Mutação nos genes BRCA1 e BRCA2 aumentam as chances de se desenvolver o câncer de mama e de ovário. Uma pesquisa recente demonstra que outros genes também estão associados ao câncer de mama e merecem ainda mais atenção.
Realizada pela oncogeneticista do A.C.Camargo Cancer Center, Dra. Daniele Paixão Pereira, a pesquisa avaliou a contribuição da realização de um painel com 94 genes relacionados a câncer hereditário na detecção de mutações germinativas em outros genes – como TP53, STK11, CDH1, PTEN, ATM, CHEK2 e PALB2.
No estudo foram incluídas 321 mulheres com diagnóstico de câncer de mama que foram atendidas no hospital e que apresentavam critérios clínicos para tumores hereditários, sendo que 81 pacientes tiveram resultados positivos para, pelo menos, 84 variantes patogênicas. Destas, 32 variantes em BRCA1 e BRCA2 e 52 variantes em outros genes do painel. “O resultado serve de alerta para investigarmos outros genes em pacientes com critérios clínicos para câncer de mama hereditário, pois pode impactar diretamente no acompanhamento desses casos, uma vez que alguns desses genes têm estimativas de risco para o câncer estabelecidas e estratégias de rastreamento e prevenção definidas”, destaca. O estudo está em fase de publicação.
Em outro levantamento realizado no A.C.Camargo Cancer Center, publicado em 2018, foram analisados 130 casos de pacientes com tumores de mama do subtipo triplo negativo, um subtipo de câncer de mama considerado um dos mais agressivos. Conduzido pela Chefe do Laboratório de Genômica e Biologia Molecular do Centro Internacional de Pesquisa (CIPE) e responsável pelo Núcleo de Diagnóstico Genômico do A.C.Camargo Cancer, Dra. Dirce Carraro, o resultado demonstrou que uma alta porcentagem dessas pacientes, principalmente as que tiveram o câncer em idade mais jovem, eram portadoras de variantes germinativas patogênicas no gene BRCA1. Em outras palavras, alta porcentagem desses tumores eram hereditários.
“Estamos realizando vários trabalhos em câncer de mama triplo negativo no A.C. Camargo e nossos resultados anteriores têm se confirmado. Hoje, que os testes genéticos estão mais amplos incluindo outros genes de predisposição ao câncer”, pontua a autora.
Segundo a pesquisadora, além de BRCA1 e BRCA2, 30% das pacientes com diagnóstico de câncer de mama triplo negativo são portadoras de variantes genéticas patogênicas – em 80% dos casos, o gene BRCA1 é o principal responsável. “Os dados clamam para a necessidade dessas mulheres realizarem o teste genético, que podem prevenir o câncer de mama e salvar vidas”, reforça.
Vale relembrar o caso de Angelina Jolie
A atriz Angelina Jolie realizou os testes antes de decidir retirar as mamas e os ovários, que tinham grandes chances de desenvolver câncer. No caso da atriz, a chance até os 50 anos era de aproximadamente 87%. A cirurgia preventiva de retirada e reconstituição das mamas reduziu de 90% a 95% o risco de a doença aparecer.
Até 10% dos casos de câncer de mama são hereditários e cada vez mais famílias estão recorrendo à Oncogenética para investigar possíveis variantes genéticas herdadas. Em 2021 a procura por consultas com o Dr. Claudio Casali, head de Oncogenética do A.C.Camargo Cancer Center, foi 40% maior do que em 2020. Em 2019 e 2020 foram contabilizados 6.937 atendimentos na área. Até agosto deste ano, o número já chegou a 2.610. Apesar da indicação médica – em 80% dos casos de encaminhamento – as pacientes ainda relutam.
“As pessoas veem o câncer se repetir em parentes várias vezes e não sabem que podem rastrear para saber se podem desenvolver a doença também. Há alguns anos a nossa rotina era atender as pessoas já diagnosticadas para descobrir se eram hereditários. Hoje, muitas chegam sem, mas com histórico familiar e desejam saber seus riscos genéticos. O medo é o que mais traz às pessoas às consultas. Quando descobrimos que se trata de um câncer hereditário toda a família é chamada para conversar”, explica Casali.
Em geral, os indivíduos que apresentam mutações genéticas podem ter até 70% mais chances de desenvolverem a doença, porém, existem várias formas de prevenção quando se descobre uma predisposição. “A genética consegue verificar se os ‘interruptores’ genéticos estão desligados ou ligados, além de reeducar as pessoas para mudar o estilo de vida e a dieta para, assim, reduzir ainda mais o perigo. Criamos como se fosse um ‘plano de voo’ para cada paciente. É uma prevenção de precisão e deve ser multidisciplinar”, ressalta.
Nos planos de prevenção, existem desde indicações de ressonâncias magnéticas de mama sem radiação, por exemplo, até dieta adequada, exercícios físicos e medicamentos. “Cirurgia para retirada das mamas é uma opção, mas muitas pacientes não querem fazer. Por outro lado, tem algumas que optam pela cirurgia, porque viram muitos familiares morrerem. O acompanhamento depende de cada paciente”, finaliza.