Um dia após o Brasil bater a triste marca de 300 mil mortos por Covid-19, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) reuniu profissionais de saúde que estão na linha de frente para contarem suas experiências. A roda de conversa foi transmitida ao vivo e faz parte das atividades de lançamento do fotolivro “Por trás das máscaras“, material que busca mostrar a humanidade, o cotidiano e a coragem dos profissionais que atuam na resposta à pandemia no Brasil.
Histórias como a da enfermeira Érica Souza Guimarães, de Duque de Caxias (RJ). Sempre muito próxima da sua comunidade, ela sentiu que todo equipamento de proteção individual, essencial para sua segurança no trabalho, tirou sua individualidade. “Poucas pessoas realmente perguntam como estamos nos sentindo. Agora as pessoas podem ver que não sou somente uma enfermeira, eu sou a Érica”, conta, sobre a experiência de ter sido fotografada.
A médica Roma Nápoli, que também atuou em Duque de Caxias, teve Covid-19 e chegou a ser internada no hospital onde trabalhava. “Como paciente, posso afirmar que vivi momentos muito angustiantes e de muito medo também”, compartilhou. “O profissional de saúde que já foi contaminado pelo Coronavírus entende muito mais a situação do paciente. A minha conduta com os pacientes com Coronavírus é muito diferente hoje em dia”, relata.
“Quisemos retratar e homenagear os profissionais da linha de frente que têm vivido tantos desafios, dificuldades e falta de compreensão do seu trabalho, tão essencial, salvando vidas”, explica a coordenadora de Comunicação do CICV, Sandra Lefcovich, organizadora do fotolivro. “E é muito bom ouvir deles nessa roda de conversa o quanto esse reconhecimento é importante para eles, o quanto faz bem, pois eles têm sido aplaudidos, mas também atacados. A agente comunitária Elisabeth Dutra afirmou: “Tem muito a agradecer por fazer parte desse livro”.
A iniciativa do fotolivro “Por trás das máscaras” faz parte da campanha Valorize o Essencial, que incentiva o reconhecimento e o respeito aos profissionais de serviços de saúde, educação e assistência social.
“Além de lançar o livro, poder trazer os profissionais para trocarem experiência e dialogar diretamente com o público, que mandava perguntas ao vivo, foi muito enriquecedor”, comenta a responsável pelo programa Acesso Mais Seguro do CICV, Lívia Schunk. “Estamos em uma fase da pandemia onde os números são alarmantes, mas é importante sempre trazer o aspecto humano que está atrás das estatísticas. E foi isso que buscamos fazer com as rodas de conversa”, conclui.
“A gente percebia que no inicio da pandemia ninguém queria pegar o elevador com a gente”, afirmou Sâmia Ribeiro, que trabalha em Fortaleza, em referência a quando voltava para casa, complementando que também entendia a dificuldade das pessoas: “como você ovaciona e depois agride?”.
No último dia 16, o CICV havia reunido os fotógrafos que produziram as imagens de “Por trás das máscaras”, retratando a realidade em Duque de Caxias (RJ), Fortaleza (CE) e São Paulo (SP). Na ocasião, os fotógrafos Márcia Folleto, Camila de Almeida e Tiago Queiroz contaram como isso foi transformar aquela realidade que estavam testemunhando em imagens que sensibilizasse o público.
“Das coberturas fotográficas que eu fiz durante a pandemia, este é um trabalho de grande importância para a gente, porque mostra para as outras pessoas aquele trabalho que não é tão visível”, disse Folleto na roda de conversa de lançamento do fotolivro. “Daí a importância desse livro, mostrando o rosto das pessoas que estão salvando vidas.”
Ao ser questionada sobre como equilibrar técnica e emoção em uma cobertura de pandemia, Camila de Almeida sintetizou: “Eu posso até fazer uma foto sem técnica, mas não farei sem emoção.”
Em sua experiência fotografando no Instituto Emílio Ribas e no Hospital de Campanha do Anhembi, Tiago Queiroz falou sobre o retrato que mais lhe marcou: da fisioterapeuta Uilsa Gonçalves. “Fiz um retrato bem focado na expressão dela, no rosto dela, com máscara e tudo embaçado. Eu acho que mostrava muito a situação limite que ela estava vivendo naquele momento. É uma foto que quando eu olho de novo, me vem à mente tudo o que eu vi naquele dia.”
Na avaliação de Lefcovich, “em um momento em que o jornalismo é colocado em questão, pensamos que é importante trazer a público a fala desses fotógrafos que vivenciam o cotidiano da cobertura da pandemia e que estão fazendo um trabalho de extrema relevância, ao mostrar o trabalho dos profissionais de saúde, a dor das famílias, o que acontece com os que adoecem.”
“Eles foram para hospitais, unidades de saúde, foram para a ala vermelha, correndo riscos também, para trazer essas histórias, a informação ao público. Isso tem que ser reconhecido, respeitado e valorizado, e foi essa nossa intenção na primeira roda de conversa”, destacou a organizadora do fotolivro.