Engenharia Clínica certificada garante segurança e redução de custos

Por Carol Gonçalves

O setor de Engenharia Clínica (EC) no Brasil está em crescimento, em parte devido à pandemia, que permitiu mostrar ao mercado que tecnologia em saúde é estratégico. O movimento feito pelos profissionais de Engenharia Clínica, em parceria com o Ministério da Economia, da Saúde, o Senai, montadoras, a ABEClin – Associação Brasileira de Engenharia Clínica e voluntários, garantiu o funcionamento dos ventiladores pulmonares e o retorno de mais de 2.500 equipamentos que estavam indisponíveis por falta de manutenção.

“Hoje, o mercado está em expansão, além de existir uma demanda reprimida. São mais de 300.000 serviços de saúde no Brasil, sendo que mais de 6.000 hospitais sentem a pressão da sociedade para que as unidades de saúde sejam cada vez mais seguras para o paciente. Esses hospitais são fiscalizados pelo sistema CONFEA/CREA, já que toda área de engenharia dentro de uma unidade de saúde tem que ter um responsável técnico”, salienta Alexandre Ferreli Souza, vice-presidente de Relações Institucionais da ABEClin.

Alexandre Ferreli, da ABEClin: “Toda a sociedade vai lucrar com a economia de recursos para a saúde e diminuição do risco de eventos adversos aos usuários de equipamentos médicos”

O entrevistado explica que a maioria das empresas de Engenharia Clínica nasce em uma estrutura amadora e/ou familiar, sem preocupação com processos, acervo técnico e melhoria contínua. Em outras palavras, não é adotado um sistema de qualidade, nem um formato profissional de gestão.

“Na falta desses dois itens, observam-se desvios de função – profissionais que não são engenheiros atuando como tal –, equipes subdimensionadas ou contratos por valores inexequíveis – não há como garantir qualidade, pois qualidade tem valor e o valor é um investimento que reflete no custo”, analisa.

Assim, o Selo de Qualificação ONA para empresas de Engenharia Clínica veio para elevar o nível de qualidade do setor, pois possibilita que as organizações melhorem seus processos e a qualificação profissional de engenheiros, tecnólogos e técnicos.

Com a qualificação, a engenharia clínica pode promover equipamentos médicos mais seguros aos usuários, pois a unidade de saúde com departamento ou empresa de EC certificada garante o uso adequado dos equipamentos, evitando inseguranças, perdas jurídicas e desperdícios financeiros, otimizando processos e compras. “Toda a sociedade vai lucrar com a economia de recursos para a saúde e diminuição do risco de eventos adversos aos usuários de equipamentos médicos”, resume o vice-presidente de Relações Institucionais da ABEClin.

Selo de Qualificação ONA

Gilvane Lolato, da ONA: “A versão mais atual do Manual do Selo de Qualificação ONA evoluiu em termos de quantidade de novos serviços e padrões, como também sua metodologia”

A versão mais atual do Manual do Selo de Qualificação ONA 2020-2024 incluiu três novos serviços terceirizados (higienização, Engenharia Clínica e nutrição), solicitados pelas organizações de saúde e sociedade. “Esta versão evoluiu em termos de quantidade de novos serviços e padrões, como também sua metodologia, eliminando a subjetividade por meio da aplicação do método de pontuação e com um modelo de avaliação estruturado em diretrizes organizacionais, gestão organizacional e gestão de apoio”, explica Gilvane Lolato, gerente de operacional da ONA – Organização Nacional de Acreditação.

Entre as versões de 2016 e 2020, foi observado aumento de 99% dos requisitos. O padrão “Gestão da operação”, que avalia a atividade-fim da organização, possui o maior número de requisitos e, consequentemente, obteve o maior aumento (97%), em comparação com os demais padrões. O padrão “Gestão Organizacional e Liderança” registrou crescimento de 73% do número de requisitos comparados à versão anterior.

