22 de dezembro de 2017: um marco na história da assistência psiquiátrica no Brasil. Neste dia, o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº 3.588, que inicia um redirecionamento da política de assistência ao doente mental obedecendo fielmente a Lei nº 10.216/2001.
Antes disso, nos últimos 30 anos, nenhum avanço nas políticas públicas de assistência psiquiátrica no Brasil havia ocorrido. Pelo contrário, apenas retrocessos liderados por uma militância ideológica de não-médicos que ocupou a Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde e promoveu a desassistência no Brasil.
Por acreditarem que o paciente psiquiátrico não é doente e sim diferente; e que ele não necessita de tratamento e sim de cuidados, promoveram uma progressiva exclusão do médico do sistema público de assistência psiquiátrica e o fechamento de leitos especializados, quando o correto seria qualificá-los.
O Brasil retrocedeu à psiquiatria religiosa e policial, abandonando a científica que conta com recursos terapêuticos altamente eficientes. Todos sabemos que o diagnóstico precoce de uma doença mental e o rápido início do tratamento farmacológico melhora muito o prognóstico do paciente.
Nesse longo período de exclusão do psiquiatra da assistência, o prejuízo para os doentes mentais foi de grande significado para as suas vidas e de suas famílias.
Sem a chance do diagnóstico nem do tratamento precoce, o paciente foi condenado ao livre curso da doença e à consequente e irreversível deterioração. A experiência de programas de assistência ao doente mental elaborados por “filósofos”, alicerçados em premissas falsas e com excessiva ideologização, foi desastrosa para o país.
Os pacientes esperam que a lição tenha sido aprendida, pois essa construção precisa ter: a colaboração de secretários estaduais e municipais de Saúde, que conhecem de perto o caos reinante na assistência psiquiátrica e são cobrados diretamente pela população; a participação dos psiquiatras, que detêm o conhecimento técnico; e a atuação dos profissionais de saúde que compõem a equipe psiquiátrica, com muito a contribuir.
Mas, fundamentalmente, a assistência psiquiátrica deve ter um coordenador sério, com conhecimento da área, experiência na assistência e obstinado.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) propõem diretrizes para um modelo de assistência integral em saúde mental no Brasil, documentado por meio da Resolução nº 1952/2010.
É basilar que o paciente receba o atendimento que necessita e não aquele que o sistema tem disponibilidade. E, para isso, em cada um dos serviços, a equipe psiquiátrica deve ser completa e contar com médico psiquiatra (coordenador), médico clínico, enfermeiro, assistente social, psicólogo, farmacêutico, nutricionista, terapeuta ocupacional, educador físico e profissionais de nível médio.
A característica interprofissional da equipe psiquiátrica garante a assistência global ao paciente, na qual os aspectos biológicos, psicológicos e sociais são considerados, observando-se o modelo médico.
Assim, é imprescindível que sejam feitas avaliações objetivas capazes de aferir com segurança os resultados de cada serviço seguindo os instrumentos de avaliação consistentes e tecnicamente, desenvolvidos pelo CFM por meio de seu Departamento de Fiscalização, os quais deveriam ser observados pelos gestores na área da Saúde Mental.
Nesse processo, é importante que os envolvidos na assistência ao doente ofereçam sua contribuição para que tenhamos êxito. Aquele que quiser se opor às ações que vem sendo realizadas pelo psiquiatra Quirino Cordeiro, atualmente à frente da Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde, precisa primeiro cegar os olhos da própria consciência.
Nesse momento, em que o país passa por um grave contexto socioeconômico e político, com intensa piora nas mazelas da saúde, prejudicando pacientes e profissionais, precisamos abraçar a causa em defesa da segurança e nos organizar para melhorar a saúde de nossa população, muito sofrida e carente de sua maior expectativa: ter uma saúde de qualidade.
Salomão Rodrigues Filho é médico psiquiatra, conselheiro do Conselho Federal de Medicina e do Conselho Regional de Medicina do Estado de Goiás