Relações defensivas. Esta é a situação atual nas novas posturas do relacionamento médico-paciente. Infelizmente, a “cultura” da judicialização nos relacionamentos profissionais, vindas do hemisfério norte de nosso continente, já se estabeleceu. Momento este em que a comunicação, em todo seu espectro, é de uma importância indiscutível. Tudo deve ser dito, tudo deve ser posto no papel, não deve, sob hipótese alguma, existir dúvida nos diagnósticos, propostas terapêuticas e ações médicas.
Este panorama sociológico é apenas pano de fundo para muitos questionamentos existentes, frente às imensas novidades tecnológicas e possibilidades oferecidos pelos novos meios de comunicação. Estão aí as redes sociais, mecanismos de espionagem, como gravadores e filmadoras disfarçadas de utensílios, a existência de uma plataforma que viabiliza um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido super dinâmico e acessível e, enfim, a tão falada nestes últimos tempos, hoje regulamentada, a Telemedicina.
O paciente pode gravar a consulta? E o médico? E filmagens, podem ser utilizadas? Conversas no WhatsApp, servem como provas? Diagnósticos feitos à distancia por Skype, ou por envio de fotos por SMS, estão suportados pela lei?
Caros amigos, muita informação para um único texto que tem por objetivo pontuar algumas orientações. Então abordarei todos os temas citados em futuras publicações, começando aqui com a Resolução CFM nº 2.227/2018, publicada no D.O.U. de 6 de fevereiro de 2019, Seção I, p. 58, que define e disciplina a telemedicina como forma de prestação de serviços médicos mediados por tecnologias.
Comecemos com a definição de Telemedicina: exercício da medicina mediado por tecnologias para fins de assistência, educação, pesquisa, prevenção de doenças e lesões e promoção de saúde (ART. 1o desta resolução).
É fato que esta resolução aborda relações intermédicas ou interprofissionais de saúde, triangulando informações com o paciente, via eletrônica, em prol da saúde deste. Tudo muito claro até aqui.
Em outros artigos desta mesma resolução, ainda ficam claros e nomeados atos médicos à distância que, ora regulamentados, passam a existir como Teleinterconsulta, Telediagnóstico, Telecirurgia (sim, creiam!), Teleconferência, Teletriagem, Telemonitoramento (ou Televigilância), Teleorientação e Teleconsultoria. Recomendo firmemente a todos lerem tal resolução em suas sete laudas de composição. Vale a pena.
Em especial, quero trazer a importância do Artigo 4º da Resolução que, entendendo meios tecnológicos e médico e paciente geograficamente distantes, diz em seu parágrafo 1º que “a teleconsulta subentende como premissa OBRIGATÓRIA o prévio estabelecimento de uma relação PRESENCIAL entre médico e paciente”, o que põe fim à discussão quanto a negligência do exame físico presencial, uma vez que trata-se de uma relação presencial pré estabelecida. Ainda seguem outros parágrafos neste mesmo artigo que condicionam esta relação eletrônica desde que tenha havido consulta física num período não superior a 120 dias (em casos crônicos), haja profissional médico que esteja controlando in loco tal paciente em seu exame físico, abrindo assim a possibilidade de teleconferência intermédicos.
Contudo, em 22/02/2019 o próprio CFM solta uma nota, revogando tal resolução. Médicos, entidades médicas e população devem ser consultados sobre o assunto de forma mais profunda. Nova Resolução será emanada após estudos mais apurados sobre a tal “Medicina à distância”.
É de fato muito cedo para soltar estimativa do que virá a ser qualquer controvérsia judicial em relação a tais fatos tão novos em nossas existências. Assistimos de fato a uma nova era nos relacionamentos humanos e profissionais. Restam algumas questões gerais, que implicariam num enorme “compliance” de todo este sistema de abertura comunicacional e, no “frigir dos ovos” de prestação de serviços médicos. E, sem dúvida, a discussão de toda a gama de condições jurídicas que abarcarão novos fatos.
Sociedade e Direito se moldam ao longo dos tempos. Entraremos numa era de novidades em resoluções jurídicas para novos eventos, tais como as futuras controvérsias na Telemedicina.
A nós, cabe ficarmos atentos para a eficácia e controle desta nova instituição.
Mário Warde é cirurgião plástico, perito judicial, doutorando em Direito e idealizador da startup Go2doc