Asco 2022: maior evento sobre oncologia do mundo foca debates na acessibilidade e equidade do tratamento de câncer

Na última edição, o foco eram as consequências da pandemia da Covid-19 na oncologia. Dois anos depois, a ASCO (Encontro Anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica) vira suas atenções para a desigualdade em tratamento e acesso aos medicamentos oncológicos no mundo, cenário que ficou ainda mais evidente com a crise sanitária do Coronavírus. Considerado o maior evento sobre o tema no mundo, o congresso acontece de forma presencial e online entre os dias 3 e 7 de junho.

“Esta é uma mudança muito positiva da ASCO no seu foco. Se antes o congresso era muito focado em pesquisas e inovações – o que, claro, ainda faz parte de sua programação -, agora ele se virou também para o que é, de fato, o grande desafio da oncologia: o acesso global aos medicamentos e tratamentos mais inovadores. Há muitos avanços sendo desenvolvidos e de fato as novas terapias são altamente eficazes, mas com o custo ainda muito alto para a maior parte da população mundial”, comenta Carlos Gil, diretor-médico do Grupo Oncoclínicas e presidente do Instituto Oncoclínicas.

Segundo o médico, esse cenário ficou ainda mais evidente com a pandemia. Olhando para a realidade de países em todo o mundo, ele destaca que é notável o acesso desigual a tratamentos e aos estudos científicos que envolvem a descoberta de novas estratégias para controle de tumores malignos. E isso agora se soma às consequências da pandemia na saúde como um todo, que começam agora a ser medidas, compondo um cenário de múltiplos desafios para toda a comunidade médico-científica e sociedade em geral. Uma diferença de acesso visível aqui no Brasil.

“Enquanto os tratamentos mais avançados chegam rapidamente ao sistema privado, que não deixa nada a dever com outros sistemas da Europa e EUA, o SUS vai ficando cada vez mais obsoleto, com formas de tratar menos eficazes e que tem maior impacto na qualidade de vida dos brasileiros. Isso vai ampliando a desigualdade e criando um abismo de realidades quando o assunto é o combate ao câncer”, alerta Carlos Gil.

Ciência em foco

No Encontro da ASCO são apresentados anualmente estudos que transformam a prática clínica e mudam a maneira como devem ser tratados diferentes tipos de tumores. Também são mostradas pesquisas que apontam caminhos promissores, e eventualmente podem se confirmar no futuro como uma mudança de paradigmas no combate ao câncer.

“Dentre os muitos estudos altamente relevantes, destaco os de imunoconjugados. Essas drogas – que já fazem bastante sucesso dentro de suas indicações especificas – prometem avançar para outros tipos de câncer de mama e gradualmente tomar o espaço de tratamentos tradicionais — como a quimioterapia. Indo um pouco mais longe, essas moléculas altamente inovadoras podem estar estabelecendo uma nova direção para a oncologia, um cenário no qual os mais fracos certamente não sobreviverão”, afirma Max Mano, líder da especialidade de tumores de mama do Grupo Oncoclínicas e oncologista da Oncoclínicas São Paulo.

Além disso, segundo ele, serão apresentados resultados confirmatórios de tratamentos atuais. “Como por exemplo palbociclibe em câncer de mama metastático de perfil luminal, da imunoterapia (pembrolizumabe) no tratamento do câncer de mama triplo negativo inicial, entre outros. Para os interessados em dados mais preliminares de pesquisa clínica, muitos estudos de fase I/II nos indicarão o futuro do tratamento sistêmico do câncer de mama”, enfatiza.

Para o oncologista Paulo Lages, da Oncoclínicas Brasília, a Asco 2022 trará ainda destaque para diversos resultados de estudos promissores que vêm sendo conduzidos pelo mundo relacionados a tumores geniturinários. “Temos a apresentação do Cosmic, que é uma pesquisa que foi feita com a associação de imunoterapia junto com uma droga já usada no tratamento desse câncer de rim, que é o Cabozantinib, e que parece ter uma eficácia muito interessante para pacientes com câncer de bexiga. Também poderemos ver o estudo, que está em fase 2 de medicamentos e tratamentos para pacientes que têm dano no gene de reparo de DNA e câncer de próstata”.

