Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), organização social do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), desenvolveram uma plataforma de transistor para a detecção de dopamina, um neurotransmissor relacionado a doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson.
A tecnologia de transistores orgânicos para detecção de substâncias em meio líquido vem sendo constantemente explorada pelos cientistas. Transistores orgânicos são dispositivos eletrônicos constituídos por três contatos elétricos, sendo dois deles cobertos por um filme orgânico.
Nessa plataforma a equipe utilizou um filme orgânico nanométrico, posicionado sobre uma parte do transistor, para indicar a presença de dopamina em meio líquido.
De maneira inovadora, o funcionamento dos transistores fabricados no CNPEM é baseado tanto no acúmulo de cargas na superfície do filme orgânico, diretamente em contato com o meio líquido, quanto na penetração de íons através dos poucos nanômetros de espessura do filme orgânico. Esse processo, conhecido como dopagem eletroquímica, se consolidou ao longo da última década como uma das principais rotas de aprimoramento de propriedades eletrônicas de dispositivos orgânicos que operam em meio líquido.
A plataforma de transistor eletroquímico orgânico pode abrir caminho para o desenvolvimento de futuros testes rápidos, capazes de contribuir com diagnósticos e/ou prognósticos de diversas doenças, através da extração de informações como níveis/concentrações de entidades biológicas em uma determinada amostra de sangue, suor ou urina, apontando funções normais ou patológicas em um organismo. Assim, o potencial dos dispositivos miniaturizados pode impactar diversos campos estratégicos, desde diagnósticos clínicos até o monitoramento de alimentos e/ou produtos e substâncias no meio ambiente.
Pioneirismo
Além da busca pela aplicação dos dispositivos em sensoriamento, o desenvolvimento destes transistores passou por pesquisas fundamentais focadas na miniaturização, no melhor desempenho e no barateamento dos produtos, com fabricação em larga escala. Para isto, os dispositivos foram processados integralmente nas instalações de Sala Limpa do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano).
A infraestrutura presente no LNNano permitiu que os pesquisadores fossem pioneiros na proposição de transistores eletroquímicos orgânicos baseados em nanomembranas funcionais. As nanomembranas são filmes finos metálicos que se enrolam formando tubos com diâmetros três vezes menores do que o de um fio de cabelo e com comprimentos até 15 vezes menores do que o de um pernilongo.
Amplitude de aplicações
Toda essa tecnologia foi empregada para se colocar transistores dentro desses ambientes extremamente pequenos. Dessa forma, além de obter dispositivos com respostas rápidas e intensificadas, as dimensões miniaturizadas permitiram analisar pequenas quantidades de líquidos.
De acordo com o pesquisador Carlos Cesar Bof Bufon, que coordenou o trabalho, a arquitetura do transistor estabeleceu um novo paradigma para a sensibilidade de dispositivos com esse tipo de tecnologia, acima até dos parâmetros considerados, hoje, como o ‘estado da arte’.
“O nosso desafio é sempre reduzir ao máximo o limite de detecção. Pretendemos testar essa altíssima sensibilidade no reconhecimento de outros marcadores biológicos, em dispositivos adaptados para finalidades específicas. Capazes, por exemplo, de contribuir para o diagnóstico de outras doenças graves, como cânceres, ainda em estágios iniciais.”
A concepção, caracterização e aplicação destes transistores eletroquímicos orgânicos, fabricados com o uso de nanomembranas enroladas, estão apresentadas no artigo “Ultrahigh-gain organic electrochemical transistor chemosensors based on self-curled nanomembranes“, que foi recentemente aceito para publicação em uma das mais prestigiadas revistas científicas do mundo, a “Advanced Materials” (disponível em: doi.org/10.1002/adma.202101518).
O trabalho foi conduzido no LNNano/CNPEM pelos pesquisadores Letícia Ferro e Dr. Leandro Mercês, sob a supervisão do Prof. Dr. Carlos César Bof Bufon. Os excelentes resultados são parte da pesquisa de doutorado de Letícia Ferro, que é aluna do curso de Doutorado em Química no Instituto de Química (IQ) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Esta pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).