A Síndrome da Imunodeficiência Combinada Grave (SCID) é uma condição clínica caracterizada pelo marcante comprometimento da resposta do sistema imunológico. É uma síndrome decorrente de imunodeficiência e potencialmente fatal, sendo as formas de caráter hereditário, podendo ser causadas por mutações gênicas. Como causas possíveis, associam-se defeitos genéticos ligados ao cromossomo X ou a deficiência da enzima ADA – presente em grandes quantidades nos linfócitos, que são células de defesa do corpo. Sendo considerada uma doença grave e rara, ela atinge sobretudo os meninos, mas não exclusivamente, pois há outras causas não ligadas ao cromossomo X, ocorrendo uma vez em cada 75.000 nascidos vivos do sexo masculino, conforme apontam estudos.
Dr. Nelson Tatsui, Diretor-Técnico do Grupo Criogênesis e Hematologista do HC-FMUSP, explica que os bebês portadores dessa síndrome, geralmente aparentam estar saudáveis ao nascer, mas que “com o tempo, podem desenvolver alguns sintomas, como infecções graves, retardo do crescimento pôndero-estatural (curva de crescimento peso x estatura ) e diarreia crônica”, comenta. O especialista ressalta que quando já houveram casos de SCID na família, o diagnóstico pode e deve ser realizado mesmo antes da criança desenvolver qualquer sintoma.
A princípio, a única possibilidade de tratamento viabilizada pela medicina era por meio do transplante alogênico de células-tronco (que possui somente 60% de chances de eficiência), com alta dificuldade para o encontro de um doador totalmente compatível. Caso não conseguissem a doação, os pacientes portadores dessa condição precisavam viver em bolhas livres de germes para manterem-se vivos.
Em 2020, a revista Science divulgou um relatório sobre o sucesso de terapia gênica no tratamento de bebês portadores da SCID no Hospital Necker-Enfants Malades, em Paris. Segundo os pesquisadores responsáveis, três meses após realização do procedimento, eles voltaram para as suas residências, vivendo como qualquer outra criança. Dez meses depois, seus sistemas imunológicos estavam normais.
A terapia gênica utiliza técnicas de DNA recombinante para substituir ou manipular genes com problemas do próprio paciente. Dr. Nelson informa que a correção é realizada diretamente no DNA das células-tronco hematopoéticas, pois essas são as responsáveis pela fabricação do sangue. “As células-tronco serão coletadas, submetidas à edição gênica e reinfundidas no paciente. A vantagem é justamente utilizar as células já presentes no individuo, que são denominadas como autólogas, eliminando problemas relacionados ao transplante alogênico, que provém de doadores compatíveis”, afirma.
CÉLULAS-TRONCO NA PREVENÇÃO À SÍNDROME DA IMUNODEFICIÊNCIA COMBINADA GRAVE
Em 2020, a geriatra Ligia Cristina Pagotto, grávida do seu primeiro filho, procurou a Criogênesis para a coleta do sangue do cordão umbilical, que é rico em células-tronco hematopoiéticas e mesenquimais. A presença de um caso da Síndrome da Imunodeficiência Combinada Grave em seu histórico familiar, mais especificamente em um primo de segundo grau, foi a motivação. “O filho da minha prima foi diagnosticado com essa síndrome e, inclusive, fez o transplante de medula óssea ano passado. Justamente por isso, nós, da família, fomos orientados a realizar a coleta”, informa.
A médica conta que, desde o início da sua gravidez, começou a pesquisar sobre a doença e suas possíveis formas de tratamento. Ao conversar com o doutor Fabrício Antonialli, médico da Criogênesis, em Campinas (SP), acabou optando pela coleta do material como forma preventiva, caso o seu filho fosse diagnosticado como portador da doença.
Segundo Fabrício, o benefício do armazenamento das células-tronco é justamente a possibilidade de uso das células do próprio paciente, mediante à alteração genética em laboratório, no combate a doenças como a SCID. “Hoje em dia, a chance de encontrar um doador compatível para o transplante de medula óssea é de 1 em 100.000, conforme é indicado pelo Ministério da Saúde. Porém, com o avanço da medicina, técnicas como a terapia gênica configuram-se, cada vez mais, como uma forma eficiente de tratamento de patologias graves e consideradas com uma baixa chance de sobrevida, como é o caso da Síndrome da Imunodeficiência Combinada Grave”, destaca.
O médico ainda ressalta que além da importante função das células-tronco hematopoiéticas em recuperar o sistema imunológico, as células mesenquimais presente no sangue de cordão umbilical se caracterizam pela sua capacidade de gerar tecidos como: músculos, ossos, cartilagem e gordura, possibilitando melhorias em quadros de fraturas e queimaduras, por exemplo. Além disso, também apontam eficiência no tratamento de doenças degenerativas, como o Alzheimer e o Parkinson. “O sangue de cordão umbilical apresenta muitos benefícios à saúde humana e descarta-lo no momento do parto é uma arrogância. Ele é coletado de forma indolor e não oferece riscos à mãe ou ao recém-nascido, este procedimento é recomendado a todas as famílias com histórico de doenças genéticas e oncológicas”, finaliza.