Da incubadora ao berço: a história de amor de mãe e bebê prematura na UTI Neonatal

Entre as variadas siglas que um casal à espera de um bebê passa a ter conhecimento e escutar com frequência, existe uma que retrata o momento mais aguardado da gestação: a Data Prevista de Parto (DPP). Trata-se de uma previsão calculada tendo como expectativa o nascimento da criança ao completar 40 semanas. E, apesar da ansiedade para pegar o filho nos braços, ninguém deseja que ele chegue antes do tempo necessário para o seu desenvolvimento completo dentro do útero.

Na vida da publicitária Andreia Aparecida Reis, de 42 anos, a DPP era sinônimo do dia 24 de outubro de 2018. No entanto, o que já era uma gravidez inesperada trouxe consigo uma nova surpresa: a pequena mato-grossense Ana Beatriz teve que antecipar sua chegada ao mundo e permanecer apenas 31 semanas no útero da mãe. Em pouco tempo, Andreia e o marido Benedito Alves Ferraz Jr. embarcaram em uma montanha russa de emoções – passando da alegria mais transbordante até o abismo mais inquietante.

“Minha gravidez foi de susto. Uma crise de enxaqueca me levou ao Pronto Atendimento (P.A.) no meu aniversário e, lá, descobri que estava de oito semanas. A gestação em si foi tranquila até que, quando comecei a entrar no terceiro trimestre, uma leve dor de cabeça me fez ligar o sinal de alerta. Por desencargo, aferi minha pressão – que sempre foi baixa – e ela estava alta. Decidi ir ao P.A. do Hospital Santa Rosa para tomar um remédio para regulá-la, mas não funcionou. Ali, começou minha maratona de hospital”, comenta.

MARATONA HOSPITALAR – Com a pressão em 17 por 11 detectada na triagem, Andreia deu início à uma série de exames – entre eles, a ultrassonografia. “Fui internada em regime de urgência para não correr riscos com a minha vida e a da bebê. Estava com um quadro de pré-eclâmpsia com início de derrame placentário. Eu não entendia o que era isso e por qual motivo não tinha sintomas. Mas, tinha percebido que minha barriga e a bebê tinham parado de crescer”, lembra.

“Tivemos que internar a Andreia, pois a pressão estava descontrolada. Por conta desse quadro, tínhamos a perspectiva de que o bebê iria nascer antes do tempo ideal”, explica a pediatra neonatologista Paula Gattass Bumlai, gestora médica da UTI Neonatal do Hospital Santa Rosa.

Foram 30 dias de hospital entre repouso absoluto, maratonas de exames e aplicações de injeções de corticoide para amadurecer o pulmão de Ana Beatriz. Até que, no dia 28 de agosto, o coraçãozinho da pequena emitiu um alerta: a bebê estava entrando em sofrimento fetal. “Percebi que o semblante da médica mudou com o exame. Fiquei apreensiva. Ela ia nascer. Depois, recebi a notícia de que estavam aguardando uma vaga na UTI Adulta para realizarem o parto. Por conta da pressão alta, havia risco para mim”, recorda Andreia.

A publicitária logo mobilizou o marido para que durante o parto permanecesse atento à bebê, pois a orientação era de que ela iria nascer e seguir direto para a UTI Neonatal. “Alertaram que a Ana Beatriz poderia nem passaria por mim, nem choraria – poderia ter que ir direto para a incubadora para ser intubada por conta da prematuridade. No entanto, ao contrário do que se esperava, ela chorou. Bastante e alto. Eles a trouxeram para me ver. Ela conseguia respirar sozinha. Foi um sonho”, enfatiza.

GALÁXIA UTI – Entrar pela primeira vez nessa galáxia desconhecida para os pais que é a UTI Neonatal se tornou o próximo desafio. “Quando você trabalha a gravidez na sua cabeça, imagina que seu bebê irá nascer igual na fotografia do pacote de fraldas. Certo? Mas, ao chegar lá e me mostrarem ela, era a menor. Toda ‘transparente’, com as veias aparentes, os dedinhos extremamente finos e os pés magrinhos – só pele e osso. Ao respirar, dava pra ver a costela. Tinha 900 gramas e 32, 5 centímetros – quando o normal seria 2.500 gramas e 50 centímetros”, conta com a imagem gravada na memória.

Logo, a incubadora se converteu numa extensão do útero materno. “E há todo um processo de conscientização. De receber as notícias: as primeiras 24 horas, depois as primeiras 48 horas e os primeiros sete dias. É uma fragilidade sem fim. Máquinas apitando aos montes, sondas, tubos, medicações sendo aplicadas e gramas evoluindo e regredindo. Você passa a agradecer por cada dia. Por cada conquista. Ouvir que não houve ‘intercorrência’ ou piora se torna incrível”, ressalta.

