Como a deficiência nutricional afeta a gestação

Segundo dados do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede PENSSAN em junho, a quantidade de pessoas passando fome praticamente dobrou em menos de dois anos.

São 33,1 milhões de brasileiros em situação de insegurança alimentar grave, o equivalente a 15,5% da população. Em comparação ao primeiro levantamento realizado em 2020, são 14 milhões a mais de pessoas passando fome.

Segundo dados do SISVAN (Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional) no ano de 2020, quando a insegurança alimentar atingiu números elevados, 14,2% das gestantes apresentaram baixo peso para a idade gestacional, 6,1% das crianças menores de 5 anos estavam com magreza acentuada ou magreza e 13,0% delas com baixa estatura para a idade.

Efeitos da deficiência nutricional na gravidez

Na gestação, há uma série de modificações gravídicas, quando o organismo da mulher passa pelo processo anatomofisiológico, oferecendo condições de desenvolver o feto e seguir com a gestação sem intercorrências. No entanto, o aporte adequado de nutrientes se torna protagonista para que seja possível o equilíbrio mãe/placenta/feto.

“Com a desnutrição e/ou anemia materna, há restrição de crescimento intrauterino (RCIU), uma condição cujo feto não alcança seu potencial biológico de crescimento”, afirma Carlos Moraes, ginecologista e obstetra pela Santa Casa/SP, Membro da FEBRASGO, especialista em Perinatologia pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Albert Einstein e médico nos hospitais Albert Einstein, São Luiz e Pro Matre.

Segundo ele, a RCIU, que acomete cerca de 5 a 10% de todas as gestações, é um dos principais fatores de aumento de morbimortalidade no período perinatal. “Com a deficiência nutricional da mãe, ocorre a insuficiência placentária. Isso significa que aquela placenta progressivamente reduz o aporte de oxigênio e nutrição para o feto, resultando no nascimento de um bebê com peso inferior a 90% dos outros bebês na mesma idade gestacional, ou até mesmo em óbito”, explica Carlos Moraes.

De acordo com o especialista, uma das vitaminas mais importantes durante a gestação é o ácido fólico (vitamina B9), responsável pela formação do tubo neural do bebê, dando origem ao cérebro e a medula espinhal do feto nos primeiros meses de gestação, período mais crítico para malformações decorrentes de baixa ingestão de vitaminas e minerais. Tão importante quanto, são as vitaminas do complexo B, com papel essencial na formação do bebê, incluindo o desenvolvimento do seu sistema nervoso e até mesmo do coração.

O cálcio é fundamental na formação do esqueleto do bebê, dos ossos e futuros dentes. Também é essencial na contração muscular do feto e na transmissão de impulsos nervosos. “Quando o bebê não recebe a quantidade necessária de cálcio para se desenvolver, ele absorve o mineral dos ossos e dentes da mãe para suprir suas carências. Em decorrência da falta deste nutriente, a gestante sente cãibras e problemas dentários”.

Outra que não pode faltar na gravidez é a vitamina D. Sua deficiência prejudica a proteção da placenta e da bolsa amniótica, aumentando as chances de insuficiência placentária e de ruptura prematura da bolsa no último trimestre de gestação. Além disso, pode causar raquitismo fetal, uma condição caracterizada por fragilidade óssea e prejuízos do desenvolvimento físico do bebê.

Já o consumo de magnésio na gravidez diminui os riscos do surgimento da pré-eclâmpsia, transtorno no qual há aumento da pressão arterial, inchaço do rosto e das mãos e saída de proteína na urina. Essa condição pode levar ao parto prematuro, sofrimento fetal ou atraso do crescimento intrauterino.

A deficiência de iodo está associada a diversas complicações para o bebê, como anomalias congênitas, aumento do risco de mortalidade infantil, cretinismo neurológico (condição congênita de baixa secreção do hormônio tireoidiano que prejudica o desenvolvimento cognitivo), deficiência mental, estrabismo e nanismo (estatura muito baixa).

O ferro, presente na hemoglobina, molécula principal dos glóbulos vermelhos, é responsável pelo aumento do volume sanguíneo durante a gravidez e a prevenção de anemia. “Ele é importante também para o desenvolvimento do sistema nervoso do bebê. Sua deficiência pode causar baixo peso, prematuridade e alterações na formação e organização nervosa”, diz o ginecologista.

Já o zinco é responsável pelo desenvolvimento cognitivo e neurológico do bebê. Se houver baixas quantidade deste mineral no organismo, pode ocorrer atraso na formação e no crescimento dos neurônios da criança. Na grávida, a falta do zinco prejudica o tempo de cicatrização de possíveis lesões.

“Vale lembrar que em caso de diagnóstico de desnutrição e/ou ganho de peso insuficiente em crianças em aleitamento materno, é fundamental que a amamentação seja continuada e de forma exclusiva até os 6 meses de idade ou, se possível, até os 2 anos de idade ou mais”, reforça Carlos Moraes.

Para ajudar, é possível contribuir com entidades que arrecadam recursos para pessoas que estão em situação de fome ou insegurança alimentar:

Banco de Leite Humano

Engloba as ações de coleta, processamento e distribuição de leite humano para bebês prematuros ou de baixo peso que não podem ser alimentados pelas próprias mães, além de atendimento para apoio e orientação para o aleitamento materno.

Ação da Cidadania

A organização não governamental que luta contra a fome no país e foi criada em 1993 pelo ativista Betinho lançou, em março, a segunda edição da campanha Brasil sem Fome, cujo objetivo é arrecadar 20 mil toneladas de alimentos, a ser distribuídas entre 8 milhões de pessoas.

Amigos do Bem

A instituição, criada em 1993, atende regularmente mais de 150 mil pessoas no sertão de Alagoas, de Pernambuco e do Ceará. Foi eleita em 2021 a melhor ONG do estado de São Paulo.

Banco de Alimentos

A ONG, fundada em 1998, recolhe alimentos que já perderam valor de prateleira no comércio e na indústria, mas ainda estão perfeitos para consumo, e os distribui a locais onde são mais necessários.

Redação

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