Os índices de depressão e de ansiedade, que já cresciam e preocupavam autoridades do Brasil e no mundo em geral, ano após ano, têm aumentado ainda mais em consequência das incertezas e dificuldades trazidas pela pandemia de Covid-19. Há quem diga, inclusive, que lidamos atualmente com duas pandemias, a de Covid-19 e a dos distúrbios mentais. Nesse sentido, dois estudos realizados pelos Departamentos de Fisiologia, Psicobiologia e Ginecologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp), trouxeram informações relevantes acerca da relação entre os distúrbios do humor e os hormônios do apetite, principalmente em mulheres na pós-menopausa.
“Apesar da depressão e da ansiedade serem patologias conhecidas e muito estudadas, pela sua complexidade e íntima relação com nosso sistema nervoso central as causas destes distúrbios mentais ainda não são completamente entendidas, o que pode dificultar o tratamento correto. Em dois estudos, pudemos observar, por exemplo, que além do excesso de peso, a grelina, que é o hormônio da fome, e a leptina, hormônio da saciedade, estão intimamente relacionados com a depressão e ansiedade, em mulheres na pós-menopausa”, explica Maria Fernanda Naufel, pós-doutoranda em nutrição pela Unifesp e uma das responsáveis pelos estudos. Os artigos foram publicados nas revistas Scientific Reports e Menopause .
No estudo veiculado no periódico Menopause Journal, foram incluídos tanto mulheres na pré-menopausa, com idade entre 40 e 50 anos e que representaram o grupo controle, quanto mulheres na pós-menopausa, entre 50 e 65 anos. Já no estudo publicado no periódico Scientific Reports, foram incluídos somente mulheres na pós-menopausa, com idade entre 50 e 65 anos, que apresentavam algum grau de depressão, excluindo, portanto, aquelas não deprimidas.
Em ambos os estudos foram analisadas medidas antropométricas por meio de bioimpedância avançada. Sintomas de depressão e ansiedade foram avaliados por questionários. Também foram dosados inúmeros parâmetros bioquímicos e hormonais por meio de amostras de sangue e saliva, além de parâmetros clínicos.
“Entre os principais resultados, constatamos que, além da obesidade total, obesidade abdominal, avançar da idade e resistência à insulina influenciarem de forma expressiva em quadros de depressão e ansiedade, observamos que a leptina e a grelina são fortes preditores independentes, que se associaram positivamente e respectivamente com a ansiedade e depressão, na população estudada. Ou seja, averiguamos que quanto maiores os índices de leptina maiores os sintomas de ansiedade e quanto maiores os níveis de grelina acilada (antes chamada de grelina ativa) maiores os sintomas de depressão, em mulheres na pós-menopausa”, destaca Maria Fernanda.
De acordo com a pesquisadora, “estudos já haviam encontrado receptores de grelina e leptina em zonas do cérebro responsáveis pela regulação do humor, e por meio de nossos estudos foi possível observar uma estreita associação entre estes hormônios do apetite e distúrbios mentais.”
Apesar de constatar a relação dos hormônios da fome e saciedade com a depressão e a ansiedade, Maria Fernanda ressalta que ainda não é possível concluir se estes efeitos são positivos ou negativos para o humor. “Essa associação pode refletir tanto uma resposta fisiológica do corpo tentando lutar contra a depressão e ansiedade – neste caso, os hormônios estariam atuando como antidepressivos ou ansiolíticos -, quanto podem ser um fator causal destas patologias. Estudos experimentais levam a crer que estes hormônios auxiliam na melhora dos distúrbios de humor, contudo, mais estudos em humanos são necessários para se chegar a uma conclusão.”
Outros resultados constatados nos estudos incluem o fato de mulheres na pós-menopausa apresentarem maiores índices de depressão, ansiedade, obesidade total e obesidade abdominal, quando comparadas às mulheres na pré-menopausa. “Assim, é de suma importância monitorar o ganho de peso e alterações de humor em mulheres na pós-menopausa, para um diagnóstico e tratamento precoce, preservando com isso a qualidade de vida”, conclui a pesquisadora da Unifesp.