Artigo – Programas de integridade na saúde devem ganhar mais espaço no pós-pandemia

Em março de 2020 o mundo provou o gosto amargo da vulnerabilidade. Um vírus, um ser vivo invisível, colocou todo o planeta em estado de emergência e nos desafiou a encontrar novas saídas e soluções para um problema que envolvia diferentes esferas da sociedade. A área da saúde foi, sem dúvidas, a mais abalada nessa cadeia. De profissionais da linha de frente ao setor administrativo, todo o segmento precisou reestruturar sua dinâmica de atuação para garantir atendimento à população. Nesse cenário, vimos aflorar um debate essencial para as instituições do ramo: como está organizada a sua governança corporativa?

Podemos classificar o Compliance como um regulador das instituições de saúde, atuando para fortalecer sua credibilidade, qualidade e segurança dos pacientes. Um programa de integridade possibilita uma melhor avaliação dos riscos, traçar objetivos e metas, mitigar danos, prevenir fraudes, além de difundir internamente uma cultura íntegra e inovadora na empresa. Durante a pandemia do novo Coronavírus não foram poucas as vezes que acompanhamos pelo noticiário problemas de gestão de leitos, falta de medicamentos, desvio de recursos, atrasos de fornecedores, entre tantas outras situações de dificuldade. Com um programa de integridade bem elaborado e aplicado no dia a dia das empresas, questões como essas poderiam ter sido previstas e, em alguns casos, amenizadas ou extintas, proporcionando melhor qualidade e segurança para os colaboradores e pacientes/clientes em meio ao período vivido.

Imersos nesse cenário de desafios, tivemos que desenhar novos métodos para agilizar e assegurar os processos envolvidos. Vou dar alguns exemplos: alguns códigos de conduta de empresas mudaram com a pandemia, passaram a incluir, por exemplo, um manual para trabalhadores em home office e orientações de distanciamento social. Determinados prazos de pagamentos também mudaram, visto que os hospitais precisam de mais compras emergenciais com novas regulamentações aplicáveis. Novos turnos de trabalho foram criados, bem como a valorização profissional e salarial de alguns trabalhadores da linha de frente. Assim como o aumento do uso de álcool em gel e a adesão a telemedicina, parte dessas mudanças no setor integra uma nova estrutura que deve perdurar, não irá embora com o vírus, são lições e implementações que vieram para ficar.

A atuação do Compliance em saúde é ampla. Os processos estabelecidos a partir de métricas e implantações como BPO, Due Diligence ou mapeamento de risco, interferem diretamente na rotina de uma unidade de saúde. Gerenciar as compras de insumos e medicamentos, avaliar fornecedores, controlar estoque e farmácia hospitalar ou gerenciar o uso de leitos passa a acontecer de forma mais assertiva e segura com esses programas implantados. Além disso, o Compliance investe na capacitação de seus colaboradores, criando iniciativas a fim de desenvolver e propagar um guia de comportamento interno alinhado com a nova realidade, com o objetivo de inibir potenciais desvios de conduta.

O setor da saúde é mutável, ajusta suas legislações e regulamentações de acordo com o que o momento exige, porém, a pandemia causou um acúmulo de informação no segmento que já vinha experimentando algumas mudanças jurídicas. Portanto, as empresas da área devem ficar atentas ao cenário futuro, que trará uma gama de processos para adequação e transformação. Veja os principais motivos para estabelecer programas de governança corporativa na área da saúde após a pandemia do Coronavírus:

1 – Mapeamento de riscos

O principal motivo continua sendo o mapeamento periódico de riscos financeiros, de negócio e de imagem para a empresa. A avaliação criteriosa de possíveis parceiros em contratações e terceirizações é um dos fatores mais importantes para a aplicação de programas de Compliance. Com a pandemia aprendemos que devemos estar sempre preparados para qualquer imprevisto.

2 – Apoio na LGPD

As penalizações para quem infringir a Lei Geral de Proteção de Dados já está valendo e o ambiente da saúde é um espaço desafiador nesse assunto. Classificado como dados sensíveis, esse segmento precisa estar totalmente alinhado com as novas regras para evitar multas e processos judiciais, visto que as sanções podem chegar a R$ 50 milhões.

3 – RN 443

A Resolução Normativa da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estabelece regras para a implantação de sistema de Compliance na área de saúde supletiva, ou seja, as operadoras terão que aderir práticas mínimas de governança corporativa, com ênfase em controles internos e gestão de riscos. Um dos destaques da RN é a definição clara de objetivos, controles e responsabilidades da instituição, de forma a evitar conflito de interesses nos processos internos. Também passa a ser exigido testes de segurança e conciliação para os sistemas de informações, bem como a padronização de conhecimento entre os administradores quanto aos principais riscos das suas atividades.

Essas informações deverão formar o Relatório de Procedimentos Previamente Acordados (PPA), elaborado por auditor independente e enviado anualmente à ANS no primeiro trimestre de cada ano subsequente. O Envio do PPA será facultativo até o exercício 2022, após esse período, será obrigatório para empresas de grande e médio porte. As pequenas empresas ou as classificadas como autogestão estão isentas da obrigatoriedade.

4 – Nova lei de licitações

A nova lei de licitações incentiva o trabalho do Compliance com o objetivo de diminuir o risco de fraudes e corrupção, principalmente com empresas que contratam com o poder público. Uma das novidades na Lei Federal 14.133/21 é que no caso das contratações acima de R$ 200 milhões, os programas de integridade são obrigatórios ao licitante vencedor. Outro aspecto é que em caso de empate entre duas ou mais propostas, um dos critérios de desempate é o desenvolvimento pelo licitante de programas de integridade.

5 – Transparência e tecnologia geram economicidade

O programa de integridade consegue, através de tecnologia e métricas, verificar possíveis comportamentos de repetição e apontar caminhos para a melhor gestão da empresa. Oferece soluções que prezam pela eficiência e economicidade dos recursos colocados. Além disso, empresas com políticas de transparência são mais bem vistas no mercado e conseguem bons resultados com seus stakeholders.

6 – Melhor gestão de recursos e leitos

Por meio de acompanhamentos de métricas periódicas é possível estabelecer uma logística eficiente e sustentável de uso de leitos e medicamentos, além da melhor gestão de recursos de acordo com a demanda registrada. Quando a governança clínica do setor de saúde está em bom funcionamento, significa que os pacientes estão sendo bem assistidos e a vida está em primeiro lugar, como deve ser antes de qualquer outro preceito.

Lucas Jacomassi é CCO da True Auditoria, plataforma completa voltada para o setor de Saúde, com serviços de compliance, consultoria e auditoria e tem solução integral independente às operadoras, que busca eficiência, economicidade e qualidade dos prestadores de serviços

Redação

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