Por Carol Gonçalves
Uma palavra que tem aparecido muito nos noticiários e ganhado destaque no Brasil é corrupção: ato de corromper alguém ou algo, com a finalidade de obter vantagens. Também pode significar o desvirtuamento de hábitos e costumes, tornando-os imorais ou antiéticos.
Em nenhum tipo de negócio ou relacionamento a corrupção deveria ser aceita, principalmente na área de saúde. Segundo Sonia Maria Bolsoni, diretoria executiva da Conceitos Certificadora, focada em sistemas de gestão, alguns exemplos de corrupção que podem ser observados nas instituições de saúde são: apropriação indébita e/ou desvios de mercadorias; tratamento preferencial junto a determinados fornecedores em troca de benefícios; superfaturamento na compra de produtos médicos, em especial de OPME; e requisições de procedimentos hospitalares sem necessidade.
“Ser compliance significa cumprir, executar e agir de acordo com as legislações, as normas e os regulamentos vigentes. A área da saúde lida com o bem maior, que é a vida humana e, por isso, é destino de muitos recursos financeiros públicos e privados, o que faz com que seja alvo frequente de atos ilícitos”, observa.
Para Sonia, o interesse, por parte dos empresários, em constituir um setor de compliance vem aumentando desde 2014, após o início da vigência da Lei Anticorrupção (12.846/2013). Ela explica que, independentemente do segmento de atuação da empresa, as ações se assemelham por seguirem os mesmos objetivos: prevenção, detecção e correção, além de manutenção da ética e da transparência.
Entre as principais ações adotadas estão implementar políticas escritas de conformidade, procedimentos e padrões de conduta; conduzir treinamentos eficazes; desenvolver linhas de comunicação eficazes e permitir mecanismos de denúncia anônima; realizar monitoramento interno e auditorias periódicas; e reforçar os padrões de conduta para os funcionários por meio de diretrizes disciplinares bem divulgadas.
“Recomendamos a todos o investimento em compliance, pois qualquer empresa com processos de prevenção de atos ilícitos certamente terá um ambiente de trabalho e de negócios saudável, gerando redução de custos, desperdícios, ações judiciais e de absenteísmo”, destaca Sonia.
Na prática
No Brasil, as primeiras empresas de saúde a receberem a Certificação DSC 10.000, de combate à corrupção, foram São Francisco Saúde, São Francisco Odonto e São Francisco Resgate, do Grupo São Francisco, um dos maiores do Brasil, com mais de 70 anos de história.
A DSC 10.000 – Diretrizes para o Sistema de Compliance valida a existência de um mecanismo de prevenção e combate à corrupção, bem como a detecção de atos ilícitos e/ou contrários aos princípios da ética e integridade nos negócios.
Para estar no padrão que a certificação exige e passar os princípios aos seus mais de 6 mil colaboradores, o Grupo São Francisco desenvolveu um sistema apoiado pela alta direção, que envolve a implantação de processos internos, incluindo a disseminação do seu Código de Conduta para os colaboradores, fornecedores e prestadores de serviço, visando orientar como proteger a empresa contra desvios de conduta, práticas ilícitas e atos de corrupção.
Foram elaborados e devidamente treinados os procedimentos de compliance referentes a lavagem de dinheiro, atividades de contabilidade, pagamentos de alto risco, fusão e aquisição, suprimentos, relacionamento com terceiros, relacionamento com agentes públicos e/ou administração pública, política de brindes, presentes, patrocínio, doações e hospitalidades.
“Desta forma, os principais temas e áreas foram interligados a fim de reduzir a probabilidade de o Grupo São Francisco sofrer atos de corrupção. Foi contratada uma empresa especializada em captação de denúncia, que trabalha 24 horas”, expõe Patrícia Gomes, compliance officer do Grupo São Francisco.
Ela explica que ao presenciar um possível desvio de conduta, qualquer pessoa pode abrir uma denúncia anônima, que não pode ser acessada por ninguém do grupo, além do compliance officer. “É importante ressaltar que toda denúncia é devidamente investigada de maneira independente e isenta.”
