Em 1999, eu estava principiando meu segundo ano de Residência Médica em Otorrinolaringologia na Santa Casa de Porto Alegre (RS). Na época, surgiu nesse meio a preocupação em torno da alta incidência de câncer de laringe na população brasileira, e a percepção de que o leigo pouco conhecia sobre seu diagnóstico e prevenção.
O professor Nédio Steffen, da PUC, era o presidente da Academia Brasileira de Laringologia e Voz (ABLV). Com o engajamento de nossos professores da Santa Casa e nos serviços de todo o Brasil, fomos convidados a participar da Primeira Campanha Nacional da Voz. Num fenômeno ímpar e muito bem orquestrado, diversos serviços e profissionais da Otorrinolaringologia se envolveram nas ações educativas e de triagem diagnóstica.
Fazíamos laringoscopias gratuitas, com fichas distribuídas nos locais públicos onde íamos divulgar a campanha. A ação alcançou em torno de 40 mil pessoas atendidas em todo o Brasil. Aquela especialidade de nome esquisito começava, então, a ser mais conhecida pela boa vontade em divulgar cuidados com a voz.
O ineditismo da campanha e a competência da otorrinolaringologia brasileira em aderir e divulgar suas ações foram incrementadas até que em 2003 o dia 16 de abril ficou marcado como o Dia Mundial da Voz, mediante parcerias com entidades internacionais, para chegar também a outros países.
Neste emblemático 2021, uma pandemia mundial tem adoecido o aparelho vocal de milhares de pessoas, vítimas de sequelas de uma intubação prolongada para tratamento de Síndrome Respiratória Aguda Grave por Covid-19.
A atenção da campanha deste ano se volta ao seu princípio: lembrar a todos que, apesar dessa pandemia, existem outras doenças que não podem ser esquecidas, e cujo diagnóstico e tratamento também não podem ser postergados. Neste ano, nos cabe voltar a lembrar do câncer de laringe como uma meta diagnóstica e preventiva.
Que essa seja a oportunidade de criarmos um canal de comunicação com a população, lembrando que os otorrinolaringologistas e os fonoaudiólogos são os profissionais que trabalham em conjunto, a fim de diagnosticar e tratar as patologias vocais. Espero que nos anos vindouros possamos novamente comemorar esse dia, que se tornou símbolo mundial da luta a favor da saúde vocal, mais próximos e unidos em um só voz, a qual não seja calada por nenhum vírus que impeça nossa liberdade e nossa paz.
Daniela Boeira da Silva é coordenadora do Ambulatório de Otorrinolaringologia do Hospital Dona Helena, de Joinville (SC)
Doutora Daniela Boeira é excelente profissional, ama o que faz e isso faz toda diferença. Não só aqui neste belíssimo artigo, mas também em seu consultório, sempre preocupada com todo o contexto e não somente com o problema de cada paciente. Parabéns Dra.!