Uma nota técnica produzida por pesquisadores em parceria com diversas universidades brasileiras apontaram como impraticável o alcance da chamada imunidade de rebanho no Brasil, quando uma parcela elevada da população já contrai o vírus da Covid-19, minimizando sua circulação e seus potenciais efeitos.
A taxa considerada mínima para o alcance desse tipo de imunização é de 60% da população local. Hoje, de acordo com os pesquisadores, os estados que apresentam maiores estimativas do percentual de infectados pelo vírus SARS-CoV-2, incluindo casos assintomáticos, são Roraima (27%); Rio de Janeiro (23%); e Distrito Federal (20%). O estado de São Paulo possui índice estimado de 15%. Os estados de Santa Catarina e Paraná apresentam as estimativas mais baixas (7%), seguidos por Minas Gerais e Rio Grande do Sul (8%); e Mato Grosso do Sul (9%).
“Para realizar os cálculos, utilizamos um modelo que consiste em separar toda a população em seis categorias: proporção de indivíduos suscetíveis, ou seja, não imunizados e ainda não infectados; proporção de indivíduos expostos, que são infectados, mas ainda não contagioso; proporção de indivíduos sintomáticos, que são aqueles infectados, contagiosos e com sintomas; proporção de indivíduos infectados e não relatados, usualmente infectados leves e assintomáticos; proporção de indivíduos hospitalizados; além da proporção de indivíduos recuperados da Covid-19 e imunizados”, explica Fulvio Alexandre Scorza, professor do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp) um dos pesquisadores envolvidos na elaboração da nota técnica.
De acordo com Scorza, “os dados mostram que em todas as unidades da federação existe ainda uma enorme distância do que seria uma imunidade de rebanho. Acreditar nisso traz importante risco, já que acarretaria em muitos custos de vidas, em cuidados hospitalares, não apenas de curto prazo, mas possivelmente por anos dadas as inúmeras sequelas da Covid-19, além de maior queda da atividade econômica, provocada por um quadro de desalento decorrente de uma epidemia fora de qualquer controle.”
Dados de óbitos por Covid
A nota técnica também traz dados relativos ao número de óbitos por Covid-19 nos estados brasileiros. O levantamento indica que a quantidade real de mortes é, no mínimo, 30% superior aos valores anunciados.
“Os fatores que explicam essa diferença já são conhecidos. Além do atraso na notificação da morte por Covid-19 pela demora nos resultados de testes, há a demora na testagem após o óbito, resultando em falso-negativo, e também a não realização do teste, sem contar a morte sendo registrada como devida a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) por causa desconhecida. É importante também destacar a demora para a consolidação das informações e posterior transmissão das mesmas pelas Secretarias Estaduais de Saúde, entre um a dois meses segundo o estado”, afirma o pesquisador da EPM/Unifesp.
Para Scorza, os dados apresentados na nota técnica reforçam que o país ainda enfrenta um patamar elevado de casos do novo Coronavírus, o que requer extrema atenção por parte dos gestores públicos. “É fundamental que baseiem suas decisões na melhor evidência científica disponível, para que pese alternativas e debata as consequências de diferentes cursos de ação. Nesse sentido, devem buscar como exemplo a realização de extensas campanhas públicas de informação da população sobre os cuidados essenciais, a implementação de ampla política de testagem, além de conduzir com muita cautela o processo de flexibilização, incluindo a abertura de escolas, antes do real controle da pandemia, sob risco de consequências graves para sua população”, conclui o pesquisador.