Péricles da Cruz, da ONA: “A acreditação constitui-se em um mecanismo de alinhamento dos mais variados serviços, unidades e setores, por meio de padrões previamente estabelecidos”

“A acreditação constitui-se em um mecanismo de alinhamento dos mais variados serviços, unidades e setores, por meio de padrões previamente estabelecidos, que organizam e potencializam o desenvolvimento e a execução das atividades, com a consequente melhoria do desempenho gerencial e assistencial das organizações de saúde por meio da avaliação externa”, explica, por sua vez, Péricles Góes da Cruz, superintendente técnico da ONA.

O Selo de Qualificação ONA também oferece mais credibilidade às certificadas para que elas possam oferecer seus serviços a outras empresas, sendo mais comum que instituições hospitalares que possuam o Selo de Acreditação busquem parceiros que possuam o Selo de Qualificação. Podemos então dizer que, ao ser qualificada, uma empresa abre vantagem competitiva na sua área de atuação.

Conquistando o selo

Para conquistar o Selo ONA em Engenharia Clínica é preciso ter CNPJ constituído há um ano, licenças e alvará pertinentes à prestação de serviços, bem como responsável técnico, quando aplicável. O processo envolve quatro passos, como explica Vivian Giudice, diretora de Negócios e Mercado do Grupo IBES – Instituto Brasileiro para Excelência em Saúde, instituição acreditadora credenciada.

4 passos para conquistar o Selo

1) Elegibilidade: a empresa deve escolher uma acreditadora para a análise de elegibilidade. Quando confirmada, o termo de adesão é assinado.

2) Diagnóstico: agendamento da data da avaliação diagnóstica. Após cerca de 20 dias, a empresa recebe um relatório detalhado e claro com as melhorias a serem implementadas por prioridade. O IBES oferece o Canal Multidisciplinar para suporte técnico às dúvidas que possam surgir durante a implantação das melhorias.

3) Certificação: a avaliação é agendada pela empresa quando tiver implementado a maior parte do relatório. Após o processo, a equipe de avaliação compartilha o parecer com a recomendação da certificação que, posteriormente, é validada pelo Comitê de Certificação do IBES e pelo Conselho de Administração da ONA. O certificado é emitido com validade de dois anos.

4) Manutenção: a manutenção da certificação é realizada anualmente.

Vivian Giudice, do IBES: “A diretoria, o proprietário e cargos mais altos da empresa precisam comprar a ideia da certificação, o que só acontece quando os benefícios são reconhecidos”

Segundo Vivian, entre os maiores desafios desse processo está o comprometimento da alta liderança. “A diretoria, o proprietário e cargos mais altos da empresa precisam comprar a ideia da certificação, o que só acontece quando os benefícios, muitas vezes intangíveis, são reconhecidos, tais como: posicionamento no mercado como uma organização que prima pela qualidade dos serviços prestados, processos padronizados e gerenciados, possibilidade de expansão de prestação de serviços para organizações de serviços de saúde acreditadas, foco na sustentabilidade e gestão do negócio”, expõe.

Outro desafio é o engajamento do time nas práticas recomendadas. “A certificação traz padronização de procedimentos e previsibilidade de resultados, possibilitando à alta direção focar no que é estratégico e, ao mesmo tempo, dar autonomia à sua equipe, que acaba se sentindo parte importante e contribuidora dos resultados, bem como fiel às práticas estabelecidas”, acrescenta a diretora de Negócios e Mercado do Grupo IBES.

Com relação aos fatores de sucesso, cita a necessidade de uma estrutura de comitê ou responsável de qualidade para liderar o projeto. A organização pode indicar um profissional da equipe, com perfil ou experiência em processos de certificação, para se dedicar part-time aos assuntos de qualidade ou, ainda, criar um comitê com pessoas internas, ao qual cada uma se dedica algumas horas semanais. Caso prefira resultados mais rápidos, pode investir na contratação de consultorias, terceirização temporária da área de qualidade ou até contratar um profissional de qualidade dedicado. Essa decisão está geralmente relacionada com a complexidade, porte da organização e prazo que deseja certificar.

