Cientistas identificam molécula inédita para estudos oncológicos

Uma das etapas importantes da busca por novos medicamentos é encontrar uma molécula que seja capaz de impedir o funcionamento de uma proteína-chave ligada à enfermidade. Muitas vezes os cientistas encontram moléculas que interrompem o funcionamento de proteínas-alvo da doença, mas de nada vale se esta molécula também se ligar a uma gama de outras proteínas que não estão envolvidas no processo. Por esta razão, uma boa molécula candidata a medicamento deve ser seletiva, específica e potente.

Recentemente, em um esforço conjunto, um grupo de pesquisadores do Centro de Química Medicinal da Unicamp (CQMED) e do Aché Laboratórios Farmacêuticos encontraram uma molécula bastante seletiva e com aplicação inédita em enzimas envolvidas em contextos oncológicos. Essa molécula foi capaz de inibir as proteínas DYRK1A e DYRK1B, abundantes em processos tumorais. O estudo foi publicado recentemente na revista científica Bioorganic & Medicinal Chemistry Letters.

“Nosso objetivo foi encontrar um inibidor que fosse seletivo e potente para agir nas proteínas DYRK1 para então explorar esse potencial terapêutico da molécula”, explica Rafael Couñago, pesquisador principal do CQMED e autor do estudo.

A molécula inibidora se liga tanto na DYRK1A quanto à DYRK1B, que são muito semelhantes do ponto de vista estrutural. Ambas são enzimas do tipo quinase, que tem sido consideradas bom alvos para o desenvolvimento de estratégias terapêuticas ao longo dos últimos anos.

Dada a sua relação com processos tumorais, a DYRK1 A é uma quinase bastante estudada pelos cientistas. Entretanto, até então, todos os inibidores desta proteína não eram seletivos o suficiente, atingindo toda uma família de quinases, o que inviabilizava o avanço no uso destes inibidores em terapias em decorrência da sua toxicidade, explica Couñago.

Neste trabalho, a grande novidade foi que os autores criaram uma molécula inibidora a partir de um núcleo químico inédito daqueles já reportado na literatura científica para estas proteínas. “O uso deste núcleo químico tornou a molécula mais seletiva, sendo consideravelmente mais potente contra as DYRK1 do que contra outras proteínas humanas”, esclarece Couñago.

Os autores testaram a nova molécula em 480 quinases e observaram que o composto inibiu a DYRK1A e DYRK1B. “O padrão de seletividade é totalmente diferente do que existia até então e é complementar ao que já se conhece na literatura”, explica Hatylas Azevedo, gerente de Pesquisa e Desenvolvimento no Aché Laboratórios Farmacêuticos e autor do estudo. “Temos, portanto, uma nova ferramenta que vai ajudar a investigar o papel dessa quinase em contextos oncológicos”, complementa Azevedo.

Colaboração em inovação aberta 

A parceria entre o CQMED e o Laboratório Aché nasceu há cinco anos no modelo de ciência aberta e foi mediada pela EMBRAPII (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial). “Trabalhamos com complementação entre as equipes. Por exemplo, neste trabalho o Aché fez o design e síntese de moléculas e participamos da discussão dos ensaios biológicos envolvidos. O CQMED desenvolveu e implementou os ensaios biológicos e celulares”, explica Edson Bernes, diretor de Pesquisa e Desenvolvimento do Aché Laboratórios. Este é o terceiro artigo científico publicado pelo time CQMED e Aché.

As publicações científicas com coautoria da empresa fazem parte do modelo de ciência aberta. Neste modelo, os avanços científicos, como artigos, base de dados são públicos para que a informação circule mais rapidamente e valide os avanços na área de pesquisa. “Isso também ajuda a fomentar o ecossistema de inovação no país e acelerar novas descobertas”, complementa Azevedo.

Para o CQMED, esta parceria representa uma oportunidade única de contribuição para o desenvolvimento do complexo industrial da saúde do País, garantindo que o potencial translacional da pesquisa seja explorado em sua plenitude.

Carlos Eduardo Pereira, diretor de operações da EMBRAPII, ressalta que atualmente, as soluções tecnológicas nesse setor correspondem a 13% do portfólio das Unidades EMBRAPII. “São mais de duzentos projetos nas mais diversas áreas correlatas do conhecimento: nanotecnologia, biotecnologia, softwares, devices, automação de processos produtivos, manufatura aditiva, entre outros. Na indústria da saúde, a inovação é uma variável sempre imperativa e urgente. Este projeto em especial, é uma inovação no setor da saúde e uma nova possibilidade de tratamentos oncológicos no país” finaliza Pereira.

Redação

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