No início de fevereiro, a deputada Rosangela Gomes (Republicanos-RJ) apresentou o Projeto de Lei n. 353/2023, pretendendo tornar obrigatória a divulgação da lista dos plantonistas, dias e horários que atendem em todas as unidades públicas de saúde, além da disponibilidade de leitos, ocupados e livres. Questiona-se, contudo, se tal proposta apresentaria riscos à classe médica, no tocante a sua exposição perante uma sociedade violenta em que, por muitas vezes, atribui culpa aos profissionais pelas consequências da ineficiência da gestão pública.
O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP) publicou, em 2015, uma pesquisa do Datafolha[1] que demonstrava alarmantes índices de violência contra a classe médica daquele estado – o maior polo médico do país –, na qual quase dois terços já vivenciaram ou conheceram colegas agredidos. Dentre os supostos motivos das hostilidades, a demora no atendimento é a principal, descambando em episódios de agressões verbais, psicológicas e físicas – vitimizando na grande maioria médicas ou jovens profissionais. De certo, pouco foi feito nos últimos anos para que esse quadro degradante evoluísse de forma satisfatória, agravando-se ainda mais no período da pandemia.
Não obstante, o serviço público se rege por vários princípios norteadores da sua (in)eficiência. Superando-se as várias críticas cabíveis à gestão, os atos públicos e o seu modus operandi devem primar pela transparência e publicidade àquilo que não seja um dado sensível. Portanto, a disponibilização de informações relativas ao quadro de profissionais plantonistas atende a tais princípios. Os dias e horários dos seus respectivos plantões permitem à sociedade acompanhar os préstimos do profissional, bem como a efetividade de tais serviços. Ademais, a clara informação quanto a disponibilidade de leitos credenciados pode auxiliar na distribuição das demandas entre as unidades de saúde, posto que a população, de modo geral, poderia presumir em quais destas seria primeiramente atendido.
Além dos princípios públicos já citados, importa também esclarecer que a relação médico-paciente se dá tanto pelo Código de Ética Médica quanto o de Defesa do Consumidor, e ambos prezam pela transparência para com o paciente. Assim, quer seja o projeto aplicado ao meio público, também não haveria impeditivos à sua aplicação no âmbito privado, porquanto já reiteraria princípios próprios à medicina. De outro lado, o Projeto de Lei em questão mais uma vez se mostra assertivo, na medida em que determina a publicização de tais atos em local de fácil visibilidade aos pacientes e seus respectivos familiares, obrigando, inclusive, que conste número telefônico e endereço eletrônico dos setores fiscalizadores para a realização de eventuais denúncias.
As informações dos plantonistas que deverão ser divulgadas, sob nenhuma medida, poderão violar a sua intimidade ou expor informações pessoais, como endereço ou telefone particular. Embora o triste quadro de violência aos profissionais da saúde seja fato notório e preocupante, que reclama medidas efetivas à sua segurança, não pode ser um obstativo aos princípios da publicidade e transparência, porquanto visam a melhor eficiência do serviço público em benefício da sociedade.
Ítalo Roberto de Deus Negreiros é advogado das áreas de Direito Trabalhista e Direito Médico de Martorelli Advogados
Referência:
[1] Disponível em <www.cremesp.org.br/?siteAcao=Jornal&id=2120>. Acesso em 24 de fev. de 2023.