Com a qualificação, a engenharia clínica pode promover equipamentos médicos mais seguros aos usuários

Mais um fator de sucesso é a capacitação da liderança em processos de qualidade e certificação. O IBES consolidou um curso customizado para Certificação de Serviços de Engenharia Clínica em oito horas, que permeia todos os requisitos necessários para a organização ser certificada. “Seja uma capacitação on-line ou in-company, os líderes capacitados serão as válvulas propulsoras, motivadoras e multiplicadoras desse conhecimento para o restante da equipe”, salienta Vivian.

O terceiro fator de sucesso é o planejamento das ações com acompanhamento sistemático: tudo o que não tem data, nem pai, acaba engavetado. A certificação é um processo minucioso e complexo, mas se a organização estruturar planos de ações, priorizar os requisitos, definir responsáveis e prazo para entregas, o sucesso é garantido. As organizações que entram neste processo pela primeira vez por meio do IBES, levam em média de três a nove meses para alcançar os padrões e a certificação. “Esse prazo é geralmente mais curto em razão dos treinamentos de sensibilização, tutor para práticas padrão ouro e suporte técnico, oferecidos gratuitamente pelo IBES. Por tudo isso, sempre recomendo que a organização defina a data que almeja ser certificada, bem como a divulgue internamente de modo que todos estejam alinhados ao objetivo e prazo para alcançá-lo”, explica Vivian.

Na prática 1: Orbis

Ricardo Maranhão, da Orbis: “O engajamento de todos foi o nosso grande diferencial. O envolvimento da equipe, que carinhosamente chamamos de Orbis Team, fez toda a diferença”

A Orbis Gestão de Tecnologia em Saúde é a primeira empresa de engenharia clínica a conquistar o selo ONA, isso em 2020, após passar por uma rigorosa avaliação do IBES. Em setembro de 2022, passou por nova auditoria e foi recertificada. “Este selo eleva o padrão do serviço com o aumento da qualidade, melhoria dos processos e foco na satisfação do cliente, promovendo maior segurança ao paciente. Temos muito orgulho dessa conquista”, conta Ricardo Maranhão, diretor-executivo da Orbis.

Ele revela que a empresa encontrou muitos desafios para se adequar ao selo e venceu todos, desde o planejamento financeiro para investir na certificação, passando pela organização dos documentos e processos de qualidade, chegando à mobilização da equipe. “O engajamento de todos foi o nosso grande diferencial. O envolvimento da equipe, que carinhosamente chamamos de Orbis Team, fez toda a diferença. Tivemos também outras ações imprescindíveis, como o apoio de uma consultoria de qualidade, o investimento em software de gestão e a reorganização de alguns setores da empresa para nos adequarmos aos mais de 800 requisitos do manual de qualificação ONA”, detalha.

Oficina Qualifica Orbis foi criada para qualificação da equipe ao processo de conquista do selo ONA

Para outras empresas que desejam conquistar esse selo, Ricardo dá a dica: planejamento, organização e compromisso. “É fundamental que os colaboradores estejam envolvidos com os processos, desde a alta liderança e os gestores até a ponta. A cultura da empresa deve estar bem difundida para que todos entendam que, apesar de exigir muito trabalho, é um processo em que todos os setores crescem muito e evoluem de forma sistêmica. É um caminho sem volta.”

Na prática 2: Fisio-Tec

A Fisio-Tec Gestão em Tecnologia de Saúde também está entre as poucas empresas que conquistaram o Selo ONA em Engenharia Clínica. Em 2021, passou por rigorosa auditoria realizada pela IAQ DNV, comprovando o pleno atendimento aos requisitos em todos os setores internos. “Com este selo, obtido pela padronização de procedimentos focados na segurança do paciente, garantimos aos hospitais a excelência na prestação de serviços em saúde”, destaca Márcio Varandas, CEO da Fisio-Tec.

