Na última década, dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) mostram queda de, pelo menos, 14% na cobertura vacinal no Brasil. Após o início da pandemia, esses números são ainda mais expressivos, principalmente devido ao impacto da propagação de fake news.
Para combater a desinformação, Dr. Sandro Cavallero, diretor da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) e Coordenador do Comitê de Tumores do Sistema Nervoso Central, defende que todas as condutas médicas devem ser baseadas na ciência e nas pesquisas clínicas. “Infelizmente, por conta do alastramento da desinformação por grandes lideranças, parte da população ficou no escuro, sem saber no que acreditar. Com isso, no meio de uma crise de saúde global, tivemos também uma crise política, ampliando o cenário de incertezas”, comenta.
A crescente disseminação de fake news impactou a confiança da população em vacinação, principalmente em torno dos testes realizados para a vacina contra o Coronavírus. Para Dr. Cavallero, as notícias falsas se disseminaram tanto quanto, ou talvez até mais, que o próprio vírus. “Não só os médicos, mas todo cidadão, tem como dever o combate às fake news. Disseminá-las é grave em todos os aspectos, desde moral e ético até gerar riscos para a saúde da população”.
Foi por meio das vacinas que o Brasil erradicou diversas doenças, entre elas a poliomielite e a varíola. “A erradicação seria possível, também, com o câncer do colo de útero, em que 90% dos casos são causados pelo vírus HPV, se a vacina fosse mais divulgada e tivesse maior adesão de meninas dos 9 aos 14 anos e meninos dos 11 aos 14 anos, o que já é realidade em outros países”, acrescenta Dr. Cavallero.
Em relação ao câncer, existem dois pontos importantes: as vacinas para tratar o câncer, criadas com o intuito de atuar contra a doença já existente, mas que ainda são experimentais; e também as vacinas para prevenir o câncer, como é o caso da própria vacina anti-HPV e, também, as vacinas contra a hepatite B e C, que são responsáveis pelo desenvolvimento de cirrose e câncer de fígado em pacientes crônicos. Ou seja, todas essas doenças também podem ser prevenidas.
Por outro lado, ainda de acordo com o diretor da SBOC, é um desafio muito grande vacinar a população por completo. “Existe uma demanda estratégica e logística para que consigamos atingir o sucesso nacional. O Ministério tem um programa respeitável, que perde força nesse cenário. Nosso papel é continuar educando que todas as vacinas são seguras, com eficácia comprovada e não causam disfunções cerebrais, como demência, epilepsia, Alzheimer, autismo ou outras consequências.”
Pacientes oncológicos podem (e devem) tomar vacinas, mas levando em consideração as orientações médicas. “Se a imunidade do paciente estiver baixa, seja por conta da própria doença ou pelo tratamento quimioterápico, não é aconselhado tomar as que chamamos de vacinas de vírus vivo, como as de febre amarela, catapora e sarampo, por exemplo. Já as vacinas de vírus não vivo, como a da gripe e, em breve, a do Coronavírus, que possuem a função de aumentar a imunidade do paciente, não há contraindicação. Uma das vacinas mais recomendadas para os pacientes de câncer é a pneumocócica, contra pneumonia e meningite, mas que, infelizmente, é pouco divulgada”, completa Dr. Cavallero.
A mensagem da SBOC para aqueles que não acreditam nas vacinas é para que confiem na ciência, pois é possível deter doenças altamente contagiosas através da vacinação. A entidade sempre defendeu com afinco a importância do incentivo às pesquisas clínicas, além de ter como compromisso disseminar informações de qualidade e que sigam protocolos baseados em evidências científicas, como meio de educar a população. Afinal, quanto mais a população souber a respeito, maior a mobilização para que mudanças sejam concretizadas.
A SBOC mantém orientações atualizadas sobre vacinação em seu site e determinou metas e estratégias para incentivar a vacinação anti-HPV e erradicar o câncer de colo de útero, alinhadas à campanha global lançada recentemente pela OMS e adaptadas para a realidade do Brasil. São elas atingir 90% de cobertura vacinal em meninas e meninos, 70% de rastreamento da doença e 90% de acesso a diagnóstico e tratamento precoce, até 2030.
Atualmente, o Brasil atinge 70% de cobertura vacinal na primeira dose e menos de 50% na segunda; apenas 25% de rastreamento da doença; e 50% de mulheres que têm dificuldade no acesso ao tratamento. A SBOC acredita que com a união de forças das sociedades de saúde na conscientização da população, na divulgação de programas de vacinação, no aprimoramento e atualização dos exames de rotina e no aumento do acesso a melhores tratamentos em todas as regiões do país, o país pode alcançar essas metas dentro do prazo estabelecido.