Para monitoramento do sistema de compliance, auditorias frequentes acontecem periodicamente, visando assegurar a eficácia do programa. As ações foram planejadas e elaboradas em consonância com os objetivos estabelecidos pela alta direção. “A partir disso, reuniões com as áreas críticas, para elaboração dos procedimentos de compliance, aconteceram concomitantemente com a realização de treinamentos que visavam à capacitação de todos os colaboradores do Grupo São Francisco”, expõe Paulo Santini Gabriel, diretor de regulatório, riscos e compliance.
Os treinamentos dos colaboradores aconteceram, majoritariamente, de forma presencial e, em alguns casos, a distância, pelo fato de o grupo estar presente em vários estados do Brasil. Os conteúdos eram apresentados em turmas ou, algumas vezes, individualmente, através de slides ou animações em vídeo. Ao final, pesquisas de qualidade do treinamento, de satisfação do cliente interno e de eficácia do compliance foram enviadas aos colaboradores.
“A conscientização das pessoas com o tema é facilmente perceptível pela preocupação em realizar as tarefas de acordo com os procedimentos previamente estabelecidos. Além disso, o compliance está inserido nos negócios do Grupo São Francisco, atuando, por exemplo, diretamente nas fusões e aquisições realizadas”,
declara Patrícia.
O maior desafio encontrado para implantação dos novos processos foi a disseminação da cultura do compliance em toda a cadeia do Grupo São Francisco. “Os desafios foram vencidos com o apoio da alta direção: do presidente Lício Cintra, à frente das operadoras médica e odontológica, e Patrícia Musa, à frente da São Francisco Resgate. Não teríamos seguido em frente sem eles. Nossa eficiente estrutura de treinamentos e a frequente comunicação também foram fundamentais para que superássemos a barreira cultural”, conta Paulo.
O processo de certificação foi conduzido pela Conceitos, que realizou a pré-auditoria e a auditoria da norma DSC 10.000. No primeiro caso foi feito um diagnóstico para saber se o setor de compliance do Grupo São Francisco estava preparado para passar pela auditoria externa. No segundo foram avaliados todos os requisitos da norma, verificando a eficácia do sistema, pelo qual o grupo foi aprovado e teve recomendada a sua certificação.
Criada em outubro de 2016, a área de compliance da organização é composta por quatro pessoas, sendo dois analistas, o compliance officer e o diretor de compliance. Seu objetivo, desde o início, foi conquistar a certificação DSC 10.000. “Por mais de dois anos nos preparamos muito para estar 100% dentro das normas exigidas e transmitir essa mensagem aos nossos colaboradores, que foram fundamentais para essa realização. Esta certificação comprova que temos um setor de compliance efetivo e que a empresa segue o caminho da ética”, afirma Paulo.
Patrícia e Paulo incentivam outros hospitais a investirem no assunto. “É gratificante e nos enche de orgulho sermos uma das 35 empresas certificadas pela norma DSC 10.000 no Brasil e levar ao nosso público um assunto tão importante para a sociedade e o país.”
Curso a distância sobre Compliance
O Instituto Ética Saúde, em parceria com a Fehosp – Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes do Estado de São Paulo, está realizando um curso a distância sobre compliance, que é transmitido ao vivo pela plataforma do EducaSus. Os próximos módulos são: RH e Compliance (22/07) e Vendas e Compliance (23/07).
Qualquer profissional ligado à área de saúde pode participar, basta se inscrever na Fehosp através do telefone (11) 3242-8111 ou do e-mail tatiana.tecnico@fehosp.com.br. Mais informações em www.eticasaude.org.br.
Matéria originalmente publicada na Revista Hospitais Brasil edição 97, de maio/junho de 2019. Para vê-la no original, acesse: portalhospitaisbrasil.com.br/edicao-97-revista-hospitais-brasil