O número é chocante. Cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos no mundo, o que equivale a uma morte a cada 40 segundos. Os dados são da Organização Mundial da Saúde (OMS), que reconhece o suicídio como uma prioridade de saúde pública. Só no Brasil, a estatística aponta um aumento de 7% na taxa de autoextermínio a cada 100 mil habitantes. O assunto ainda é tabu em diversos âmbitos da sociedade, o que impede que o suicídio seja discutido abertamente, indo contra uma das principais armas no combate a essa epidemia silenciosa: a comunicação.
“O preconceito, a falta do acolhimento e da escuta, são fatores prejudiciais no trabalho da prevenção ao suicídio. Existe sempre um julgamento, quase que uma condenação dos sentimentos das vítimas, que por esse motivo, muitas vezes se calam e silenciam as dores e as angústias. É preciso difundir cada vez mais o tema e promover a reflexão sobre a valorização da vida”, explica o Chefe do Departamento de Psicologia do Hospital de Caridade São Vicente de Paulo (HSV), de Jundiaí (SP), Roberto Tafarello.
Além dos transtornos mentais, como a depressão e a ansiedade, outras situações estão ligadas ao comportamento suicida, como problemas financeiros, términos de relacionamentos, alcoolismo, violência, abusos ou perdas. A estatística também aponta taxas elevadas de suicídio em casos de descriminação.
Roberto conta que existem alguns comportamentos de alerta que são perceptíveis durante o convívio, como isolamento do indivíduo, falta de apetite, sentimento de inferioridade e perseguição. “Tratamos esses sentimentos como um iceberg em nossos cérebros. A ponta é a parte consciente, onde conseguimos identificar algumas dessas aflições. Já a parte inconsciente, que é maior, está embaixo da água, escondida. Nesses casos, conseguimos explorar e tratar esses sentimentos em terapia. No Hospital São Vicente nós atendemos predominantemente jovens, de 18 a 34 anos aproximadamente, mas com muita variação de gênero. Felizmente, nós conseguimos reverter o quadro clínico da maioria dos atendimentos emergenciais por tentativa autoextermínio”.
Após receber o cuidado médico necessário, o paciente é avaliado pela equipe da psiquiatria e dependendo do diagnóstico, permanece internado, recebe alta, ou é encaminhado ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). “Nós também atendemos os familiares durante as visitas. Essa abordagem é realizada junto com a equipe multidisciplinar, onde explicamos a importância desse paciente manter o acompanhamento psicológico, de não julgá-lo pelo acontecido e sim acolhe-lo”, orienta o psicólogo.
Você não está sozinho!
O principal serviço voluntário e gratuito que o país possui hoje é o Centro de Valorização da Vida (CVV), que realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo por telefone – por meio do número 188 – e-mail e chat 24 horas todos os dias no site da ONG: www.cvv.org.br/quero-conversar.
Quem cuida, precisa ser cuidado
No São Vicente, além da atenção dada aos pacientes, também é feito atendimento voltado à saúde mental dos colaboradores, que é realizado no departamento da Medicina do Trabalho. Os atendimentos são realizados por psicólogos e psiquiatras. “Eu me senti acolhida e apoiada pelo hospital, especialmente no início da pandemia Covid-19, quando o mundo todo estava em um momento difícil e as informações da OMS ainda eram desencontradas. Nosso psicológico vira um turbilhão, misto de querer ajudar com medo de ficar doente. Na mesma época passava por problemas pessoais. O atendimento da equipe foi essencial e tem sido até hoje. Sigo em acompanhamento com consultas a cada dois meses. Me sinto fortalecida e pronta para seguir sempre em frente”, afirma uma colaboradora que prefere não se identificar.