Nos meus mais de 40 anos de vivência hospitalar nunca presenciei tanto investimento em novas tecnologias como nos dias atuais. Os diagnósticos estão cada vez mais precisos, assim como os tratamentos mais individualizados e eficazes, proporcionando ao homem um salto espetacular na longevidade.
No entanto, a busca por uma vida longa por si só não é eficiente para evitar o sofrimento e a dor de quem convive com uma doença grave. Mais do que o avanço nas ciências médicas é preciso enfrentar a terminalidade da vida oferecendo um atendimento integral e humanizado. É este espaço que habita o cuidado paliativo, abordagem que oferece condições para que o indivíduo viva com dignidade cada ciclo da vida, até a finitude.
A Organização Mundial da Saúde defende que o cuidado paliativo seja tratado como “uma necessidade humanitária urgente” para pessoas com doenças graves. No Brasil, acabamos de comemorar a aprovação da Política Nacional de Cuidados Paliativos para o Sistema Único de Saúde (SUS) em Reunião Ordinária da Comissão Intergestores Tripartite (CIT) realizada nos primeiros dias deste mês. Este documento guia e especifica um objetivo comum a ser seguido pelo SUS: oferecer para toda a rede que atende um cuidado paliativo de qualidade e baseado em evidências, de acordo com as diretrizes da OMS. No entanto, há desafios maiores a serem alcançados. No país, menos de 10% das 2.500 unidades hospitalares com mais de 50 leitos têm equipes capacitadas para abordar dores, angústias e morte, sendo que mais da metade estão localizados na região Sudeste do país.
Para mudar esse cenário é preciso investir em uma formação adequada de equipes multidisciplinares. Com o trabalho de informar a importância da abordagem para além dos pacientes terminais, a capacitação promove a decisão compartilhada e abre espaço para discussão dos medos e reduz as possibilidades de insucesso do tratamento. Outra questão essencial é que haja uma mobilização para que o acompanhamento ambulatorial e hospitalar por equipe em cuidados paliativos faça parte do chamado rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Estar nessa lista significa que o procedimento em questão conste em uma tabela e seja pago pelo operadoras de planos de saúde. Milhares de pessoas que sofrem de alguma patologia em curso e em evolução serão beneficiadas até a fase final da vida.
Está mais do que na hora de virar esse jogo e avançar também na medicina paliativa. A dor, o medo, a insegurança, a ansiedade, o isolamento são elementos altamente nocivos para o paciente em estado grave e seu familiar. E, nós do setor da saúde, temos o dever de realizar esforços para que todos os indivíduos sintam conforto até o seu último instante de vida.
George Schahin é diretor presidente do Hospital Santa Paula, de São Paulo (SP)