Artigo – Boreout: o outro lado da moeda do Burnout

A síndrome de Burnout, antes da pandemia, nem tão bem conhecida no senso comum das pessoas, atualmente apresenta níveis alarmantes de volume de pessoas acometidas e passa a ser reconhecida como doença ocupacional. A saúde mental dos profissionais virou um assunto que entrou definitivamente no radar dos gestores de Recursos Humanos e das lideranças imediatas e não tem data prevista para sair. Seus impactos na folha de pagamento, nos seus índices de absenteísmo, afastamentos, aposentadorias precoces, atestados, erros e processos trabalhistas impactam qualquer orçamento e a qualidade de vida das pessoas no âmbito profissional.

O trabalho não deveria ser somente uma forma de se obter renda, mas uma atividade que deve proporcionar um desenvolvimento e uma realização pessoal. Através do trabalho, os indivíduos também se desenvolvem, estabelecem e mantém contatos pessoais, status social, vínculos afetivos, ocupação do tempo, propósito pessoal dentre outros.

Seguramente não deve ser o único motivo, mas em um mundo em que a experiência do cliente se percebe como algo imprescindível para criar um relacionamento duradouro com a empresa, as Instituições de Saúde não têm como deixar de olhar para seus profissionais de forma cuidadosa, pois a forma com que são tratados seguramente afetarão o modo com que tratam os clientes finais.

Por um outro lado, do outro lado da moeda, surge outra síndrome. A Síndrome de Boreout, síndrome em que funcionários muitas vezes desmotivados não conseguem encontrar tarefas que gostem ou se sentem desenquadrados em suas empresas, subvalorizam aquilo que executam, muitas vezes por achar as suas atividades monótonas e pouco desafiadoras. São profissionais que atuam mal e vagarosamente, apresentando resultados de baixo desempenho, frequentemente usando seu tempo durante o expediente para assuntos pessoais e entregando o mínimo necessário para sua sobrevivência.

O Boreout é resultado de um distanciamento do colaborador com o trabalho, seja por não ver mais sentido naquela ocupação, ou mesmo por se sentir “super qualificado” para aquelas tarefas e não se identificar mais com aquilo que a empresa desenvolve ou produz. Pode também se sentir pouco valorizado pelo baixo salário que recebe, quando comparado com o potencial que imagina ter, se frustrando por ter que se submeter a atividades tão pouco desafiadoras e sem perspectiva de crescimento no curto prazo.

O modelo de liderança tradicional, fundamentados em modelos de gestão de comando e controle já não atendem mais as demandas dos tempos atuais e exigem uma urgente reformulação. Tanto o Burnout como o Boreout afetam diretamente a qualidade e a produtividade.

Uma reação que temos presenciado no mundo pós pandêmico está na busca por flexibilidade e propósito em seu trabalho, além de equilíbrio e satisfação em suas vidas.

Muitos jovens profissionais rejeitam o estilo de vida de “viver para o trabalho”, continuando a trabalhar, mas não permitindo que o trabalho controle suas vidas.

Trabalhar “no mínimo” pode parecer contraditório às gerações que se orgulhavam de serem chamados de workaholic (viciados em trabalho), o que vem sendo chamado por alguns estudos do fenômeno “demissão silenciosa” – em que aos poucos se desligam dos interesses da instituição em busca de seus próprios interesses. Como impedir alguém de buscar sua própria felicidade? Mas será que não seria possível buscarmos algum equilíbrio?

Penso que como líderes, podemos melhorar este equilíbrio sem ter que perder uma mão de obra qualificada alinhando os respectivos interesses. As lideranças e a própria organização devem revisitar alguns pontos cruciais para que possam tornar mais claros as expectativas do trabalho a ser realizado e as suas atribuições durante todo tempo que o profissional atuar na empresa. Principalmente na chegada de novos talentos.

