A servidora pública Steffany Henrique Silva Ramos, de 31 anos, moradora de Ipatinga (MG), no Vale do Aço, tem vivido momentos de felicidade e angústia nos últimos anos. Em meados de 2019, ela deu à luz a seu filho, Andrey, e, cerca de três meses depois, descobriu um tumor raro no cérebro, chamado de glioma angiocêntrico. No dia 17 de fevereiro Steffany começou uma nova etapa de esperança. Ela foi a primeira pessoa a passar por uma neurocirurgia, no Vale do Aço, para retirada de tumor no cérebro em que a paciente fica acordada em meio ao processo. A cirurgia foi realizada no Hospital Márcio Cunha, em Ipatinga, administrado pela Fundação São Francisco Xavier e referência para 35 municípios do leste do Estado.
O glioma angiocêntrico é um tipo de tumor associado à epilepsia, com crescimento lento ou estável, e afeta, normalmente, crianças ou adultos jovens. “Eu estava trocando roupinhas do meu filho em uma loja e tive uma crise convulsiva. Fui para o hospital e me internaram imediatamente para fazer exames. No oitavo dia, já passei por uma primeira cirurgia convencional para retirada do tumor. Foi muito difícil. Estava muito feliz pela chegada do Andrey e depois veio a notícia da doença e tudo desmoronou. Tinha medo de não ver meu filho crescer”, desabafa.
O diagnóstico do glioma angiocêntrico só veio três meses após a internação. Em 2021, a equipe médica que acompanha o caso de Steffany descobriu um resíduo tumoral no lobo temporal esquerdo, em uma área responsável pela linguagem. Os lobos temporais são estruturas localizadas bem acima das orelhas, tendo como principal função processar os estímulos auditivos e gerenciar a memória.
James Wagner Morais, neurocirurgião do Hospital Márcio Cunha, explica que o tumor da paciente é muito raro e não responde adequadamente à radioterapia nem à quimioterapia. “Fazer uma nova cirurgia convencional poderia ser arriscado. Para preservar essa função tão vital, que é a linguagem, optamos por realizar a retirada do tumor através da neurocirurgia com a paciente acordada”, conta.
A cirurgia de Steffany durou cerca de 7 horas. Ela foi acompanhada por uma equipe multidisciplinar no Hospital Márcio Cunha, entre neurocirurgiões, neurofisiologista, anestesistas e enfermeiros. Depois de um dia em observação na UTI, a paciente passa bem. A previsão é de que ela receba alta no dia 22.
Cirurgia
A cirurgia com o paciente acordado é uma novidade na região do Vale do Aço Mineiro. O procedimento é indicado somente em casos em que o tumor está muito próximo à região que controla a motricidade ou a linguagem, por exemplo. “É um procedimento de alta complexidade, o qual traz melhores garantias de sucesso. Com o paciente acordado podemos fazer vários testes e chegar até o ponto mais preciso do tumor”, detalha James Wagner.
O procedimento é iniciado com uma anestesia geral. A cabeça do paciente é imobilizada e um tubo especial, chamado de máscara laríngea, permite que ele receba oxigênio. Depois que o tumor é acessado, o tubo é retirado para despertar o paciente.
O neurocirurgião explica que esse é um momento delicado da operação, já que o paciente precisa estar preparado para acordar no meio da cirurgia. “É nessa hora que a equipe atua com toda a sua expertise. Utilizamos monitorização especial, neuronavegador – uma espécie de GPS que guia o profissional – e microscópio cirúrgico. Depois que o tubo de oxigênio é retirado, o paciente está apto a responder aos questionamentos do médico e nos ajudar a executar os comandos, bem como a identificar milimetricamente a área responsável pela linguagem antes de retirar o tumor”, ressalta.
O médico explica, ainda, que é possível retirar o tumor com o paciente acordado porque o cérebro é indolor, visto que o cérebro é uma região que não possui terminações nervosas de percepção da dor e, por isso, o paciente não sente dor quando não está anestesiado e não gera desconforto. “Após a extração do tumor, o paciente recebe nova anestesia e volta a dormir para que o procedimento seja finalizado”, conclui.