Mais de 100 mil brasileiros estão na fila do SUS para cirurgia de catarata

No Dia Mundial da Visão, 11 de outubro, os brasileiros que dependem de consultas e procedimentos oftalmológicos da rede pública de saúde não têm motivos para comemorar. Em média, os cidadãos aguardam 314 dias por uma avaliação de catarata. Na prática, quase um ano inteiro para verificar se há indicação para cirurgia, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo. Até dezembro de 2017, a fila de espera do Sistema Único de Saúde (SUS) para correções da opacidade do cristalino contava 24 mil pessoas, somente em São Paulo; no Brasil são 113.185 cidadãos, de acordo com levantamento realizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Esse contingente é formado, em grande parte, por idosos da baixa renda.

A catarata é responsável por 51% dos casos de cegueira no mundo; sendo a população acima de 50 anos a de maior incidência da catarata senil – um processo natural de envelhecimento do cristalino e que pode ser completamente reversível com a cirurgia. Estimativas apontam que 5% da população acima de 60 de anos deverá ter catarata no decorrer de um ano. O Brasil já possui 30 milhões de idosos, que representa uma demanda potencial de 1,5 milhão de cirurgias de catarata por ano. Entretanto, o volume de cirurgias realizadas é inferior a isso. Em cinco anos, de 2012 a 2017, os procedimentos realizados pelo SUS cresceram 13%, contra um aumento de 19% do número de maduros. Para complicar o cenário, o número de beneficiários de plano de saúde caiu 1,4%.

De acordo com a Agência Nacional de Saúde (ANS), em 2017 havia 47,4 milhões de beneficiários de plano de saúde, representando 23% da população. Nesse ano, foram realizadas 241 mil cirurgias de catarata pelos planos de saúde, contra 428 mil cirurgias pelo SUS (DataSUS), totalizando 669 mil cirurgias.

“Se considerarmos que os planos de saúde deveriam representar 23% das cirurgias, teríamos um total 1.051 mil cirurgias para serem feitas. Ou seja, 382 mil cirurgias deixam de ser feitas pelo poder público. Esse problema é real. Mas, também vemos aqui muitos pacientes que protelam buscar ajuda médica. Como a perda de visão pela catarata é gradual e o cérebro vai se adaptando, muita gente empurra o problema com a barriga. E vão buscar ajuda só depois de um acidente doméstico ou problema mais grave. Vemos, ainda, muita gente que não vai em um oftalmologista há décadas. Só quando a pessoa faz a cirurgia é que ela percebe quão ruim estava sua visão e como sua vida estava limitada”, esclarece Guilherme de Almeida Prado, fundador da Central da Catarata – negócio de impacto social que viabiliza consultas oftalmológicas e cirurgias com preço acessível.

O atendimento público de um paciente por um especialista pode demorar meses – após a consulta, o paciente enfrenta a fila dos exames; depois, retorna ao oftalmologista e só então entra na fila da cirurgia. Nesse processo, muitos acabam desistindo. A demora para realizar a cirurgia torna o procedimento ainda mais delicado, pois o cristalino endurece e tira a autonomia da pessoa que pouco a pouco perde a visão e alegria de viver.

Almeida Prado alerta para um outro problema: “a visão é algo que só a própria pessoa detecta; os familiares são um fator importante para ajudar a pessoa a buscar auxílio, mas não conseguem perceber o quão ruim está a visão do indivíduo. Se o pai tem um problema no pulmão o filho percebe ele ofegante, se tem um problema no quadril ele vê o pai caminhar com mais dificuldade, mas o filho não consegue perceber o quão mal o pai está enxergando”.

Negócio de impacto social como alternativa

A dificuldade no acesso à cirurgia para correção da opacidade do cristalino para a população de baixa renda motivou a criação da Central da Catarata. O empreendimento, criado em 2017, já realizou mais de 500 cirurgias somente no primeiro ano com o objetivo social de aumentar o acesso das pessoas a cirurgia, oferecendo condições exclusivas de preço, formas de pagamento facilitadas e processos transparentes.

A central de agendamento tem hoje quatro centros cirúrgicos de renome afiliados em São Paulo e cabe aos pacientes decidir o local de atendimento: Hosp – Hospital de Olhos de São Paulo, IPEPO – Instituto da Visão; Clínica Oftalmológica Guarnieri e o Instituto Paulistano de Olhos (IPO).

O processo de afiliação das clínicas é baseado em três pilares: médicos formados nas melhores universidades, clínicas com mais de 20 anos de experiência e todas especializadas em catarata. Além disso, as clínicas devem compartilhar do mesmo objetivo social da Central da Catarata e oferecer parte dos seus horários com condições mais acessíveis para a população. A acessibilidade não é relacionada apenas ao preço, o processo simples e acolhedor de agendamento também é um diferencial no atendimento aos pacientes. A equipe da empresa orienta, tira dúvidas, envia informações e vídeos e oferece o pacote de cirurgia das clínicas afiliadas para quem solicita. Não há troca de dinheiro e nenhum vínculo com o paciente – que não seja o de suporte emocional para a tomada desta importante decisão.

“Começamos pela cidade de São Paulo para validar o modelo e poder ter melhor controle da operação. Apesar disso, já recebemos vários pacientes de outros estados. Já temos mapeadas algumas cidades que teriam potencial para expansão. A nossa expectativa é dobrar o número de cirurgias chegando a 1.000 até o final de 2018”, ressalta Guilherme de Almeida Prado.

Voltar a enxergar

Monalisa Pisani decidiu não esperar o tempo estimado pela rede pública para que a mãe, Gioconda Oddette Pisani, de 83 anos, realizasse a cirurgia de catarata. “Quando falaram para gente o tempo de espera tivemos que recorrer a outras soluções. A primeira delas foi pesquisar clínicas particulares, mas o valor ficava entre 10 a 15 mil reais para a cirurgia em cada olho. Foi quando encontramos na internet a Central da Catarata e vimos a diferença absurda no valor. A primeira coisa que minha mãe falou, ao sair da clínica, foi que agora podia ver as estrelas no céu”, relembra. História similar é contada pela corretora de imóveis, Ana Luzia de Marco, que há um ano operou o olho direito e voltou a enxergar. “Eu não conseguia ler um livro, ver a televisão direito e nem mesmo pegar ônibus era possível. Agora deu tão certo a cirurgia que nem mesmo os óculos para correção do astigmatismo e hipermetropia eu preciso. Tenho qualidade de vida”, afirma.

Minas Gerais detém três dos 10 trechos mais perigosos de estradas federais brasileiras, segundo ranking da Confederação Nacional dos Transportes (CNT). Uma delas é a BR-381, conhecida como rodovia da morte. E é por ela que o autônomo Roberto de Paula Braga, de 62 anos, segue o trajeto em direção ao trabalho. “No dia a dia viajo muito para o Sul de Minas, tinha dificuldade na estrada para ler as placas e os óculos não estavam mais ajudando. Fui diagnosticado com catarata, mas pelo SUS demoraria mais de um ano para fazer e eu trabalho dirigindo, não dava mais para esperar. Fui em uma clínica particular e o médico não queria me operar, disse que eu podia aguardar um pouco mais. Pedi uma segunda opinião e descobri que estava bem progressivo. Fiz a cirurgia pela Central de Catarata que me permitiu escolher a clínica; em 15 dias eu já tinha feito a cirurgia nos dois olhos e estava completamente recuperado. Hoje viajo de madrugada e o escuro não me atrapalha em nada, na verdade não uso nem mais óculos”, relata.

Redação

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