Uma delas, sem dúvida, é um bom processo de integração (onboarding). Conhecer a cultura organizacional, perceber como suas habilidades serão utilizadas, respeitar as diferenças não pode ser apenas um discurso.

De acordo com artigo publicado no site da Great Place to Work:

“Um programa de onboarding eficaz aumenta o senso de pertencimento e reduz drasticamente o turnover. Organizações que promovem um processo de integração estruturado experimentam uma produtividade 62% melhor, segundo a Society for Human Resource Management (SHRM), e um índice de permanência 50% maior entre os novos contratados, como informa um estudo da Aberdeen Group. O State of the American Workplace, relatório anual da Gallup sobre ambientes de trabalho nos Estados Unidos, mostra que apenas 12% dos funcionários afirmam que a sua organização tem um ótimo programa de onboarding. Essa fragilidade no vínculo empregador-empregado é o que pode elevar os índices de rotatividade. É por isso que a proximidade com os novos colaboradores é tão fundamental. Para 96% deles, como aponta o LinkedIn, o contato regular com o gerente direto influencia diretamente na qualidade da experiência de integração.”

Percebe-se claramente que trabalhar tendo um propósito maior que a tarefa que executa gera um senso de contribuição, fundamental para desejar prosseguir e acertar.

Ressignificar suas tarefas, gerar pertencimento e engajamento devem ser colocados como estratégia da organização desde o recrutamento até a continua seleção que não termina com a contratação – mas continua a existir continuamente durante toda sua carreira. Quando a organização e o indivíduo se alinham em suas identidades e valores, cria-se um propósito comum que cria um nível superior de engajamento. Ou seja, criamos e aprendemos mais quando somos desafiados, nos sentimos motivados, confiantes e nos sentimos parte de uma comunidade que atuam com uma visão compartilhada.

Já parou para pensar que as gerações X (1961-1980), Y (1981-1995) e Z (1995-2010) e Alfa (a partir de 2010), tem exatamente o mesmo cérebro? Ou seja, você tem o mesmo cérebro se seu bisavô. A diferença não está no cérebro, mas na mente. Está de verdade, nos diferentes estímulos que cada um recebe e em suas motivações. Todos podem ficar aborrecidos ou engajados com as tarefas que resultam de sua atividade profissional. E todos, a sua maneira, podem se aborrecer por desempenhar o trabalho em que estão empregados ou fazer disso a sua inspiração.

O chamado Lifelong Learning (aprendizagem contínua) deve também ser estimulado pela organização e lideranças. No mundo volátil e instável de hoje, com transformações tão rápidas e disruptivas, percebemos a rápida obsolescência de conceitos, modelos e direções pela própria empresa. Mesmo aqueles conceitos consagrados por muitos anos e gerações vem sendo modificados por inovações em todas as áreas do conhecimento. Em Instituições de Saúde não é diferente.

Estas transformações são gigantescas e geram ciclos tecnológicos sequenciais cada vez mais curtos, exigindo resiliência e renovação constante por parte de cada profissional – independentemente de seu mercado de atuação. Os ambientes geram intensa inovação tecnológica, e a própria pressão competitiva obriga o profissional a manter níveis elevados de suas competências atualizadas e permanentemente renovadas.

Prof. Marcelo Boeger é Mestre em Planejamento Ambiental (UNIBERO) e Mestre em Gestão da Hospitalidade (ANHEMBI LAUREATE). Atua como sócio e consultor da Hospitallidade Consultoria. Coordena o comitê de FM em Serviços de Saúde da ABRAFAC, as regionais da Sociedade Brasileira de Hotelaria Hospitalar e o Grupo de Excelência do Conselho Regional de Administração de São Paulo. É Professor do MBA de Gestão em Saúde e Controle de Infecção Hospitalar (CCIH-MED), de gestão em Saúde da Fundação Unimed, coordenador e professor do curso de especialização em Hotelaria e Facilities do Hospital Albert Einstein

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