Ao longo dessa experiência assistida por médicos e enfermeiros, Andreia comenta que assumiu o papel de super-heroína pelas duas. “Uma das piores coisas que te perguntam nesse período é: ‘quando você vai levar seu bebê para casa?’. Não há previsão até que aconteça. É preciso ter fé. Confiar nos profissionais e em Deus. Se fosse pra chorar, que fosse do lado de fora da UTI. Ali, precisava ser forte por ela. Levar toda a alegria do mundo. Falar para ela lutar por nós”, pondera.

A publicitária, sem hesitar, sabe listar em ordem cronológica todos os procedimentos realizados nesse percurso. “Para deixar o clima mais leve falava que, se o parto dela estava previsto para acontecer em 24 de outubro, daria dois dias de tolerância. E não é que a Ana Beatriz, mesmo com contratempos, foi ganhando peso e evoluindo. Com 30 dias na UTI, as enfermeiras me surpreenderam: além dela estar sem o tubo de oxigênio na incubadora decorada para o ‘mêsversário’ (algo que já representava puro carinho e cuidado), eu a pegaria no colo pela primeira vez. Foi a maior emoção do mundo. Ao completar dois meses exatos, no dia 28 de outubro, ela teve alta – quase como ‘determinei’”, conta.
  
ESCOLA DA MATERNIDADE – Durante o período de internação, Andreia ressalta que entrou num microcosmo particular de aprendizado. “Com toda a paciência, médicas e enfermeiras, bem como tantas outras profissionais, te orientam a pegar o bebê no colo, a ordenhar o seio de forma correta para tirar o leite, amamentar certinho, trocar fralda, limpar, fazer a higienização do bebê, dar banho corretamente, desobstruir a narina e por aí vai. É uma escola. Você sai de lá apta a cuidar do seu filho com mais tranquilidade. Entre as mães de UTI, também se cria uma corrente do bem. Uma auxilia e acalma a outra”, enfatiza.

“Apesar da UTI Neonatal ter seu lado ‘assustador’ (curativo), ela também tem seu lado positivo. Além da fase de amadurecimento que as mães passam, elas encaram dias de treinamento para aprender a lidar com esses prematuros. Um preparo que é intenso depois da fase crítica. A equipe de profissionais oferece todo o suporte pré-alta para que as famílias saiam da UTI confiantes – com a maior segurança possível”, reforça a pediatra neonatologista Paula Gattass Bumlai.

“Só tenho a agradecer. Toda a equipe do hospital foi importante nessa jornada – sempre com um sorriso no rosto e uma palavra de carinho. Quando você passa pela UTI Neonatal, nasce uma outra mãe. Você desacelera. Não tem pressa para levar seu filho embora para casa, o que quer é levá-lo saudável. Em casa, você nem liga de acordar de noite, só agradece. A Ana Beatriz veio para me ‘serenizar’ e aprender a ver tudo de forma diferente. Minha maior reflexão”, finaliza Andreia com os olhos brilhando de emoção.

PREMATURIDADE – A vitória de Ana Beatriz representa uma evolução importante no cuidado com prematuros em todo o mundo. Na década de 1990, apenas 60% dos bebês nascidos antes de completar 37 semanas de gestação conseguiam sobreviver. Hoje, esse número já alcança 95%, segundo a pesquisa Born Too Soon da Organização Mundial da Saúde (OMS) com base em dados de 184 países.

“Precisamos falar sobre prematuridade durante todo o ano. No Brasil, aproximadamente 10% dos bebês nascem antes do tempo (com menos de 37 semanas de gestação), segundo dados do Ministério da Saúde. Ou seja, um a cada 10. Apesar dos cuidados com prematuros terem evoluído muito, é preciso que ocorra uma conscientização e a busca pela prevenção desse quadro”, ressalta a pediatra neonatologista Paula Gattass Bumlai.

A médica complementa que “quanto maior ou menor a idade da mãe, os extremos de idade materno, maiores as chances de prematuridade. Gestações gemelares também apresentam uma pré-disposição. Infecções durante a gravidez, problemas ginecológicos, alterações no organismo são outros fatores. Mas, a maioria pode ser prevenido com acompanhamento médico. Por isso, a importância em fazer um pré-natal desde o início, estar bem informada e com as vacinas em dia – seguindo sempre as recomendações médicas”, pontua Paula Gattass Bumlai.

ACREDITAÇÃO – Ao completar 20 anos, o Santa Rosa, em Cuiabá, é o único hospital de Mato Grosso certificado pela Acreditação Canadense, nível Diamond – uma das principais certificações de qualidade em saúde no mundo. A instituição também é certificada em Excelência, Nível III, pela Organização Nacional de Acreditação (ONA) e em Nível 6 da EMR Adoption Model (EMRAM) pela Healthcare Information and Management Systems Society (HIMSS) Analytics.

Redação

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