação. No que tange a nossa saúde, todos nós, pacientes, queremos e temos por direito constitucional o melhor: uma Medicina com M maiúsculo.
Antonio Carlos Lopes é presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM)