A tecnologia está cada dia mais presente em nossa rotina, independentemente da idade ou profissão. Em casa, no trabalho, na escola ou no celular que carregamos no bolso, a internet nos conecta ao mundo de maneira imediata para os mais diversos fins.
Na área da saúde, os recursos tecnológicos não param de avançar. Seja na telemedicina, na cirurgia robótica ou em aplicativos que otimizam o tempo dos profissionais, a tecnologia é, muitas vezes, uma ferramenta que ajuda os médicos a conciliar suas atividades de consultório, hospitais e sala de aula.
No entanto, a utilização inadequada dos meios tecnológicos cresce na mesma proporção que seus benefícios, resultando em danos a ambas as partes e aumentando ainda mais o já crescente número de processos envolvendo a relação médico-paciente.
“O principal ponto no uso da tecnologia, qualquer que seja a área, é que as mensagens têm de ser adequadamente enviadas, recebidas, processadas e, caso necessário, retransmitidas”, avalia o Dr. Claudio Barsanti, médico e advogado, diretor do escritório Barsanti, Vazquez Advogados.
O advogado, atuante em processos jurídicos na área da saúde, observa um dos principais pontos que merecem atenção, especialmente na troca de mensagens: a pressa. Muitas vezes, não dispensar o tempo necessário para raciocinar sobre uma determinada mensagem faz com que a resposta seja dada de maneira impulsiva, muitas vezes equivocada.
“A tecnologia não é prejudicial à medicina, muito pelo contrário. Por meio da telemedicina, por exemplo, centros distantes, que não dispõem de atendimento médico especializado, podem oferecer à população local atendimento remoto com qualidade, por meio da discussão clínica dos casos entre os médicos participantes”, explica.
Não podemos, portanto, nos contrapor a recursos que ofereçam benefícios a tantas pessoas. Mas devemos nos precaver de algumas facetas inadequadas da tecnologia, sempre destacando a importância da boa e adequada relação médico-paciente, mesmo na era digital, e usando estes avanços em favor de todos os envolvidos.
Especial atenção deve ser dada à manutenção da qualidade das imagens durante a transmissão. Muitas vezes, a imagem de um exame é gerada em uma resolução adequada, mas perde qualidade na transmissão ou na recepção. Problemas deste tipo podem induzir o médico ao erro na interpretação de um exame e, consequentemente, a orientação a partir dela poderá ser inadequada. Esta sucessão de erros pode resultar em prejuízos ao tratamento, levando o médico, em uma situação extrema, a responder judicialmente.
Pode ou não pode?
Com todos estes avanços, os profissionais de saúde precisam estar atentos à regulamentação profissional dos respectivos conselhos de classe, bem como à legislação brasileira. No caso dos médicos, a marcação de consultas por meios eletrônicos, como aplicativos, assim como a confirmação de consultas agendadas por meio de torpedos em celulares previamente cadastrados e autorizados é permitida.
“Há no mercado empresas oferecendo serviços para a divulgação de consultórios e clínicas médicas por meio de mala direta. Da forma como está sendo feita, tal prática fere resolução do Conselho Federal de Medicina e traz sérios riscos e potenciais prejuízos aos médicos envolvidos”, alerta o advogado, que é também médico pediatra.
Existe, em países como os Estados Unidos, a oferta de serviços de consultas médicas ou segunda opinião on-line. No Brasil, embora também ocorram, estas modalidades não estão ética e legalmente regulamentadas.
De acordo com o capítulo quinto, artigo 37, do Código de Ética Médica, ‘é vedado ao médico prescrever tratamento ou outros procedimentos sem exame direto do paciente, salvo em casos de urgência ou emergência e impossibilidade comprovada de realizá-lo, devendo, neste caso, fazê-lo imediatamente após cessar o impedimento’.
Isso significa que, eventualmente, é permitido orientar ou alterar alguma conduta estabelecida anteriormente, especialmente quando este mesmo médico já avaliou o paciente e desde que, assim que possível, volte a examiná-lo presencialmente.
“Consultar, diagnosticar e prescrever medicamentos por qualquer meio de comunicação de massa são condutas vedadas e passíveis de processos ético-administrativos, cíveis e criminais. Na relação médico-paciente, a empatia, o olho no olho, não se trocam por uma tela”, explica o especialista.”
Privacidade nas redes sociais
Seja no campo profissional ou pessoal, as redes sociais devem ser utilizadas com moderação. No ambiente hospitalar, em qualquer de seus setores, estes cuidados devem ser redobrados.
Já faz parte do cotidiano compartilhar com a família e os amigos os principais momentos do nosso dia a dia. Mas quando há outras pessoas envolvidas, este hábito pode trazer consequências sérias.
“Muitos médicos e outros profissionais de saúde participam ativamente no Facebook, twitter, whatsapp ou em blogs, postando fotos com pacientes ou em situações clínico-cirúrgicas, como em um parto ou atendendo uma consulta”, revela o Dr. Claudio.
Tanto os profissionais, quanto o paciente e seus familiares devem observar algumas questões importantes e estar cientes de que estas imagens poderão ser utilizadas em um processo, tanto na acusação como na defesa dos envolvidos.
“Já existe vasta jurisprudência confirmando que mensagens eletrônicas são provas judiciais válidas, tendo sido utilizadas para embasar sentenças nas diversas áreas jurídicas e até mesmo em casos relacionados à investigação de paternidade.”
Isso vale para a gravação de conversa ocorrida em uma consulta médica, que poderá ser usada como prova na justiça, mesmo sem o conhecimento do outro.
“Para ser aceita como prova pela justiça, basta que um dos participantes da conversa esteja ciente da gravação, mesmo sem prévia autorização judicial.”
Para finalizar, o Dr. Claudio esclarece que o principal fator que vem levando ao aumento das ações na área da saúde é a deterioração da relação médico-paciente.
“Para reverter esta situação, é preciso retomar a confiança entre o médico e seu paciente, utilizar a tecnologia com consciência e tomar muito cuidado com todas as questões que envolvem esta relação.”