Três dos principais tipos de câncer em incidência – mama, próstata e colorretal – têm em comum questões hereditárias importantes. No câncer de mama, por exemplo, 10% dos casos possuem causas hereditárias. Dentro de um universo de 69 mil diagnósticos anuais no país, significa que quase 7 mil mulheres com câncer de mama têm uma causa genética de base. No Centro de Oncologia Campinas, o geneticista Pablo Domingos Rodrigues De Nicola responde por uma especialidade fundamental na prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer, a oncogenética.
Assim como o câncer de mama, cerca de 10% dos tumores de próstata têm componente genético por trás – dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca) apontam para 65.840 novos casos a cada ano no Brasil. No câncer colorretal, cuja estimativa do Inca é de 41 mil novos casos anuais, de 3% a 5% estão sujeitos fatores genéticos.
Entre suas muitas atribuições, a oncogenética permite identificar pessoas com risco aumentado de desenvolver tumores cancerígenos, a partir da história pessoal, de estudos de históricos familiares e de exames genéticos. “Sabendo qual é a alteração genética, é possível estabelecer os riscos dessa pessoa desenvolver câncer. Estabelecendo os riscos e os órgãos vulneráveis, podemos montar um protocolo de vigilância, de rastreamento do câncer, que permitirá detectar o tumor, caso ocorra, ainda na fase inicial”, detalha Pablo De Nicola.
Outro aspecto importante, aponta, é a existência de tratamentos, com remédios específicos, voltados aos indivíduos que apresentam alteração genética. “Há uma oportunidade de tratamentos mais eficazes, com drogas de última geração, específicas para indivíduos com alterações genéticas.” O protocolo de rastreamento tem algumas diferenças no caso dos que apresentam risco aumentado para a doença. “Enquanto uma pessoa da população geral faz uma colonoscopia a partir dos 50 anos, e repete o exame a cada cinco anos, uma pessoa com alteração genética inicia os exames aos 35 anos, e com intervalo de dois anos”, exemplifica.
A detecção precoce de tumores cancerígenos afeta diretamente o prognóstico. Quanto mais cedo a doença for identificada e tratada, melhores serão as chances de cura e maior poderá ser a sobrevida do paciente. “Hoje sabemos o quanto é importante ter um serviço de genética dentro de um Centro de Referência em Oncologia”, observa.
Histórico
O câncer é definido como uma doença genética, resultado de mutações no DNA das células. A existência de um histórico familiar pode apontar para a predisposição de desenvolver neoplasias, porém, o perfil de risco é traçado a partir de um complexo estudo familiar e de exames laboratoriais. Os testes genéticos, explica Pablo De Nicola, são indicados em situações específicas. “As pessoas que normalmente são encaminhadas para o teste genético são aquelas que têm câncer em idade jovem e as que, ao fazermos o histórico familiar para a doença, que é a árvore genealógica, percebemos a existência de muitas outras pessoas com câncer na família”, confirma.
Para traçar a árvore genealógica, conta, são analisados parentes até de terceiro grau. Tios, primos, sobrinhos, irmãos, netos, avós e pais ajudam a montar o histórico de casos de câncer de uma família. Um número significativo de ocorrências estabelece os níveis de risco para a doença.
A realização de testes genéticos, aconselha o médico, é positiva não só por trazer benefícios à pessoa alvo da avaliação, mas também por ajudar a mitigar os riscos de outros familiares e das próximas gerações.
“Existe, por exemplo, a possibilidade de diagnóstico pré-implantacional. Na fertilização in vitro, o teste genético mostra quais são os embriões que não apresentam alterações genéticas e que posteriormente podem ser implantados. É também uma forma de cessar o ciclo de doença oncológica na família”, orienta. “Outro fator importante é que, quando se faz o teste genético, executamos depois o rastreamento dos familiares para saber se possuem alteração genética. Dessa forma, podemos começar a fazer o rastreamento preventivo de outras pessoas.”
O teste genético, salienta, não é exclusivo dos pacientes oncológicos, embora eles sejam a maioria dos que procuram pelo atendimento. “O geneticista é como se fosse um clínico com quem se faz um check-up. A grande maioria, infelizmente, chega ao geneticista já com o câncer, mas quem tem histórico familiar pode procurar o geneticista. Aqueles que apresentarem alterações genéticas e risco aumentado poderão começar, assim, a fazer as prevenções primária e secundária.” Os exames genéticos são feitos a partir de amostras de sangue e demoram em média 30 dias para ficarem prontos.