Estudo sobre técnicas de dermatologia para feminilização em pacientes transgêneros é destaque em revista científica internacional

Crédito: Edu Euka

Um estudo pioneiro com indivíduos transgêneros coordenado pela dermatologista brasileira Bianca Viscomi foi publicado pela Clinical, Cosmetic and Investigational Dermatology – revista médica internacional de grande prestígio na área. Com o apoio da Merz Aesthetics, uma das maiores empresas farmacêuticas do mundo, a pesquisa “From anatomical modifications to skin quality: case series of Botulinum Toxin and facial fillers for facial feminization in transgender woman” (em tradução livre: “De modificações anatômicas à qualidade da pele: casos de Toxina Botulínica e preenchedores faciais para feminilização facial em mulheres transgêneros”), busca não apenas contribuir com a literatura científica sobre um assunto ainda pouco abordado, como também favorecer a inclusão social e a qualidade de vida deste grupo de pacientes.

O termo transgênero refere-se a uma pessoa cujo sexo atribuído ao nascimento não corresponde à sua identidade de gênero, ou seja, ao senso psicológico de seu gênero. A disforia de gênero é um fenômeno psicológico comum em indivíduos trans, e resulta da incongruência entre o sexo atribuído ao nascimento e a identidade de gênero. No caso de mulheres trans: “a paciente se identifica e se sente como uma mulher, mas não é o que ela vê ao se olhar no espelho”, resume Bianca Viscomi, dermatologista, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, e precursora de estudos e pesquisas sobre intervenções dermatológicas minimamente invasivas em pessoas trans no Brasil.

Trata-se de uma abordagem inovadora e inclusiva, para tratar questões estéticas em pacientes trans, promover melhora da disforia de gênero e resgatar a autoestima.

Tudo começou em 2019, quando um paciente que já frequentava sua clínica há cinco anos perguntou se seria possível deixar seu rosto com feições mais andróginas, já que tinha o hábito de usar roupas femininas em determinadas situações e não estava confortável com sua aparência. “Estudei profundamente o caso e fiz uma combinação de procedimentos que teve um resultado notável, não apenas sob o ponto de vista clínico como também pelo lado psicológico. O paciente encontrou a imagem que gostaria de ter e pude verificar como o tratamento lhe deu a liberdade de explorar novos caminhos e encontrar a sua identidade”, conta a Dra. Bianca.

A satisfação de poder usar a medicina em benefício de uma minoria marginalizada fez com que a Dra. Bianca se aprofundasse no tema. “O Brasil é o país que mais mata indivíduos trans no mundo e, dentro desta comunidade, os que mais sofrem são as mulheres trans. Sua expectativa de vida é de apenas 35 anos, metade da população em geral. Este índice se deve à violência e também às taxas de suicídio, devido à depressão e ao sentimento de não-pertencimento”, diz a Dra. Bianca. Segundo dados levantados pela ONG Transgender Europe (TGEU), entre outubro de 2020 e setembro de 2021, a cada 10 assassinatos de pessoas trans no mundo, quatro ocorreram no Brasil.

Ainda em 2019, a médica começou um trabalho voluntário em seu consultório particular, oferecendo tratamento a duas mulheres trans. “Os resultados foram tão transformadores que percebi que precisava expandir esta atividade, não só para poder atender mais pacientes, como também transformar este estudo em uma publicação científica que pudesse ajudar e incentivar outros médicos”, complementa.

O projeto conduzido por Dra. Bianca, ainda pouco explorado no país, tem foco em procedimentos injetáveis realizados de forma customizada, tanto para feminilizar quanto para masculinizar a face, sendo a toxina botulínica, ácido hialurônico, bioestimuladores de colágeno e fios de sustentação os principais. A toxina botulínica é usada para modular os músculos da face, e assim criar traços mais femininos ou mais masculinos de acordo com o desejo de cada paciente. Um exemplo é a feminilização do terço inferior da face através da atrofia de alguns músculos desta região. Também é possível modular a ação dos músculos do terço superior da face e customizar o arqueamento das sobrancelhas. “A sobrancelha masculina tende a ser mais retificada e a feminina, arqueada. Com a toxina botulínica conseguimos mudar esta e outras características da face de forma sutil, trazendo suavidade e adequação ao rosto da paciente trans”, conta.

Ingredientes preenchedores, como o ácido hialurônico, são usados para projetar as maçãs do rosto e deixar a fronte mais arredondada, além de elevar a ponta do nariz e suavizar os sulcos próximos à boca, o que é bastante interessante na transição da face masculina para feminina. Já os bioestimuladores melhoram a qualidade da pele e a densidade do colágeno, garantindo a sustentação para os preenchimentos.

A médica reforça que não se trata de uma ‘harmonização facial’, modalidade que não faz parte da prática em seu consultório: “A harmonização facial pressupõe encaixar-se em um padrão de beleza. Minha abordagem se dá na análise individual da anatomia de cada paciente. Podemos ter traços masculinos que são bonitos e deveriam ser preservados em mulheres trans, por exemplo. Vai da anatomia e do desejo de cada um”, comenta.

Por serem procedimentos que exigem o uso de materiais de alto valor, a parceria com a Merz Aesthetics Global, uma das principais empresas de medicina estética do mundo, foi fundamental para garantir o acesso às pacientes. Para a publicação científica, foram relatados cinco estudos de caso, com descrição completa das técnicas empregadas e recomendações para que outros médicos possam repetir os procedimentos. “Meu maior sonho enquanto profissional é que todos os médicos possam incluir os pacientes trans de forma natural na rotina de trabalho. Que haja uma abordagem médica mais respeitosa, da mesma forma que atendem homens e mulheres cis (que se identificam com o gênero de nascença), finaliza.

Redação

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