A acreditação é um grande diferencial competitivo no mercado e a empresa, além do selo ONA, certificou-se pela norma ISO 9001:2015, sendo, até o momento, a única empresa brasileira com essas duas certificações, conforme afirma Márcio. “A acreditação veio incorporar à Fisio-tec os requisitos do manual para todos os setores, amadurecendo a gestão interna, aumentando a produtividade, melhorando a integração dos colaboradores e aperfeiçoando os procedimentos operacionais”, garante.

Márcio Varandas, da Fisio-Tec: “Com este selo, obtido pela padronização de procedimentos focados na segurança do paciente, garantimos a excelência na prestação de serviços em saúde”

O maior desafio da Fisio-Tec para conquista do selo foi expandir para os demais setores a cultura já existente no setor de operação e, assim, adequar os processos internos aos requisitos da ONA. Para atingir o objetivo, a empresa montou um forte time de lideranças e estudou profundamente o manual, construindo passo a passo todos os processos conforme os requisitos exigidos. Na sequência, implantou os procedimentos, promovendo também treinamentos e acompanhamento de toda a equipe.

Para que outras companhias do setor também conquistem o selo, Márcio dá a dica: esteja ciente que toda a empresa deve colaborar para o processo de acreditação, já que os requisitos envolvem uma gestão mais organizada com procedimentos estratégicos e competentes. “Trabalho em equipe, foco e estabelecer e cumprir prazos são metas fundamentais a serem atingidas para um resultado coerente com as exigências. Além disso, é preciso estar a par do manual e das documentações necessárias para a empresa ser elegível a participar da acreditação”, expõe.

A adesão de outras empresas na busca pelo selo ONA traz naturalmente uma grande melhoria na qualidade dos serviços ofertados, padronização e credibilidade desses serviços, fortalecendo e valorizando o segmento de Engenharia Clínica.

A ABEClin é uma instituição que promove o desenvolvimento dessas empresas, pois contribuiu para o crescimento da profissão, oferecendo eventos, congressos e acesso a diversas informações, além de investir no reconhecimento e regulamentação da Engenharia Clínica.

EC no Brasil: um pouco de história

O setor de Engenharia Clínica surgiu no país na década de 80, por meio de cursos de especialização e em virtude de análises do governo mostrarem que uma fração considerável do parque de equipamentos médicos estava indisponível devido à falta de gestão/manutenção, como conta Alexandre Ferreli Souza, vice-presidente de Relações Institucionais da ABEClin.

Hospitais de referência, como Albert Einstein e Sírio-Libanês, entre outros, iniciaram seus departamentos de Engenharia Clínica, obtendo excelentes resultados, assim como universidades de renome ampliaram a capacidade de formação de engenheiros clínicos, iniciando novos cursos de especialização.

Com o crescimento da busca pela qualidade, por meio da acreditação e otimização de recursos, o mercado começou a entender a importância da EC e a implementar esse departamento nas unidades de saúde. Outras frentes passaram a absorver os profissionais de EC para aprimoramento e otimização de projetos, redução de custos, gestão de ativos, manutenção, coordenação de equipes e serviços, regulatório, etc. Todas essas áreas podem ser encontradas em secretarias de saúde, fabricantes de equipamentos médicos, representantes dos fabricantes, Ministério da Saúde, empresas de Engenharia Clínica, empresas de arquitetura e unidades de saúde.

A preocupação com a segurança do paciente contribuiu para a expansão da profissão nas unidades de saúde. A Engenharia Clínica está intrinsecamente relacionada com a segurança do paciente, como pode-se ver na definição adotada pela ABEClin: “o profissional de Engenharia Clínica é aquele que aplica as técnicas da engenharia no gerenciamento dos equipamentos de saúde para garantir rastreabilidade, usabilidade, qualidade, eficácia, efetividade, segurança e desempenho destes equipamentos, no intuito de promover a segurança dos pacientes”.

Redação

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