“Não há desafio que possamos vencer sem as mulheres. Não vamos conseguir enfrentar as mudanças climáticas e o aquecimento global, combater a pobreza e acabar com o preconceito e a violência se não valorizarmos os nossos recursos mais importantes: as mulheres.” As palavras são do Prêmio Nobel da Paz 2018, Denis Mukwege. Foi assim que o médico congolês iniciou a sua fala – e também suas provocações – a uma plateia de convidados nesta terça-feira (20), no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre (RS).
Conhecido como Dr. Milagre, o ginecologista contou histórias do período que tratou mais de 30 mil meninas, mulheres e idosas vítimas de estupro e violência sexual na República Democrática do Congo. Mukwege é considerado o maior especialista do mundo em reparação interna de genitais femininos, coordenando programas de HIV/Aids em seu país. Com amor e sensibilidade, transformou seu ofício em arma contra os horrores da guerra. Denunciou pessoas que se beneficiavam do terror e criou um movimento feminista de homens comprometidos em mudar essa realidade.
Mukwege sofreu um atentado após suas denúncias resultarem em um relatório da ONU que recomendava o julgamento de políticos e poderosos do Congo. Mesmo podendo viver em segurança na Europa, voltou ao seu país através da mobilização de mulheres que se uniram para pagar sua passagem de volta. Hoje, vive cercado de seguranças dentro do complexo hospitalar onde trabalha. Questionado sobre como convive com a constante ameaça, atribuiu a força às mulheres que o cercam. “Eu não sou corajoso. Corajosas são elas”, reconheceu.
Fonte de esperança
A palestra fez parte da programação do Fronteiras do Pensamento, patrocinado pelo Hospital Moinhos de Vento. Na recepção ao convidado, o Superintendente Executivo Mohamed Parrini agradeceu a visita do Nobel da Paz, algo inédito na história da instituição. “Temos aqui a figura de alguém totalmente conectado com nossas crenças e valores mais caros. Os profissionais da saúde sempre serão fonte de esperança para vencer o medo. São apoio e suporte nas horas difíceis e, às vezes, a única orientação em meio ao desespero. Virtudes elevadas à máxima potência pelo Dr. Mukwege”, pontuou.
Para o Superintendente Médico Luiz Antonio Nasi, enquanto a ciência e a tecnologia avançam à velocidade da luz, não há evolução sem a sensibilidade presente no trabalho do médico. “O Dr. Mukwege serve para nos lembrar que ainda estaremos atrasados enquanto fecharmos os olhos para aquela violência que não nos atinge diretamente” destacou.
Ao finalizar sua palestra, o Prêmio Nobel da Paz convocou as pessoas a se engajarem na luta em defesa das mulheres. Em especial, pediu aos homens que apoiem a causa em organizações internacionais, como a ONU, lembrando que é preciso mobilização e pressão mundial. “Mexer nesse tema é denunciar e expor quem está no poder em países como o Congo. É colocar no banco dos réus autoridades, políticos, policiais.” Mukwege destacou que o que acontece nessas regiões de conflito é a “ponta do iceberg”, e que a violência contra a mulher é um problema global.