Resistência bacteriana: doença pode levar a 10 milhões de mortes em 2050

As vias aéreas superiores têm como funções de maior importância o aquecimento, umidificação e a filtragem natural do ar que respiramos. Ela é, também, a porta que permite a entrada de vírus e bactérias causadores de diversos tipos de infecções. As infecções virais (que são as mais comuns) são frequentemente tratadas de forma inapropriada com antibióticos.

O excesso do uso indevido desse tipo de medicamento pode causar um mal invisível e silencioso: a resistência bacteriana.

Desde 2017, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica a resistência bacteriana como um dos principais problemas de saúde global no futuro, que se não tratado, poderá levar 10 milhões e pessoas no mundo a óbito em 2050, superando a marca de outras causas muito mais conhecidas.

No intuito de colaborar no combate à resistência bacteriana por meio da conscientização, a Global Respiratory Infection Partnership (GRIP)uma iniciativa que busca defender o uso racional de antibióticos no tratamento de infecções das vias aéreas superiores – convidou um especialista para esclarecer dúvidas sobre o tema.

Dr. Geraldo Druck Sant’anna – ex-presidente da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Fácial (ABORL-CCF) e professor de otorrinolaringologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre – Santa Casa de Porto Alegre, especialista convidado pelo Global Respiratory Infection Partnership (GRIP) – uma iniciativa que busca defender o uso racional de antibióticos no tratamento de infecções das vias aéreas superiores – responde.

Afinal, o que é a resistência bacteriana?

“É quando as bactérias sofrem mudanças e ganham força, até ficarem praticamente resistentes aos antibióticos. O risco é que com o tempo, infecções bacterianas simples se tornam cada vez mais difíceis de ser combatidas, podendo levar a quadros mais graves ou até a morte.

E isso é mais comum e muito mais perigoso do que se imagina. Tomemos como exemplo um paciente que sente dor de garganta. Caberá ao médico analisar e avaliar o quadro clínico para identificar se é uma infecção viral ou bacteriana. Essa análise é feita por algumas etapas, como o histórico do paciente, tempo de sintomas, e aspectos do exame clínico e, eventualmente, laboratorial.

Uma avaliação equivocada ou até a insistência ou resistência de um paciente a determinadas condutas, podem resultar em prescrição de antibióticos desnecessariamente. E, a longo prazo, o uso indiscriminado ou em excesso pode criar a resistência bacteriana.”

E o que pode ser feito para que isso não aconteça?

“Evitar o consumo inadequado e excessivo de antibióticos é o principal passo. Ainda que no Brasil o uso seja controlado com retenção de receita desde 2010, de acordo com determinação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), é comum que pacientes peçam antibióticos ao médico durante a consulta ou o próprio médico, sobretudo quando o único ponto de contato com o paciente seja aquela consulta, acabe prescrevendo o medicamento por um aparente e equivocada precaução de quadro de piora, por não poder acompanhar a evolução do paciente nos dias a seguir.”

É verdade que vírus nas infecções de vias aéreas superiores não devem ser tratados com antibióticos?

“Sim. Em caso de infecções virais, é necessário observar e apenas tratar os sintomas, com remédios para combater a dor e a febre, para que o paciente passe pelo período natural da doença com menos desconforto. Aumentar a ingestão de líquidos, repouso e evitar contato com outras pessoas também colaboram bastante para o tratamento. Mas atenção, só o médico é capaz de avaliar a origem da infecção, se viral ou bacteriana. Se houver dor ou febre há 48h, é fundamental que o médico seja consultado.”

Toda bactéria é ruim?

“Ao tomar o antibiótico de forma desnecessária, acabam morrendo as bactérias “boas” do nosso corpo também, que tem papel importante em vários sistemas corporais como na flora intestinal, pele, boca, vagina, etc.”

A força dos antibióticos…

“Até a descoberta da penicilina, em 1928, era comum pessoas morrerem de infecções consideradas simples, decorrentes de cirurgias e após a realização de partos, porque não tinham medicamentos adequados para prevenir as infecções pós-operatórias.

O surgimento do antibiótico revolucionou a medicina, pois ele foi responsável por uma grande redução da taxa de mortalidade e aumentou a expectativa de vida da população em oito anos.

Porém, as bactérias são muito espertas e as primeiras consideradas muito resistentes foram percebidas dois anos após a descoberta da penicilina. Por isso a preocupação sobre a resistência bacteriana é enorme, latente e considerada uma das ameaças à humanidade.”

O antibiótico vai para todo mundo

“É bom saber que o antibiótico não fica somente em nosso corpo. Os seres humanos eliminam o medicamento pelo suor, fezes e eles podem afetar também a família, os amigos e todo o meio-ambiente. Falamos disso porque esse aumento à resistência bacteriana também pode ser notado na pecuária. O uso de antibióticos em gado é uma prática comum e até necessária para o tratamento de infecções. Mas a eliminação do medicamento, dá-se da mesma maneira: suor, fezes e meio ambiente. Portanto, o uso devido do antibiótico deve ser feito somente quando necessário”.

Antibióticos: o fim de uma era – isso é possível?

“O risco do uso excessivo de antibióticos é que eles podem passar a não ser eficazes, tendo em vista que as bactérias podem ganhar muita força e se tornar resistentes à medicação. Isso significa que infecções simples, que hoje tratamos facilmente, podem se tornar não tratáveis ou até fatais.”

 

Redação

Redação

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.