Pela primeira vez na história, a produção de uma vacina que demoraria dez anos, levou apenas dez meses, mesmo sem cortes nas etapas de testes e fabricação. Estudos publicados pela Oxford confirmam que a vacina é de fato altamente eficaz em interromper a evolução da Covid-19. Parece um milagre, mas na realidade, essa é uma tendência do mundo moderno: a aplicação da chamada filosofia ágil.
Depois de cases de fracasso, como o surto de ebola entre os anos de 2014 e 2016, quando a resposta lenta da ciência ao problema acabou levando à morte de mais de 11 mil pessoas, desta vez, a história foi diferente. Cientistas ao redor do mundo assumiram uma postura proativa, e antes mesmo que a pandemia explodisse, já realizavam pesquisas sobre o possível surgimento de um novo vírus e, felizmente, a “família” Coronavírus era um objeto de estudo entre eles. Nesse contexto, já no dia 11 de janeiro, cientistas compartilhavam com o mundo o código genético do Coronavírus para o desenvolvimento da futura vacina.
A novidade no processo foi a adoção da filosofia ágil, uma herança das indústrias automotiva e de tecnologia da informação, que propõe o abandono da tradicional gestão de projetos, com o objetivo de aprimorar o processo de desenvolvimento de um produto ou serviço. Para isso, o projeto é dividido em pequenas etapas e são feitas entregas com maior rapidez e frequência, mirando a obtenção de um resultado ágil e eficaz.
A elaboração de outras vacinas exigia poucas interações, o que fazia com que as devolutivas demorassem mais e, consequentemente, o resultado final também. Já para a produção da vacina contra a Covid-19, os pesquisadores se dividiram em pequenas equipes com diferentes funções cada, e conforme algum progresso era feito ou qualquer informação nova era descoberta, as novidades eram comunicadas aos órgãos reguladores.
Eventualmente, caso algo desse errado, as equipes trabalhavam rapidamente no problema para que o resultado retornasse aos órgãos reguladores para análise, o que encurtou significativamente o desenvolvimento do imunizante. Por isso, os planos de aprovação e fabricação da vacina também foram dramaticamente acelerados, uma vez que os reguladores, que normalmente esperariam até que os testes fossem concluídos, foram envolvidos desde o início.
Sendo assim, mesmo com toda a agilidade na produção da vacina, o cuidado com o processo foi mantido; o que mudou foi o modus operandi. Os testes só começaram a ser realizados depois que os cientistas tivessem certeza de que ela era segura, e ela passou por todos os estágios de testes que normalmente seriam realizados. O que não aconteceu foram anos de espera entre cada fase.
Tal metodologia sugere uma abordagem inovadora da gestão de projetos para, com um maior número de interações ao longo do processo, agilizar o fluxo de trabalho e promover mais assertividade. O que tiramos de lição desse acontecimento revolucionário é que, se essa forma de pensar pode ser aplicada até mesmo na indústria farmacêutica, um setor de muitos regulamentos e legislações, por que não adotá-la em outros segmentos ou até mesmo no nosso dia a dia? Dá para imaginar os benefícios que poderíamos conquistar na produção nacional como um todo.
Sem dúvida, a adoção de metodologias ágeis na gestão de projetos deve ser um bom legado deixado pela Covid-19. Cabe às empresas, de todos os portes e segmentos, desenvolver essa mentalidade para aumentar a eficiência e assertividade na criação de produtos ou serviços.
Alexandre Pierro é sócio-fundador da PALAS e um dos únicos brasileiros a participar ativamente da formatação da ISO 56.002, de gestão da inovação