Hemofilia: Tratamento domiciliar reduz em 73% os dias perdidos de trabalho ou estudo

No fim da década de 80, a hemofilia se tornou mais conhecida por meio do cartunista Henfil, que contraiu o vírus HIV em uma das transfusões de sangue que precisava fazer frequentemente por causa da hemofilia, assim como seus irmãos o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, e o músico Chico Mário. Henfil registrou a hemofilia em muitas das suas tirinhas, contribuindo para a divulgação da coagulopatia.

Considerada rara e desconhecida pela maioria dos médicos, a hemofilia, muitas vezes, pode não ser cogitada em um diagnóstico, que resulta em atraso do tratamento e subdiagnóstico, afetando de forma significativa a qualidade de vida do paciente até o início do tratamento preventivo (profilaxia).

A Hemofilia é um distúrbio que causa hemorragia mesmo em pequenos traumas. É genética, hereditária e se constitui por uma falha na coagulação do sangue. A maioria dos pacientes é do sexo masculino, sendo a mãe a portadora. Existem dois tipos de hemofilia, a A e a B, sendo a primeira responsável por 80% dos casos no mundo, cerca de 300 mil. No Brasil, são quase 13 mil pessoas com a coagulopatia, ocupando o 4º lugar na lista com a maior população de pacientes com coagulopatias hereditárias do mundo, segundo dados da Federação Mundial de Hemofilia.

Sinais e Sintomas – A hemofilia pode levar a sangramento sem controle, que pode ser causado por um pequeno trauma, ferida ou até mesmo espontaneamente. Entre os sintomas, estão inchaço, dor e calor e pode aparecer vermelhidão ou manchas roxas na pele. Se ocorrer em músculo ou articulação de um membro, há enrijecimento local e redução da mobilidade. Em geral, as pessoas com hemofilia sentem formigamento, redução da sensibilidade, da mobilidade e um aquecimento interno.

Geralmente, a hemorragia acontece nas articulações que, sem o tratamento adequado, pode levar o paciente a desenvolver alterações articulares graves, o que compromete sua locomoção ao ponto de deixá-lo incapacitado.

Tratamento – Com um trabalho inédito junto ao Governo Federal, a Federação Brasileira de Hemofilia, considerada a quarta maior do mundo, conquistou avanços para o tratamento da hemofilia pelo Sistema Único de Saúde (SUS). São dois tipos de tratamento:

Profilático ou preventivo – caracterizado por infusões endovenosas para não ocorrer sangramentos. Ou seja, a medicação repõe o fator de coagulação que falta no sangue do paciente. Desta forma, ocorre a diminuição dos episódios de sangramento, redução das sequelas, menos faltas à escola ou ao trabalho, maior liberdade para as atividades rotineiras e de lazer e, com isso, melhor qualidade de vida.

Por Demanda – quando o paciente teve um trauma ou sangramento espontâneo ele recebe a reposição de fator coagulante.

Tratamento Domiciliar – o paciente ou a família/cuidador do paciente recebe um treinamento do hemocentro para realizar a autoaplicação/infusão em casa, com autonomia, sem precisar se deslocar até o hemocentro. O tratamento de profilaxia é realizado da seguinte maneira: o paciente retira as doses necessárias no hemocentro para fazer uso em casa, de acordo com a orientação do Ministério da Saúde e realizar o tratamento prescrito pelo médico que o atende. Importante ressaltar que a medicação é dispensada para um mês e deve ser armazenada na geladeira.

Resultados do Tratamento Domiciliar

  • 73% menos dias perdidos de trabalho ou de estudo
  • 74% menos pacientes desempregados
  • 89% de redução de atendimentos em hospitais
  • 83% menos dias passados em hospitais
  • 74% de redução de custos de tratamentos por pacientes/ano

O fornecimento de doses domiciliares reduz o número de visitas aos centros de tratamento e hemocentros, o que, consequentemente, diminui a carga nos serviços de saúde pública, conforme a Federação Mundial de Hemofilia.

“É importante salientar que, quando a dose da profilaxia está adequada, o paciente NÃO DEVE ter hemartroses ou outros sangramentos espontâneos”, ressalta Tania Maria Onzi Pietrobelli, presidente da Federação Brasileira de Hemofilia.

Qualidade de Vida – Com a disponibilidade atual de fatores para o tratamento, é necessário que as pessoas com hemofilia compreendam que a reposição profilática de fator é fundamental para a saúde musculoesquelética. Entretanto, um fator essencial é o reconhecimento precoce de qualquer alteração articular. Com a profilaxia regular, às vezes pode existir uma tendência em não valorizar pequenos sinais que o corpo demonstra em relação à alguma alteração. Com isso, sangramentos menores muitas vezes não são tratados corretamente uma vez que profilaxia pode não atender os cuidados mais intensos de um tratamento específico quando necessário.

“Todo sangramento é importante, não importa se é um sangramento pequeno, médio ou grande. Às vezes pode ser difícil diferenciar e interpretar um quadro de dor crônica de um sangramento pequeno, mas isso é um desafio no mundo todo, você não está sozinho nessa dúvida de interpretação. Por isso, a identificação dos primeiros sinais de sangramento, associado ao repouso articular (sem descarga de peso) levam à menor chance de desenvolvimento e/ou progressão da Artropatia”, explica Janaina Bosso Ricciardi, fisioterapeuta e membro do Comitê de Assessoramento Técnico da FBH.

Outro fator notável para a melhora do acesso ao tratamento, segundo Janaina, é a prática regular de exercícios que pode transformar a qualidade de vida. “Essa rotina de atividade física traz benefícios a curto e longo prazo, uma vez que fortalece a musculatura e atua protegendo as articulações. Isso é um ciclo virtuoso, onde tudo aos poucos melhora”, explica Janaina.

O acompanhamento desse processo deve ser realizado por profissionais habilitados, com planos personalizados para cada estilo de vida. A musculação é indicada para que os músculos atuem como protagonistas, mesmo quando as articulações já apresentam alguma alteração. Segundo Janaina, músculos preparados e fortes protegem as articulações de forma muito dinâmica pois o condicionamento muscular desempenha papel decisivo nas escolhas de atividades físicas e esportes.

Atividades de impacto (corridas, saltos e outros) devem ser evitadas quanto maior for o comprometimento da articulação (artropatia) pelo impacto articular direto. “Também é recomendado o uso de dose profilática de fator ao praticar alguma atividade”, orienta Tania.

Não existe um esporte ideal na hemofilia, pois além de considerar as características de cada modalidade é preciso levar em consideração o perfil de cada pessoa do ponto de vista de condição articular e da vontade e motivação para realizar a atividade. “Entretanto, de forma geral, alguns exemplos de esportes indicados às pessoas com hemofilia são: musculação, natação, ciclismo, dança, golfe, tênis de mesa, pesca, frescobol. A prática de exercícios, além de condicionamento físico traz outros benefícios, tais como: controle adequado de peso para não sobrecarregar articulações, boa mobilidade, equilíbrio e manutenção da massa óssea, que apresenta uma perda maior com o decorrer da vida”, detalha a fisioterapeuta.

Redação

Redação

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.