São diversos profissionais que fazem parte das equipes de cuidados paliativos, cada um com suas particularidades inerentes à atividade, mas sempre trabalhando em conjunto com outros especialistas e, claro, o paciente, seus familiares e entes queridos. Nesse aspecto, a Terapia Ocupacional tem um papel de extrema importância ao longo de todo o processo, uma vez que estes profissionais mantém um contato muito próximo e constante com o paciente, auxiliando em ocupações que antes faziam parte da rotina da pessoa adoecida.
Autonomia, independência e dignidade
Uma das pioneiras da Terapia Ocupacional (TO) no Brasil, e principalmente nos cuidados paliativos, Marysia De Carlo é Professora Associada, Livre-docente, atual coordenadora do Curso de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), além de membro do Comitê de Ligas Acadêmicas e da Diretoria da ANCP. Graduada em Terapia Ocupacional desde 1985, a profissional comenta como conheceu a atividade. “Conheci os cuidados paliativos no ano 2000, junto com amigos que compartilhavam comigo o desejo de criar um serviço voluntário para cuidar de pessoas com dor. Foi a partir da minha participação do VI Simpósio Brasileiro e Encontro Internacional sobre Dor (SIMBIDOR), no ano 2003, que tive a oportunidade de começar a estudar sobre o tema”, informou. Marysia diz que a autonomia e independência do paciente está entre os principais objetivos dos terapeutas ocupacionais. “O engajamento ocupacional contínuo é vital para a saúde e o bem-estar, mas a doença ameaçadora da vida afeta profundamente o desempenho ocupacional das pessoas em cuidados paliativos. Manter a capacidade de desejar e realizar suas ocupações na sua vida cotidiana, como comer ou banhar-se de forma independente, ou realizar uma atividade expressiva, por exemplo, é muitas vezes o objetivo principal para aqueles pacientes com uma doença fatal”, explicou.
Dentro do grande escopo das atividades da TO em cuidados paliativos, estão também as intervenções que variam conforme as necessidades do paciente em cada fase da doença. Thaís Camille Alves Gonçalo, terapeuta ocupacional desde 2007 pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), Pós-graduada em Saúde Pública na Atenção Básica e coordenadora do comitê de TO da ANCP, explica as atividades exercidas pelos profissionais e as pessoas adoecidas. “Em linhas gerais, as intervenções vão do treino de atividades básicas de vida diária, como a prescrição de recursos de tecnologia assistiva como órteses, adaptações de utensílios e de ambientes, indicação de recurso de comunicação alternativa; ações para reorganização de rotina favorecendo a estruturação dos cuidados, o engajamento no tratamento e nas participações cotidianas; apoio ao luto, uso de recursos não farmacológicos para gerenciamento e melhora de sintomas que interferem no desempenho ocupacional (técnicas de conservação de energia, relaxamentos, posicionamentos, resgate de atividades prazerosas, expressivas, entre outros)”, pontuou.
Comunicação e educação em prol da saúde
Durante todo o período de acompanhamento do paciente e suas necessidades ocupacionais, a boa comunicação é essencial para a manutenção e compreensão das etapas dos atendimentos. Marysia De Carlo lembra que, mesmo nesse ponto, ainda há desafios a serem superados. “A comunicação é um ponto central nas boas práticas em cuidados paliativos, mas ainda é um desafio na relação com os pacientes e seus familiares e dentro da equipe multiprofissional. Há quem pense que o tema da comunicação em cuidados paliativos é somente falar de comunicação de más notícias – o que é importante e necessário, claro, mas não é só isso. Acredito que é preciso oferecer a todos os membros da equipe a formação necessária sobre as melhores estratégias de comunicação que podem ser aplicadas na interação com pacientes e famílias. É preciso também oferecer suporte emocional ou supervisão externa à equipe, para que os problemas interpessoais possam ser resolvidos, antes que os conflitos e os problemas de comunicação criem novos focos de sofrimento para todos”, destacou.
Essa visão é compartilhada por Thaís Gonçalo, que ressalta que não cabe ao paciente e familiares, já em estágio de grande estresse, ter de tomar decisões que, muitas vezes, podem não ser as melhores. Isso tudo passa pela forma de comunicar-se com os entes envolvidos na situação. “Ainda identificamos profissionais com dificuldades significativas quanto à responsabilidade inerente, atribuindo um conceito distorcido de decisão compartilhada, quando põem nas mãos do paciente, ou da família, em alto grau de sofrimento, opções de assistência excludentes de algo importante. Por exemplo: diálise ou não diálise, sonda ou não sonda. São decisões que envolvem conhecimento técnico que não podem ser somente postos à decisão da pessoa em sofrimento, mas ponderadas conforme arcabouço técnico, prognóstico e aspectos bioéticos”, ressaltou.