Covid-19: médicos criticam políticas governamentais e se dividem sobre flexibilização

Pesquisa realizada pela Fine Research com 5.076 médicos de 16 países da América Latina mostra que o Brasil, onde foram feitas 1.006 entrevistas, enfrenta uma situação bem crítica de acordo com as perspectivas desses profissionais. Para 46% dos médicos brasileiros, a política do governo contra o Coronavírus é considerada pouco efetiva, subestimando o impacto da pandemia. Há dois meses, em uma onda prévia da pesquisa, brasileiros mostravam-se otimistas quanto à capacidade do país para enfrentar a pandemia: 87% dos médicos do país consideravam que as iniciativas desenvolvidas pelas autoridades eram efetivas.

Outro tema abordado na pesquisa é a flexibilização. Os resultados mostram que o país está polarizado entre quase uma metade que acha que é preciso flexibilizar de forma gradual e controlada, e outra metade que considera que deve-se manter ou aumentar as medidas de restrição. Somente 4% se inclinam a uma flexibilização significativa. Os médicos que falam que o principal desafio é a queda do número de pacientes atendidos inclinam-se para uma flexibilização gradual. Já os que são mais propensos a manter ou acentuar as restrições são aqueles que têm a sua preocupação central no risco de contágio.

Os médicos também são críticos quando perguntados sobre a disponibilidade de testes: 92% consideram que estão abaixo do nível ideal. Já 63% acham que nem mesmo todas as pessoas com sintoma e perfil de risco conseguem realizar os testes. Ao lado do Peru e Equador, o Brasil não só se encontra entre os países com maior quantidade de casos em média por médico, mas também é o país que apresenta menos quantidade de testes em relação à quantidade de pacientes confirmados e pacientes com sintomas compatíveis, sugerindo que a subnotificação de casos é muito maior no país do que a média dos países da região.

Além disso, a grande maioria considera “pouco” ou “nada adequada” a infraestrutura hospitalar, com alto risco de colapso de leitos de internação, áreas de UTI e ventiladores. No total, 16% dos médicos expõem que as áreas de UTI já estão colapsadas, enquanto 43% acham que vai colapsar em poucos dias ou semanas, se o ritmo atual da pandemia se mantiver.

A falta de equipamentos e protocolos claros para atendimento de pacientes com Covid-19, e também de outros tipos de pacientes, preocupam os profissionais.

Por último, a pesquisa evidencia a extrema a falta de empatia e desproteção dos profissionais de saúde, para todos eles e particularmente para aqueles na linha de frente que recebem a combinação de menor rendimento financeiro, maior pressão de ambiente, impacto emocional e risco real de contágio para eles e as suas famílias.

Futuro

Em média, os mais de 5 mil profissionais pesquisados na América Latina estimam que levará cerca de 4 meses para que a situação esteja sob controle e a população possa retornar às suas atividades com mínimas restrições. Os médicos brasileiros concordam com essa estimativa. Dois meses antes, eles tinham estimado esse prazo em 3 meses, mostrando como o avanço da pandemia tem mudado as perspectivas dos médicos.

Os profissionais brasileiros estimam que levará cerca de 7 meses para a realização massiva de testes, 11 meses para a disponibilidade de tratamentos farmacológicos efetivos e cerca de 17 meses para que existam, nos países da região, vacinas efetivas contra a Covid-19.

Para os profissionais, o futuro pós-pandemia envolverá um importante impacto na saúde física e emocional da população, bem como uma transformação profunda do ecossistema de saúde, com menos pacientes e, para muitos, também com menos instituições.

Aliás, esperam-se mudanças nas modalidades de atendimento médico, com novos protocolos e o uso da prescrição eletrônica e a utilização prolongada da telemedicina. No Brasil, o atendimento por meio de opções “não presenciais”, como o telefone, aplicativos, como WhatsApp, ou plataforma com vídeo, foi menor do que em outros países, representando apenas 25% dos pacientes atendidos.

Em nível regional, a telemedicina aparece como uma opção particularmente adequada para algumas especialidades. A maioria dos psiquiatras, por exemplo, prognosticam o seu uso futuro em sua própria prática. No entanto, a pesquisa confirma o seu papel mais limitado em outras especialidades. Globalmente, a maioria prefere uma atenção presencial que possibilite o exame físico.

De qualquer modo, a telemedicina veio para ficar e, no Brasil, perto de um quarto dos consultados acha que, pós-pandemia, ela fará parte do seu atendimento futuro aos pacientes, em forma alternada com o atendimento presencial.

Sobre a pesquisa

A pesquisa foi realizada pela consultora regional Fine Research (fine-research.com), especializada em estudos de saúde, entre os dias 18 ao 22 de maio de 2020.

A pesquisa foi feita de forma online com médicos registrados na plataforma, que compreende mais de 90 mil profissionais de atenção primária e diversas especialidades.

O estudo abrange 16 países da América Latina. No total, participaram 5.076 médicos, com a seguinte distribuição:

Argentina 1003 Guatemala 85
Brasil 1606 México 920
Chile 189 Panamá 34
Colômbia 773 Peru 78
Costa Rica 51 R. Dominicana 54
Equador 59 Uruguai 60
El Salvador, Honduras e Nicarágua 43 Venezuela 121
Redação

Redação

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.