Recém-nascidos de mães com diagnóstico positivo para Covid-19 não apresentam alterações oculares significativas, como infecções congênitas ou outros transtornos, que possam resultar em problemas de visão. Essa é a conclusão do estudo conduzido por um grupo de oftalmologistas brasileiros. Os resultados da pesquisa, que foram publicados no periódico internacional JAMA Ophthalmology, um dos mais conceituados do mundo para esta especialidade, ajuda a esclarecer dúvidas sobre a associação entre o Coronavírus SARS-CoV-2 e anormalidades em bebês com poucos dias de vida.
Os resultados trazem uma sinalização importante para pais e especialistas que têm interesse especial na saúde das crianças. “O nosso objetivo foi observar se a infecção pelo Coronavírus, em qualquer etapa da gestação, poderia comprometer os olhos dos recém-nascidos de alguma forma, como vemos ocorrer com outros vírus, como o citomegalovírus, o zika vírus, e em outras infeções, como a toxoplasmose”, explica a coordenadora do projeto, Nilva Simeren Bueno de Moraes.
Avaliação – O trabalho levou em consideração dados coletados de 165 recém-nascidos, com idades entre 1 a 18 dias. No caso, as mães testaram positivo para Covid-19 quando estavam entre a primeira e a 40ª semana de gestação. Foram excluídas da avaliação crianças que já apresentavam qualquer evidência de outra infecção congênita. Concluiu-se, a partir dessas análises, que houve baixa taxa de infecção entre os bebês e que nenhum apresentou alterações oculares. Contudo, ressalvam os pesquisadores, novos estudos controlados adicionais podem ser necessários para confirmar esses resultados.
“A partir de um número considerável de recém-nascidos examinados, pudemos mostrar que não encontramos lesões oculares nos bebês. Isso é muito importante tanto para as mães e bebês, quanto para a comunidade oftalmológica. Pretendemos, entretanto, continuar examinando as gestantes e os bebês, o que já está sendo feito, inclusive em trabalho conjunto com a infectologia”, informa a coordenadora da pesquisa, realizada no âmbito da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e que conta com o apoio institucional do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO).
Compromisso – Para o presidente do CBO, José Beniz Neto, o trabalho sinaliza o compromisso dos médicos oftalmologistas com o avanço da ciência no Brasil e no mundo. “Ficamos muito felizes em ver pesquisas desse porte, desenvolvidos com tamanho rigor e critérios. No momento de tantas incertezas, diante de uma pandemia causada por um vírus que aos poucos vai sendo destrinchado, a oftalmologia oferece sua contribuição relevante para que linhas de cuidados sejam devidamente estabelecidas”, disse.
O artigo intitulado ‘Ocular Assessments of a Series of Newborns Gestationally Exposed to Maternal Covid-19 Infection‘ (em tradução livre, ‘Avaliações oculares de recém-nascidos expostos durante a gestação à infecção materna por Covid-19’) foi produzido por um grupo de oftalmologistas brasileiros especializados em retina e vítreo. Além da professora Nilva, contribuíram com a pesquisa os médicos Olívia Pereira Kiappe, Natasha Ferreira Santos da Cruz, Paulo Alberto Cervi Rosa e Luciana Arrais.
Eles foram os responsáveis por examinar e coletar os dados junto a uma amostra de recém-nascidos acolhidos em berçários públicos e privados. Na avaliação, os especialistas buscaram sinais e sintomas de diferentes doenças oculares, como retinopatia da prematuridade, infecções congênitas e alterações no reflexo vermelho, entre outras, em neonatos cujas mães foram diagnosticadas com a Covid-19. Esta fase da pesquisa transcorreu de abril a novembro de 2020, em visitas a três maternidades de São Paulo (SP).
Reconhecimento – “A publicação desse artigo significa a coroação dos esforços desse grupo de especialistas que se dedicaram à realização do trabalho num cenário adverso de pandemia. Trata-se do reconhecimento internacional que coloca o Brasil em posição de destaque na análise sobre esse tema e na pesquisa em oftalmologia. Isso é um estímulo para a realização de investigações científicas de nível internacional no nosso País”, avalia a professora Nilva.
Em meio à pandemia do novo Coronavírus, o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) salienta a importância de a comunidade médica permanecer atenta a possíveis manifestações oftalmológicas relacionadas à doença. “Certamente, outros trabalhos do mesmo calibre serão realizados. A equipe coordenada pela professora Nilva tem grande capacidade e é referência para a pesquisa médica científica no país. Esses esforços são relevantes nesse momento, mostrando que a preocupação com a saúde dos olhos vai além do atendimento ambulatorial”, finalizou Pedro Carricondo, diretor-Tesoureiro do CBO.