Telemedicina tem potencial para ampliar acesso a atendimento especializado no Brasil

Hoje o Brasil tem um oncologista clínico a cada 170 pacientes com câncer, uma quantidade adequada, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). O problema está na distribuição dos especialistas no território nacional. Enquanto São Paulo tem mais de mil oncologistas, Roraima, por exemplo, tem apenas cinco.

Em um cenário de déficit orçamentário, o desafio de garantir acesso e qualidade a atendimento médico em regiões remotas é ainda maior. Quando o sistema de atenção primária é bem estruturado, profissionais generalistas são aptos a intervir em fatores de risco para o câncer e a realizar prevenção secundária, solicitando os exames de rastreamento adequados.

A falta desta estrutura adequada atrelada à falta de oncologistas abre espaço para que novas tecnologias possam ser usadas em prol dos pacientes. É o caso da telemedicina. “Muitas vezes não há um oncologista na região do paciente para o qual o clínico geral possa encaminhar e isso gera novos problemas além do diagnóstico: esses pacientes precisam se deslocar para centros maiores, perder dias de trabalho e gastar dinheiro com transporte e hospedagem. Dificuldades que a tecnologia pode nos ajudar a evitar, ao permitir a orientação adequada para o estabelecimento do diagnóstico e mesmo para medidas gerais de cuidados a estes pacientes”, defende Dr. Rafael Kaliks, oncologista da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica.

Hoje já é possível realizar consultas via videoconferência, análise de laudos e acompanhamento de pacientes internados em UTI à distância. Essa assistência médica à distância é chamada de telemedicina. Para o Dr. Kaliks, a sua aplicabilidade imediata é maior no setor público do que no privado, pois a carência de atendimento por especialistas é maior. “A telemedicina pode transformar a vida de pacientes ao possibilitar atendimento especializado onde antes não existia. Por isso, dizemos que ela não é um contraponto à consulta tradicional, mas um recurso adicional para aproximar oncologistas dos pacientes e do corpo clínico local”, explica.

Assim como na medicina tradicional, um tratamento de qualidade à distância exige infraestrutura adequada e profissionais qualificados. A tecnologia, por sua vez, deve agregar no atendimento. Já a regulamentação da atividade, atualmente em discussão, precisa trazer soluções para novos problemas que naturalmente irão surgir, como a validade de receitas emitidas à distância e a segurança de dados dos pacientes.

“A fiscalização deverá ser tão adequada quanto nas outras modalidades de atendimento. Estas dificuldades na regulamentação e na garantia de privacidade não nos deve impedir de encarar o desafio da telemedicina. Devemos pensar constantemente em como oferecer soluções que melhorem a jornada do paciente e ampliem o acesso a tratamentos apropriados, mesmo nas áreas remotas”, finaliza.


 

Telemedicina e sua saúde

A telemedicina entrou definitivamente no mapa da saúde. Hoje em dia, são cada vez mais comuns os procedimentos realizados à distância, com apoio de tecnologias modernas, em hospitais, laboratórios, clínicas e hospitais.

No início de 2019, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou resolução para normatizar a utilização de algumas possibilidades, como teleconsultas, teleinterconsulta, telediagnóstico e telecirurgia no Brasil. Entretanto, em tese para garantir debate mais aprofundado, revogou-a em fevereiro, apontando que nova versão será anunciada ainda este ano.

Pensando em termos de melhoria e segurança para a assistência, a regulamentação do uso da telemedicina no país é mais que urgente. Só para se ter uma ideia, hoje, se uma mulher estiver grávida, em férias, em uma localidade distante, e tiver um problema, como um sangramento, não poderá fazer uma teleconsulta por celular, correndo o risco de perder o bebê e até morrer. Isso porque as consultas por telemedicina ainda são proibidas por uma regulamentação de 2002.

Na Europa, 24 dos 28 países membros também possuem legislação sobre teleconsulta. Destes, 17 permitem a consulta remota de forma plena e apenas 3 com restrições (emergências, áreas com carência de médicos, necessidade de primeira consulta presencial). Alemanha, Eslováquia e Itália estão em fase de normatização da teleconsulta.

De acordo com Eduardo Cordioli, graduado pela Escola Paulista de Medicina da Universidade de São Paulo e gerente de Telemedicina no Hospital Israelita Albert Einstein, no momento em que aumenta a acessibilidade às soluções digitais você rompe a barreira geográfica e consegue melhorar a experiência tanto de médicos como de pacientes.

Existem, também, outras vantagens mesmo fora do campo da saúde. Além de facilitar o acesso, haverá, por exemplo, economia com gastos de tempo/dinheiro em deslocamento, estacionamento, absenteísmo de atividades produtivas.

O atendimento à distância, justamente por ser em um ambiente digital, é extremamente seguro e cresce a largos passos mundo afora. Em 2018, nos Estados Unidos, foram feitas mais de 42 milhões de consultas virtuais. Na Inglaterra, o sistema de saúde britânico coloca à disposição a consulta on-line, com médico para a família. Em Portugal, o atendimento direto ao paciente, sem conhecê-lo antes, é liberado desde 2016. Até no Brasil já há projetos bem-sucedidos. Um deles é o da Prefeitura de São Paulo, com apoio do Hospital Israelita Albert Einstein. Foi iniciado há cerca de dois anos, quando a cidade tinha cerca de 60 mil pacientes na fila da Dermatologia, o que resultava aproximadamente em um ano de espera. “Conseguimos encaminhar rapidamente quem tinha lesão com suspeita de malignidade para biópsia. Por meio de um aplicativo o médico ou enfermeiro do posto de saúde tira fotos das lesões, que são enviadas para um webservice, e nosso dermatologista faz o laudo e retorna, normalmente com orientações simples, já que em 70% das vezes o paciente não precisava se consultar com um dermatologista. Só 3% dos casos precisavam de biópsia. Com isso, acabamos com a fila para avaliação primária de Dermatologia em São Paulo”, comenta Cordioli.

Em termos de saúde da mulher, são inúmeras as possibilidades. Na Mastologia, uma paciente com câncer de mama e que quiser uma segunda opinião, pode consultar um grande centro de referência à distância. Enfim, a Telemedicina humaniza o tratamento. Na Obstetrícia, já se utilizam ferramentas e aconselhamento digital: “Com o aplicativo Canguru, conseguimos orientar mais de 300 mil mulheres por meio de enfermagem obstétrica especializada para tirar dúvidas. Então, por exemplo, quando surgem perguntas como ‘eu posso pintar o cabelo ou não?’ ou ‘eu estou com quantos meses?’, uma enfermeira capacitada e treinada pode orientar a paciente, que recebe uma informação correta e não precisará buscar respostas na internet ou ficar esperando dias e até semanas por uma consulta presencial”, completa o especialista.

Redação

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