O atendimento em hospitais ou clínicas, na maioria das vezes, engloba mais de um médico ou especialidade e passa por várias áreas dentro da instituição. A centralização dos dados do paciente em um mesmo local facilita os procedimentos médicos, melhora o atendimento e contribui para redução de custos. Isso sem falar no aumento da segurança das informações ali registradas.
O Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP) é um sistema de prontuário médico padronizado e digital. Ele é um meio virtual (seja em dispositivos web ou desktop), com o objetivo de perpetuar todas as informações de saúde, clínicas e administrativas, ao longo da vida de um indivíduo. O PEP surgiu em decorrência da necessidade de se controlar melhor a enorme quantidade de dados do paciente e procedimentos associados. Desenvolvida nos EUA, a ferramenta chegou ao Brasil há aproximadamente 16 anos, mas ainda é bastante incipiente.
De acordo com um estudo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), até 2012, apenas 1% dos hospitais brasileiros possuíam um sistema que integrasse plenamente todas as informações produzidas por seus diversos setores – ambulatorial, emergência, financeiro, entre outros. No entanto, nos últimos anos, a adoção da solução vem sendo impulsionada pela transformação digital e a busca do setor por uma operação paperless e mais eficiente.
Isso porque o prontuário eletrônico substitui o uso do registro de informações em papel e, assim como seu antecessor, armazena todas as informações clínicas e assistenciais do paciente – peso, altura, sintomas, histórico médico, medicações aplicadas em cada passagem pela instituição – independentemente dele se consultar com apenas um médico ou ficar internado. Além disso, permite à instituição organizar e acompanhar o fluxo do paciente, seja na internação ou no ambulatório, ao centralizar todas as informações – prescrição, dispensação de medicamentos na farmácia, aplicação deles pela enfermagem, rotinas do centro cirúrgico e, até mesmo, solicitação de autorizações ao convênio.
Desta forma, fica claro que o uso da ferramenta simplifica a operação de um hospital e alavanca a otimização de recursos, ao consolidar todos os dados em um só local e permitir a inserção e visualização das informações por meio de tablets e dispositivos móveis, evitando assim, exames duplicados e consultas repetidas. Além disso, a adoção do prontuário eletrônico aumenta a confiabilidade dos processos e dados e garante a segurança do paciente durante todo o atendimento, pois utiliza protocolos clínicos e assistenciais baseados nas melhores práticas do mercado. Esses padrões também tornam mais simples o processo de decisão de todos os profissionais envolvidos no atendimento à um doente.
Porém, embora as informações ali armazenadas sejam do paciente, ele acaba tendo um prontuário em cada clínica ou hospital que frequenta, pois não há uma padronização entre os sistemas disponíveis que permita o compartilhamento de dados, uma vez que esses documentos são personalizados para cada instituição. Cenário que deve mudar nos próximos anos com o apoio do Ministério da Saúde. A instituição pretende implementar a ferramenta em todas as Unidades Básicas de Saúde (UBS) do País até o fim deste ano.
Essa meta tem estimulado um debate em torno da padronização do registro das informações de saúde e de mecanismos rígidos de proteção, acesso e compartilhamento dos dados dos pacientes entre agentes do setor – médicos, hospitais, laboratórios, operadoras de planos de saúde. Essa discussão é fundamental, pois só com a integração total teremos um sistema de saúde, privado e público, mais eficiente.
No entanto, a padronização não é a única barreira a ser superada para que haja uma adoção em larga escala da ferramenta. A resistência apresentada pelos profissionais mais antigos às mudanças causadas pelas novas tecnologias em qualquer projeto de digitalização também é um grande desafio. As instituições que desejam encará-lo de forma a se tornarem cada vez mais paperless precisam investir em um processo de aculturamento do seu quadro de funcionários. De qualquer forma, a chegada de uma nova geração, que já vêm com um viés digital da própria formação, também deve contribuir para aceleração desse processo.
Todo esse investimento tem um retorno bastante expressivo. Uma pesquisa da IESS, realizada com médicos nos EUA – país que utiliza a essa tecnologia há mais de três décadas – comprovou que o prontuário eletrônico contribui para um melhor atendimento ao paciente em cerca de 80% dos casos. Além disso, 65% dos participantes informou que o sistema alertou para potenciais erros de medicação e 37% apontaram uma redução de pedidos de exames desnecessários. A diminuição no volume de exames implica não só em menores custos para os hospitais, mas também para os planos de saúde, o SUS e, até mesmo, para os pacientes.
Ainda em relação à redução de custos e ao aumento da eficiência do setor, a tecnologia também pode ser usada para fins epidemiológicos e estatísticos. Com base nos dados armazenados no prontuário eletrônico, é possível identificar quantos pacientes dentro de uma determinada faixa etária são propensos a terem problemas cardiovasculares, por exemplo. Desta forma, será possível melhorar a prevenção de doenças e realizar campanhas direcionadas a um público específico.
Isso só deve acontecer daqui alguns anos, pois o setor de saúde brasileiro ainda é muito analógico. O envolvimento do Governo Federal na discussão e adoção do prontuário eletrônico deve impulsionar o uso da tecnologia nos hospitais e clínicas. Principalmente se considerarmos que as instituições não precisam fazer um alto investimento em infraestrutura para suportá-la – basta uma rede de internet.
É claro que esse movimento começou, e será alavancado, pelos grandes hospitais. A maioria deles inclusive já conta com o PEP e vem obtendo ganhos expressivos. Mas, os consultórios e clínicas também devem implementar a tecnologia em breve, uma vez que a digitalização – e a adoção do prontuário eletrônico – são um caminho sem volta.
Rogério Pires é diretor do segmento de Healthcare da TOTVS