No contexto de câncer de rim, a expectativa é o estudo Everest, sobre a eficácia do tratamento complementar à cirurgia com a droga Everolimus. “O tratamento complementar padrão hoje é a imunoterapia. Essa seria uma nova classe de droga que poderia trazer benefício para pacientes com tumores renais operados. Os resultados desse estudo são muito esperados, pois podem representar uma mudança importante”, comenta.

Pandemia continuará impactando

No Brasil, estimativas das Sociedades Brasileiras de Patologia e de Cirurgia Oncológica indicam que no primeiro ano da pandemia de Covid-19 no país, ao menos 70 mil brasileiros deixaram de ser diagnosticados com câncer. E só em abril de 2020, cerca de 70% das cirurgias de câncer foram adiadas. Os dados são resultado dos cancelamentos de procedimentos não urgentes, como exames, consultas e cirurgias, além da recusa de pacientes com a doença ou sintomas em procurar um hospital ou clínica por medo de pegarem o Coronavírus.

“Muitas cirurgias foram adiadas e diagnósticos deixaram de ser feitos neste momento de crise na saúde mundial. Com isso, potencialmente poderemos ter como efeito avanços em casos da doença sendo descoberta em fases mais avançadas, o que impacta diretamente nas chances de resposta aos tratamentos no combate ao câncer”, reforça Clarissa Mathias, oncologista da Oncoclínicas Bahia e palestrante da Sessão Educacional da Asco 2022, onde apresentará um estudo sobre equidade no tratamento oncológico por meio de programas de pesquisa clínica no Brasil.

Oncologista brasileira apresenta estudo nacional sobre equidade no acesso a pesquisas clínicas em maior encontro de câncer do mundo

A médica brasileira Clarissa Mathias, oncologista do Grupo Oncoclínicas, será uma das palestrantes dos fóruns educacionais que acontecerão durante o Encontro Anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO), o maior evento especializado em câncer do mundo, e que acontece entre os dias 3 e 7 de junho, em Chicago (EUA). Durante a sessão, ela discutirá as lições aprendidas com a implementação de uma rede de pesquisa clínica no Brasil.

“Vamos falar do cenário nacional, as medidas de implementação e quais são as oportunidades dentro de um país em desenvolvimento. A pesquisa é uma forma de oferecer aos pacientes que não têm recursos um tratamento adequado”, explica a especialista. Para o projeto de pesquisa, ela conta que foi necessário ampliar as parcerias corporativas e acadêmicas.

“Vimos uma melhora na agilidade e otimização de processos e prazos, e um aumento no engajamento do corpo clínico”, diz Clarissa Mathias. “As barreiras ainda são desafiadoras para a contínua expansão do programa, entre elas a burocratização regulatória dos órgãos brasileiros [ANVISA e o sistema CEP/CONEP], as dificuldades fiscais e a demanda crescente e desafiadora por recursos humanos especializados, especialmente em centros com menos tradição de pesquisa”, alerta.

No painel, que acontece em 6 de junho (segunda-feira), Clarissa Mathias estará acompanhada por Oscar Gerardo Arrieta, do Instituto Nacional de Cancerologia, no México, por Jackson Orem, MBChB, PhD, do Uganda Cancer Institute, e Olufunmilayo I. Olopade, do Centro de Genética Clínica do Câncer e Saúde Global da Universidade de Chicago.

“Há algumas décadas, o desenvolvimento de pesquisa clínica global que integra países em desenvolvimento teria sido considerado um sonho”, aponta a oncologista do Grupo Oncoclínicas. “É agora uma necessidade premente que deve ser considerada inevitável em um futuro próximo”.

O objetivo, segundo Clarissa Mathias, é que os participantes tenham compreendido com mais clareza as questões globais relacionadas a ensaios clínicos e algumas soluções práticas que podem eventualmente ser implementadas em diversas partes do mundo para que o acesso às melhores práticas no combate ao câncer não fique restrito aos países economicamente mais desenvolvidos.

Redação

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