Em maio passado, o governo norte-americano acusou hackers chineses de tentarem roubar dados relativos às pesquisas que vinham sendo desenvolvidas para combater o Coronavírus.
Isso soou estranho para aqueles dotados de um pouco de bom senso; afinal, dados sobre pesquisas referentes ao combate à pandemia devem ser públicos, de forma a ajudar a todos os pesquisadores que estão trabalhando no assunto – a pandemia é um problema global e deve ser enfrentado globalmente. O compartilhamento de informações certamente levará à descoberta mais rápida de medicamentos, vacinas e procedimentos de segurança úteis.
Agora, a justiça americana, baseada em investigações conduzidas pelo FBI, está anunciando o indiciamento de dois hackers chineses pelo roubo dos dados. Trata-se de puro jogo de cena, pois além de os presumidos ladrões estarem na China, os americanos não sabem quem eles são – é apenas uma maneira desse pessoal mostrar que está agindo.
Mais recentemente, a história se repetiu, só que agora os hackers não são chineses, são russos, que estariam espionando e tentando roubar segredos de instituições americanas, britânicas e canadenses envolvidas no desenvolvimento de vacinas; manter segredo sobre essas pesquisas realmente é algo vergonhoso.
Mas à vergonha se soma o ridículo: o deputado republicano Kevin McCarthy está propondo uma legislação que prevê sanções a hackers estrangeiros que tentarem roubar informações sobre vacinas contra a Covid-19. Essa legislação também será inócua, pois identificar positivamente esses hackers, que vivem fora dos Estados Unidos, é quase impossível, além desse país não ter jurisdição sobre cidadãos de outros países.
Existem duas razões que podem explicar essas posturas, ambas imorais: a primeira, os interesses econômicos, os lucros derivados da venda das vacinas – a que chegar primeiro ao mercado, certamente fará com aqueles que detém direitos sobre ela ganhem rios de dinheiro. A segunda, seria poder dizer “fomos os primeiros a conseguir a vacina”, e com isso ganhar enorme capital político.
Diante dessas razões, o que importam as centenas de milhares de mortos?
Vivaldo José Breternitz é Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie