A pandemia causada pela Covid-19 vem promovendo um esforço extraordinário de vários setores para conter, não só a expansão e disseminação da doença, bem como as consequências biopsicosociais em sequência e por tempo indeterminado.
O Brasil, com população superior a 200 milhões de habitantes, antes da pandemia já arcava com um percentual de 10% de pessoas carecendo de cuidados psiquiátricos e psicológicos. Temos um consumo de psicotrópicos diários, da ordem 20 milhões de comprimidos. É raro encontrar um adulto ou jovem que não toma um antidepressivo, ansiolítico ou hipnótico por dia.
A pandemia veio acelerar o uso destes produtos, por conta do agravamento do transtorno psiquiátrico pré-existente. As clínicas e consultórios médicos estão sufocados por conta do aumento da demanda.
O fato é que a psiquiatria no Brasil tem evoluído e apresentado melhoria na qualidade do atendimento, especialmente quando realizado por equipes multidisciplinares. Infelizmente, ainda muito reduzidas em números para pacientes graves.
A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) tem se esforçado no sentido de promover cursos novos e de atualização em seus congressos, inclusive com o uso da telemedicina. Acredito que a telemedicina, especialmente nas áreas da psiquiatria e psicologia, será extremamente eficaz no atendimento maciço da população em todo o Brasil. Obviamente, sendo observadas a real necessidade e uso de forma prudente, levando-se em conta as diferenças culturais e sociais nas diferentes regiões do país.
No tocante a pacientes com transtorno psiquiátrico grave e agudo, o serviço de internação é o indicado e, se possível, com atuação de equipe multidisciplinar. Já o Hospital Dia e ambulatório serão serviços complementares para pacientes egressos de internação, bem como para pacientes sem crise ou agudizados.
Se durante a pandemia estes serviços já seriam muito bem indicados, imaginem pós pandemia?
A avalanche de pessoas que perderam entes queridos na pandemia e que necessitarão, no mínimo, de acolhimentos psiquiátrico ou psicológico, nos preocupa bastante. Houve uma sucessão de perdas, em todos os sentidos. É provável que muitos desses casos venham necessitar de abordagens psicológica e psiquiátrica.
A saúde mental ganhou holofotes neste cenário de pandemia e isolamento social, mas ainda é visível o preconceito ou estigma com pacientes psiquiátricos. O fato é que a sociedade ainda rejeita aqueles cujos sintomas estão de alguma forma acentuados. É um trabalho longo a ser desenvolvido junto com a família no primeiro momento, pois ela é geralmente a primeira estigmatizá-lo junto aos próprios parentes. Esse preconceito é muito ruim, porque ele faz mal para aqueles que são vítimas e acaba por afastar essas pessoas dos tratamentos.
Considero cedo retirar lições da pandemia para cuidar da saúde mental. É preciso seriedade.
Além disso, também é preciso uma discussão consciente sobre a questão do isolamento, seguir protocolos de segurança e distanciamento social, e restrição a circulação de pacientes internados ou em tratamento. Ainda estamos num momento muito delicado na questão da pandemia, mas temos trabalhado para voltarmos a rotina de forma segura.
A participação da sociedade para que ocorra esta estabilidade é fundamental: “Saúde para todos, requer todos para a saúde”.
Licínio Ratto é Diretor-Presidente da Casa de Saúde Saint Roman, do Rio de Janeiro (RJ)